29.2.12

Esta semana, num céu perto de si

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Fonte: Rosa Martins.



Fonte: Miguel Claro.
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28.2.12

Krugman e os salários portugueses

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Não assisti à conferência de Paul Krugman, nem ouvi a entrevista que ontem passou num canal de televisão. Porém, durante o dia ouvi na TSF a extraordinária afirmação de que Krugman defendera a baixa dos salários como forma de aumentar a produtividade, um absoluto contra-senso.

Há pouco consegui finalmente ler no Negócios a excelente entrevista conduzida por Pedro Santos Guerreiro e Vítor Gonçalves, e eis o que encontrei sobre o assunto:
"No mínimo, os salários portugueses têm que crescer mais lentamente que no resto da Europa. Na prática, seria necessário algum abrandamento. De uma forma ou de outra, terá que haver um ajuste substancial."

"Considero que tem que ser feito um ajustamento. Obviamente, gostava de vê-lo pela parte da produtividade em vez de pelos salários. Mas não há forma de isso acontecer com garantias. Eu preferiria até que esse ajustamento fosse alcançado com os salários alemães a subirem em vez de serem os salários portugueses a caírem. É a análise relativa que interessa. Logo, se conseguirem persuadir a Frau Merkel a fazê-lo, seria óptimo. Caso contrário, tem de haver aqui um ajustamento."

"Gosto de fazer um pequeno exercício de aritmética. Se dissermos que cerca de 20 ou 30% de redução nos salários da Europa do sul em relação aos alemães terá de acontecer, faz toda a diferença saber se isso ocorre com uma redução de 3% anual nos salários do sul da Europa, com uma subida de alguns pontos percentuais na Alemanha, ou se acontece através da manutenção ou subida dos salários do sul da Europa, enquanto os salários alemães sobem 5 ou 6%. É uma enorme diferença a nível do desemprego que irá existir na Europa do sul, a nível de dinâmica da dívida..."
Noutro lugar do jornal, Eva Gaspar e Pedro Romano sintetizam corretamente: "O essencial da resposta deveria vir dos actores com mais capacidade para fazer a diferença, com salários mais altos para os trabalhadores alemães e uma política monetária mais inflacionista. Se assim fosse, o ajustamento necessário na periferia seria menos doloroso, mas essa via [sic] ainda menos provável."

Em sítio algum Krugman recomenda que os salários sejam baixados em Portugal. Porém, ele acredita que, na impossibilidade de uma desvalorização cambial, é necessário um reajustamento relativamente aos salários alemães e afirma taxativamente que a melhor solução seria a subida dos salários alemães (estagnados há vários anos) e alguma inflação na Europa.

Caso isso não aconteça, então poderá ser inevitável a redução nominal dos salários portugueses. É isto uma recomendação? De forma alguma.

Terá Krugman razão? A desvalorização interna não é, em minha opinião, uma alternativa à desvalorização externa. Por outro lado, não há futuro para Portugal na zona euro caso ela não sofra uma profunda reforma. Desvalorização interna sem reforma do euro será para nós um beco sem saída.

Do que não pode haver dúvida é que, com razão ou sem ela, o pobre Krugman tem direito à sua opinião. Não está certo que lhe atribuam coisas que não pensa.
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27.2.12

Países ricos

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"Países ricos querem ver a 'cor do dinheiro' da zona euro antes de reforçarem ajuda". O título fez-me logo desconfiar que o artigo do Público trazia asneira da grossa.

E trazia mesmo. No terceiro parágrafo lê-se assim: "Os países ricos, como os EUA, a China e o Japão..."

País rico, a China? Mas o seu PIB per capita, em paridades de poder de compra, classifica-a hoje entre o 90º e o 100º lugar, conforme as fontes, num total de 180 países.

Para terem uma ideia, equivale a apenas 1/3 do nosso e menos que 1/5 do dos EUA.

Há dias, uma aluna brasileira ficou muito surpreendido quando lhe expliquei que o Brasil continua a ser muito mais rico que a China.

Hoje em dia, a gente gasta cada vez mais tempo a tirar da cabeça dos estudantes as tolices que eles aprendem nos media. E já não é só na televisão, agora também os jornais ditos de referência dão uma ajudinha.
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20.2.12

Europa não é estrangeiro

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A visita de Lucinda Creighton a Portugal na semana passada deveria ter-nos feito pensar na particularidade de a Irlanda ter uma Ministra dos Assuntos Europeus.

