"If they can get you asking the wrong questions, they don’t have to worry about answers" Thomas Pynchon
22.7.06
Uma no cravo...
1. Há uma escassa quinzena de dias, extremistas baseados no Paquistão que exigem a independência da Caxemira fizeram explodir em Bombaim bombas que mataram 200 pessoas e feriram mais 500. A Índia foi muito elogiada pela contenção revelada na ocasião. Para ser mais explícito, por não ter retaliado atacando o Paquistão.
2. No Sul, junto a Gaza, o Hamas raptou um soldado israelita. No Norte, perto da fronteira com o Líbano, o Hizbollah raptou dois. Numa acepção muita lata do termo, poderemos com boa vontade ver aqui actos terroristas. No Sul, Israel desencadeou um ataque em grande escala contra a Autoridade Palestiniana. No Norte, iniciou bombardeamentos sobre instalações do Hizbollah em território libanês. O Hizbollah ripostou imediatamente lançando rockets sobre Israel e, principalmente, sobre Haifa.
3. Do facto de Israel ter direito a responder aos raptos pela força armada não se segue necessariamente que isso seja uma boa ideia. Muito menos que o faça como o fez.
4. Houve um tempo em que as guerras praticamente só faziam vítimas militares. Agora, um certo tipo de guerra praticamente só faz vítimas civis. É preciso muito azar para que um militar seja morto, o que faz da profissão das armas um dos mais seguros modos de vida.
5. Condoleezza Rice, a carreirista número um do planeta, acha que não vale a pena um cessar-fogo se o status quo ficar na mesma. Naturalmente, não pensarão o mesmo os civis que não só estão privados de água, electricidade e cuidados médicos, como ainda correm o risco de serem atingidos a qualquer momento pelos bombardeamentos.
6. É verdade que os bombardeamentos israelitas não podem deixar de atingir populações inocentes, dado que o Hizbollah, mais amante de Deus do que dos libaneses, tem o cuidado de implantar cirurgicamente as suas bases e os seus lança-rockets junto de escolas e hospitais localizados em bairros populares.
7. Às vezes, a guerra é apenas a continuação da estupidez por outros meios, não prosseguindo qualquer objectivo político racional. É, a meu ver, o caso desta, em que nenhum dos contendores tem algo a ganhar e todos têm muito a perder. Aparentemente, uma rápida sucessão de decisões precipitadas desencadeou uma escalada descontrolada do conflito e, agora, ninguém quer perder a face aceitando o cessar-fogo.
8. A ideia segundo a qual o exército israelita poderia desarticular o Hizbollah e expulsá-lo do Sul do Líbano em breves semanas é, infelizmente, absurda. Pelo contrário, tudo indica que o seu apoio popular aumentará depois desta aventura sem sentido. A desarticulação do Estado libanês seria uma dádiva do Céu para o Partido de Deus e teria consequências gravíssimas para Israel.
9. A única lógica imaginável desta guerra seria ajudar a criar as condições para um ataque ao Irão. Mas, tirando os machos neocons portugueses com lugar cativo na imprensa - repararam no Pacheco Pereira e no Luciano Amaral a babarem-se todos? -, quem é que, actualmente, está seriamente interessado nisso?
10. Ao aconselharem a Israel contenção ao mesmo tempo que reconhecem o seu direito de legítima defesa, a Europa, as Nações Unidas e, vejam lá, até os Estados Unidos, têm sido acusados pelos entusiastas da guerra de darem uma no cravo e outra na ferradura. Ora aí está aquilo que se me afigura uma excelente recomendação: numa situação em que, de um lado e do outro, os extremistas apelam à guerra de extermínio total, dar uma no cravo e outra na ferradura é exactamente o que deve ser feito.
11. O valor do centrismo ocorre precisamente quando tantos fanáticos se precipitam para um ou outro extremo da cena política, deixando abandonado o terreno intermédio. É nestas alturas que a moderação é simultaneamente difícil e, mais do que necessária, preciosa.
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