.
Serão de facto os jovens actuais a geração mais bem preparada de sempre? Sem dúvida, mas apenas no sentido em que, em números absolutos e relativos, não só nunca houve tanta gente a saber ler e escrever, como também nunca houve tanta gente munida de licenciatura, mestrado ou doutoramento.
Não é, porém, menos verdade que o licenciado médio de hoje sabe muito menos que um licenciado da mesma especialidade há meio século atrás. Vou mesmo mais longe: raros serão os detentores de uma licenciatura ou mestrado de hoje que se equivalem ao licenciado médio dessa época não muito longínqua.
Em contrapartida, uma vez ingressados no mercado de trabalho, os jovens de hoje rapidamente adquirem níveis de qualificação profissional comparativamente elevados, dado que o mundo laboral é hoje incomparavelmente mais exigente e enriquecedor. Digamos que essa circunstância feliz acaba por compensar o handicap à partida.
Faz falta, porém, aprofundar um pouco o que significa essa alegação, frequentemente invocada pelos próprios para fustigarem quem os não emprega, segundo a qual eles seriam “os mais bem preparados de sempre”.
Quem se prepara, prepara-se para alguma coisa. Ora parece indiscutível que os jovens podem ter sido preparados para muita coisa, mas não exactamente para a realidade em que acabaram por aterrar.
Afloramos aqui um problema sério e difícil, que é este: a escola forma os estudantes ao longo de quase vinte anos para um mundo que, a bem dizer, não sabe qual virá a ser. De modo que, de tanto se esforçar por prepará-los bem para o mundo de há vinte anos, não os preparou para o mundo actual.
Muitas indústrias, actividades, qualificações e profissões desapareceram ou migraram entretanto para outras paragens. Outras brotarem do solo como por milagre ou vieram cá parar. É indispensável, por isso, alterar os planos originais de carreira, em vez de persistir aferrado a projectos cujo tempo passou.
Em certas actividades – precisamente as mais criativas, associadas quer às ciências quer às artes – a estrutura empresarial é por natureza frágil e provisória. Não é razoável contar-se aí com emprego estável.
O mercado interno é insuficiente para justificar cada vez mais actividades empresariais, de modo que faz falta mais gente que queira ir lá para fora vender em detrimento de jantar em casa da mãe.
As qualificações desvalorizam-se hoje com grande rapidez. Não há futuro para aqueles “estudantes” que nunca leram um livro completo durante todo o curso e se convenceram de que não precisam de aprender mais nada o resto da vida. Ora parece que se encontram nessa circunstância uns 80% dos nossos jovens.
O facto de o mundo ter mudado tanto não é, obviamente, “culpa” de ninguém, mas já há uma evidente falta de responsabilidade quando insistimos em ignorar como são hoje diferentes as coisas e, logo, nos recusarmos a fazer o que precisa de ser feito para reagir às mutações que não previramos.
Neste ponto, parece que estamos de facto perante uma das gerações pior preparadas de sempre.
.
9.3.11
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
5 comentários:
Desculpa a desconversa mas tenho visto com frequência crescente a expressão "mais bem" que antigamente se dizia dever ser preterida por "melhor". A prática alterou-se por algum motivo ou é só a língua que se está a regularizar?
Eu sinto muito falta de tempo... para que tudo seja feito com calma e para que tudo seja bem feito e interiorizado. É um dos grandes problemas que sinto no meu estudo enquanto aluna de Direito.
JJ, os puristas dizem que é "a mais bem", eu acho que, como o Camilo e o Eça escreviam "a melhor", essa alternativa não pode estar mal. Há tempos já escrevi sobre isso.
Caro JPC,
Não faz sentido efectuar essa comparação sem ter em consideração a dimensão absoluta do que se compara. Quando entrei para a universidade, entravam nessa altura cerca de 15.000 alunos. Hoje, só no ensino superior público, entram mais de 150.000. Comparar a média dos dois não faz sentido, quanto a mim.
Agora, a minha experiência como professor diz-me que os 15.000 melhores de hoje são, em média, melhores que 15.000 melhores de há una anos atrás. Mas essa é um opinião, como a sua.
Oh tantas dúvidas gramaticais... E então quando é que é melhor ou mais bem, pior ou mais mal?
Normalmente é melhor ou pior: “este casaco fica-te bem, mas aquele fica-te melhor“; ou seja, “este fica-te pior do que aquele“.
Quando, porém, estes dois advérbios – bem, mal – se usam afectando (os advérbios afectam outras palavras e até por isso mesmo é que se chamam “advérbios”) um particípio verbal, assumem normativamente (ou seja, obrigatoriamente) a forma ‘mais bem’ e ‘mais mal’. Note-se: antes de qualquer particípio verbal (passado), quer se trate da forma regular ou irregular do particípio :
“Hoje a lição foi mais bem preparada“; “a de ontem fora mais mal preparada“. “Este desenho está mais bem acabado do que aquele”; aquele, é claro, está mais mal acabado, mais mal feito“.
http://tentolingua.wordpress.com/2010/01/21/melhor-ou-mais-bem-pior-ou-mais-mal/
Quanto ao conteúdos das intervenções, não tenho qualquer respeito por elas, parece que está sempre tudo normal e que as preocupações dos jovens não interessam para nada... belo argumento de quem já não é jovem!! *clap clap clap*
Enviar um comentário