30.4.11

Já são gaffes a mais

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Catroga quer que o governo seja levado a tribunal - um claro progresso em relação à ideia de suspender a democracia por seis meses, visto que o julgamento dos políticos equivaleria a cancelar a democracia liberal de uma vez por todas.

Esta ideia de colocar sob a alçada do poder judicial as ideias políticas que nos incomodam chama-se ditadura e já foi experimentada entre nós quando Catroga era um pouquinho mais novo - admitindo que uma pessoa com o perfil psicológico dele alguma vez tenha sido nova.

Acho que é altura de que quem no PSD se choca com estas coisas venha a público questionar as repetidas declarações de dirigentes do seu partido que de uma forma ou de outra evidenciam falta de cultura democrática.

É que não estamos a falar de Miguel Relvas, Marco António ou Alberto João Jardim, mas de Eduardo Catroga e Manuela Ferreira Leite. Mais respeitável que eles, ao que nos dizem, não há.

Vamos continuar a fingir que se trata de gaffes de tontos que não sabem o que dizem ou deveremos antes concluir que, de facto, prefeririam viver numa sociedade em que para as suas políticas prediletas triunfarem não tivessem que submeter-se ao sufrágio popular?
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29.4.11

Factos e estatísticas seletivas

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Uma pessoa com dois dedos de testa sente-se compungida ao ler um post como este.

Já nem falo da confusão entre factos e estatísticas, porque os economistas não são treinados para distinguir uma coisa da outra.

Tampouco me incomoda excessivamente que Álvaro Santos Pereira recorra a algumas estatísticas duvidosas ou aproximativas ao mesmo tempo que esquece outras que poderiam embaraçar o seu propósito.

Mas a gente espera, talvez ingenuamente, que um académico entenda que correlação não é causalidade e que, por conseguinte, prescinda de proclamações inflamadas em proveito de análises mais esclarecedoras.

Porque a questão essencial, que ele menciona mas a que não tenta responder é esta: "O que é que ocorreu entre 1995 e 2011?" Muita coisa, certamente, designadamente a adesão ao euro, o alargamento da UE a Leste, a abertura à concorrência chinesa e a grande crise financeira iniciada em 2007.

Logo, o que nós gostaríamos de saber era o que Álvaro Santos Pereira teria feito de diferente para reagir a tais circunstâncias - mas, se possível, sem nos gritar aos ouvidos.

Aguardemos o livro para ver se será melhor que o post.
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28.4.11

Maior que o pensamento

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O Dr. José Afonso trucidou gentilmente o caquético fado de Coimbra e ressuscitou a balada.

Com a preciosa assistência de José Mário Branco, Zé Afonso inventou para a música popular portuguesa um caminho alternativo ao nacional-cançonetismo e ao ié-ié de importação.

Justamente idolatrado por uma geração de seguidores, o Zeca imaginou-se líder ideológico pela força da canção.

Por defeito ou virtude, tomou-se demasiado a sério; mas a sua música continuou a melhorar enquanto ele se entusiasmava com o assassinato de Aldo Moro às mãos das Brigadas Vermelhas.

Amargurado, morreu primeiro por dentro.
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25.4.11

Ingenuidades

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Ouço dizer que o CDS (ou terá sido o PP?) subiu nas intenções de voto devido à postura de contenção de Portas Paulo nas últimas semanas, e pergunto-me em que mundo viverá esta gente.

Primeiro, é altamente duvidoso que uma ligeira flutuação nas sondagens possa ser interpretada como uma modificação real nas intenções de voto.

Segundo, Portas é, tirando Louçã, o dirigente partidário há mais tempo em funções, de modo que nem o mais distraído cidadão tem dúvidas sobre o que ele quer e representa.

Terceiro, só alguém muito néscio pode crer que o silêncio estudado de Portas possa impressionar os eleitores.

Às vezes, penso que os políticos profissionais e os comentadores não andam de autocarro, não frequentam o café e não passam pelas salas de espera dos hospitais.

Se o fizessem, ficariam a saber que as conversas sobre política que aí se ouvem têm um tom muito distinto do que se diz no Expresso e na SICNotícias e, sobretudo, que os argumentos que entusiasmam os sábios passam totalmente ao lado do eleitor comum.

Acreditem: na rua, ninguém captou as subtilezas do líder do CDS.
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20.4.11

Histórias da carochinha

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Volta, não volta, somos informados de que a classe média está reduzida à sopa dos pobres e deixou de pagar a prestação da casa.

Alternativamente, uma narrativa igualmente popular denuncia o embarque de resmas de portugueses rumo às Caraíbas em tempo de Páscoa para demonstrar que a crise não passa, afinal, de uma treta.

Se os factos tivessem alguma relevância, saber-se-ia que metade dos portugueses passa as suas férias em casa, e que metade da outra metade é acolhida em residências de familiares - que é como quem diz: vai à terra. Dos que sobram, um ínfima minoria (porém suficiente para encher alguns aviões) faz férias no estrangeiro.

Por outro lado, quem tem dificuldade em pagar os empréstimos à habitação não é genericamente a "classe média", mas aquelas famílias em que uma ou mais pessoas foram vítimas do desemprego de longa duração.