Significa isso que, para os irlandeses, não faz sentido encarar os assuntos europeus como estrangeiros. Gente esperta.
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Porque a Grécia hoje não conta

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Não é comum pensarmos na Grécia como um país do Leste, mas é isso que ela é: não um país eslavo como quase todos os restantes; mas, sem dúvida, um país de Leste.

Durante décadas foi, de resto, o único país não-comunista do leste europeu, resgatado in extremis por uma intervenção militar britânica que retirou o poder aos comunistas que haviam logrado vencer e expulsar o ocupante nazi.

Entende-se por isso que, durante décadas, a Grécia, um enclave numa região controlada pelo inimigo, ainda por cima situado às portas do Próximo Oriente, fosse encarada como um precioso ativo estratégico do Ocidente, alvo de invulgar desvelo nos planos militar e financeiro.

A Grécia teve por muito tempo um tratamento de favor, patente inclusive na rapidez com que foi acolhida na CEE, cinco anos antes dos estados ibéricos incomparavelmente mais qualificados que ela para a adesão.

Na UE, o mau comportamento da Grécia foi sempre notavelmente tolerado. A tal ponto que os próprios gregos se terão esquecido da razão do tratamento de favor de que desfrutavam, anacrónico pelo menos desde que ruiu com fragor o muro de Berlim.

No mundo contemporâneo, porém, a Grécia pouco mais conta para os desígnios estratégicos dos EUA e da Europa do que o pitoresco Montenegro. Dela hoje apenas se espera que cuide da Acrópole e que não chateie.
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16.2.12

O que as pobres máquinas vêem

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Robot readable world from Timo on Vimeo.

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Them: Gloria

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9.2.12

Foi eu que escrevi isto?

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...blogoexisto, 25.9 03

O Dr. Graça e o Sr. Moura

Por um lado, é um poeta de méritos reconhecidos, um homem de letras distinto, um gentleman com elevado sentido cívico. Por outro lado, polemiza com inigualável sectarismo, destempera à mínima provocação, recorre a linguagem de carroceiro, perora com grande à vontade sobre assuntos de que nada entende.

Agora inventou esta história do terrorismo incendiário que, segundo ele, visa derrubar o governo por meios subversivos; e, em vez de deixar cair no esquecimento o lapso infeliz, insiste e volta à carga.

Qualquer pessoa minimamente informada explicar-lhe-ia que o fogo posto tem um peso relativamente pequeno enquanto causa de incêndios, e que a grande maioria se prende com negligência e causas naturais. Chamar-lhe-ia ainda a atenção para o facto de que este ano, embora a área ardida tenha aumentado muito, de facto até houve menos incêndios.

Mas o Sr. Moura não quer saber de nada disto. Se o sr. primeiro-ministro lançou esta cruzada contra os incendiários para se limpar de reponsabilidades, a função dele, enquanto propagandista do governo, não é pôr em causa o chefe, mas apenas reunir argumentos para a causa, não importa quão disparatados eles sejam.

Ele argumenta, por exemplo, que a Judiciária até já prendeu 91 pessoas, o que, para o sr. Moura, basta para considerá-las culpadas. Sem notar que o envolvimento de uma parte da Judiciária numa manobra de desinformação do governo, particularmente notório nas suas intervenções televisivas durante o mês de Agosto, exigiria, ele próprio, um esclarecimento.

Enfim, este é o terrorismo a que temos direito, e o Sr. Moura o seu delirante profeta. Vamos esperar que, passado o efeito da poção maligna, tenhamos em breve de volta o bom Dr. Graça que todos tanto apreciamos.
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6.2.12

"Estúpida e irracional"?

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Sabe-se que Assunção Cristas, tão empenhada no desenvolvimento da agricultura como o meu Bóbi, projeta cancelar os investimentos na distribuição de água que permitiriam concluir o Alqueva. Pode-se lá perder uma oportunidade de contrariar uma promessa do Sócrates?

O Público sai hoje em defesa de Assunção (não deveriam, em coerência, chamar-lhe antes Assumpção?) na sua patusca secção Sobe e desce , lamentando-a pela "pesada herança" do Alqueva que herdou e declarando não se "vislumbrar uma saída airosa do processo".

E insiste no editorial: "O Alqueva tornou-se (...) em mais um símbolo de uma era obreirista, estúpida e irracional". Que provas tem o editorialista do que afirma?

