14.7.10

"Quem está a jogar melhor?"

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"Quem está a jogar melhor?"

Vivemos numa época estranha, em que um Nobel da Física é forçado a persuadir um padeiro amador de astronomia a não corrigir uma entrada que ele escreveu na Wikipedia.

"Quem está a jogar melhor?"

O fascínio pelo futebol explica-se por, na verdade, ninguém perceber o que vê. Trata-se de um mistério tão incompreensível como o Big Bang ou a origem da vida.

"Quem está a jogar melhor?"

O propósito do futebol não é jogar melhor, é fazer passar a bola entre os três pauzinhos, mas o povo bom e ingénuo quer acreditar, a bem da moral e da justiça, que uma coisa conduz à outra. A pergunta é uma tentativa de encontrar uma explicação causal para a vitória desta ou daquela equipa, do tipo: jogam melhor, logo ganham.

O impulso que impele alguém a colocar a questão é similar ao que move o padeiro astrónomo: perceber a lógica do universo, desvendar o segredo oculto por trás das aparências.

Se escrevesse hoje, Hume divertir-se-ia usando como exemplo o futebol para demonstrar a futilidade do argumento causal. Jogar bem e ganhar não são coisas diferentes, mas dois nomes diferentes para a mesma coisa.

O critério que permite afirmar que uma equipa jogou bem é o mesmo critério que determina se ganhou. A qualidade do remate é indistinguível do facto de a bola ter ou não entrado na baliza.

A originalidade e o génio do futebol moderno, inventado no século XIX, residem inteiramente na legitimação de um critério de verdade compatível com as superstições metafísicas características da modernidade.
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1 comentário:

António Parente disse...

Muito bem. Vou cancelar a minha assinatura da Sport TV.