Durante as recessões, a generalidade dos cidadãos prossegue nos seus hábitos sem grandes alterações, adiando porém compras que não têm urgência, tais como um carro novo ou roupas supérfluas.

Por outro lado, o facto de existir uma crise não significa que algumas pessoas não possam viver melhor. Uma crise não é uma situação em que toda a gente vive pior: é uma circunstância em que há mais gente a viver pior do que gente a viver melhor.

O resto, são histórias da carochinha.
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Louvor de Paulo Futre

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"Futre é um sujeito com poucas letras. Porém, como tem vivido num país onde os media não se limitam a comentar a doença da burra da Ti Jaquina e os casos amorosos do Presidente da Câmara, absorveu noções úteis sobre o mundo em que vivemos. Se lhe perguntassem a opinião, decerto criticaria o facto de o AICEP ter mais delegações em Espanha que na China."

Ler o resto aqui.
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14.4.11

3ª feira, dia 19

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11.4.11

A Espanha não é a Espanha

Munchau, no FT de hoje:

"On Thursday, the European Central Bank raised its main refinance rate by a quarter point to 1.25 per cent. This was a well-flagged move, but more are likely to follow. I expect the ECB’s main policy interest rate to rise to 2 per cent by the end of this year and to 3 per cent in 2013. This trajectory, while consistent with the ECB’s inflation target, will have negative consequences for Spain in particular. Apart from the direct impact on economic growth, higher interest rates will hit the Spanish real estate market. Almost all Spanish mortgages are based on the one-year Euribor money market rate, which is now close to 2 per cent, and rising.(...)

"Falling house prices and rising mortgage payments are bound to push up the still moderate delinquency rates and the number of foreclosures. This will affect the balance sheet of the cajas, the Spanish savings banks. The balance sheets carry all property loans and mortgages at cost. As default rates rise, the savings bank system will need to be recapitalised to cover the losses. The Spanish government implausibly estimates the recapitalisation need to be below €20bn, while other estimates put the number at between €50bn and €100bn. The assets most at risk are loans to the construction and real estate sector – €439bn as of end-2010. Spanish banks also have about €100bn in exposures to Portugal, a further source of risk. (...)

"If my hunch on the Spanish property market proves correct, I would expect the Spanish banking sector to need more capital than is currently estimated. (...)

"The mix of high external indebtedness, the fragility of the financial sector and the probability of further declines in asset prices increase the probability of a funding squeeze at some point. And that means that Spain will be the next country to seek financial assistance from the EU and the International Monetary Fund. As for the large number of official statements that Spain is safe, I think they are merely a metric of the complacency that has characterised the European crisis from the start."

6.4.11

E, agora, uma novidade mesmo a sério

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Elevação, sentido de responsabilidade e outras lérias

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Podendo, não perco um jogo de futebol na TV. Mas, desenganado pelos detractores, jamais me dera ao trabalho de sintonizar um desses programas em que comentadores adeptos dos três principais emblemas se esgadanham a propósito dos casos da última jornada.

Há dias, porém, manifestando o seu desagrado perante o nível reles a que desceram os debates políticos, um amigo comentou: “Isto está pior que as peixeiradas da bola!”

Estaria? Fui ver.

E tenho uma boa nova para vos dar. Ao lado do Bagão Félix, o Vieira é um cavalheiro. Comparado com o Miguel Relvas, o Rui Santos é um crâneo. Depois de se ouvir o Martim Avilez Figueiredo, o Fernando Seara revela-se um modelo de clarividência.

Nos debates futebolísticos, os cartões amarelos e os eventuais penalties são analisados à luz crua dos factos e com recurso a imagens não falseadas nem truncadas.

Os participantes procuram pelo menos simular as regras de uma controvérsia civilizada a partir de conflitos de uma tal gravidade que o modo mais natural de resolvê-los seria ao murro e a pontapé. Ao invés, estando em causa dissensões políticas, os arguentes esforçam-se por seguir o caminho oposto, caminhando da divergência intelectual para a agressão verbal, enquanto ansiosamente aguardamos o dia em que eles passarão a formas superiores de luta.

Os programas eleitorais dos candidatos à Presidência do Sporting são escrutinados ponto a ponto. A sua coerência é sistematicamente questionada. A credibilidade das promessas eleitorais é investigada. Tudo isto com recurso a argumentos lógicos laboriosamente testados que só não esclarecem os eleitores mentecaptos. Quase um modelo de democracia ateniense.

Outro exemplo. Os repórteres dos programas de informação política perguntam a Dilma Rousseff se vai enviar dinheiro para salvar Portugal e ao servente de pedreiro se deveríamos chamar o FMI. Têm razões para invejar o profissionalismo dos repórteres desportivos que, sensatamente, se limitam a interrogar os benfiquistas por quantos vai o seu clube vencer o Porto e quem marcará os golos.

Libertem-se de vez dos preconceitos dos intelectuais de pacotilha. Elevação, inteligência e sentido de responsabilidade, hoje em dia, só no futebol. Turn on, tune in, drop out.
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