Acaso essa tese encontra sustentação na reportagem que ocupa as páginas dois a quatro e que o jornal destaca com uma chamada intitulada "Dez anos depois, o Alqueva está a falhar a revolução prometida no turismo e na agricultura"?

Como de imediato se depreende, trata-se de uma reportagem com tese. Para a vindicar, os jornalistas recolheram os depoimentos de alguns velhotes e reformados apanhados ao acaso que pintam um retrato invariavelmente negro da situação.

No meio de todo este pitoresco relambório, porém, pode-se ler as seguintes palavras de Sevinate Pinto, ex-ministro da agricultura de Durão Barroso:
"'Graças em grande parte a ela [água do Alqueva] o país atingiu a auto-suficiência na produção de azeite' (...) Sevinate Pinto fala ainda do surgimento de centenas de hectares de pomar, frutos secos e vinha para defender os proveitos daquele que considera ser 'o maior e mais promissor projecto agrícola português das últimas décadas."
E mais adiante, citando a opinião do Presidente da Câmara Municipal de Ferreira, escreve-se:
"No lugar das searas e trigo e de outras culturas de sequeiro (...) cresce o novo olival, a vinha, as culturas do melão, melancia, tomate e outras, que no conjunto já ocupam cerca de 10 mil ha de regadio.

"Se não fosse o Alqueva, 'dificilmente' os agricultores do concelho 'poderiam dispor de 40 milhões de m3 de água, necessários à viabilização da nova agricultura que já tem uma taxa de adesão de 75% na área disponibilizada para rega'.

"´Agora estamos à espera das agro-industriais´, acentua, optimista, sem evitar uma crítica ao anúncio da suspensão das obras feito pela actual ministra da Agricultura, Assunção Cristas."
Fracasso do Alqueva ou fracasso do Público? Vocês decidam.
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5.2.12

A mensagem do senhor presidente

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Imaginem que houve uma mudança de direção na empresa em que trabalham. Há natural expectativa em relação ao que fará o novo presidente. A maioria das pessoas gostava do anterior, mas, ao cabo de tantos anos, reconhece que talvez fosse altura de mudar.

Nos corredores e no espaço onde se encontram para tomar café, especulam sobre o que irá acontecer. Já alguém o viu? Os diretores que falaram com ele contaram alguma coisa? Vai haver mudanças na estrutura? Haverá nomeações na calha?

Ninguém parece saber o que pensa ao certo o novo presidente, mas fala-se muito. Há grandes expectativas quanto ao que poderá acontecer. Cada qual faz propaganda das suas próprias ideias sobre que transformações deveriam ser introduzidas. Mas todos dão por adquirido que o homem traz consigo novas ideias e que não tardará a divulgá-las.

Um belo dia, a ordem chega por email: o senhor presidente mandou apagar o corretor instalado em todos os computadores pessoais e proibiu o uso da nova ortografia em todos os documentos de serviço.

Que impacto supõem que isto terá? Como irão os colaboradores interpretar esta decisão? Que sinal deu o chefe às tropas com esse email?

Todos considerarão que, recém-empossado nas suas novas funções, o que mais preocupa o senhor presidente, a sua máxima prioridade, é valer-se do poder de que agora desfruta ao serviço de numa cruzada pessoal em que os quadros da empresa serão meros joguetes.

O que o entusiasma não é renovar a instituição, animá-la a cumprir a sua missão com um entusiasmo renovado, mobilizar toda a gente para prestar um bom serviço à comunidade. A ortografia tem precedência sobre tudo o resto.

O senhor presidente não passa, todos o compreenderam, de um tiranete caquético. Uma semana depois de entrar ao serviço conseguiu desmoralizar definitiva e irremediavelmente todos os que têm a infelicidade de se encontrar sob a sua pata e persuadi-los de que os próximos anos se contarão entre os mais infelizes e inúteis de toda a sua vida profissional.

Que tristeza.
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3.2.12

Ninguém vai preso pur iscreber cômo lhap tesse

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Há quem entenda que, desagradando o acordo ortográfico a Vasco Graça Moura, está ele no seu pleno direito de proibir que seja adotado no CCB.

A primeira coisa a notar é que nenhum cidadão é interdito, na sua vida pessoal, de utilizar a ortografia que entender. Ninguém vai preso pur iscreber cômo lhap tesse.

Já o caso é diferente no contexto de instituições às quais cabe ensinar a norma do português escrito, tais como as escolas e as editoras escolares. Ou outras organizações de que são exemplo museus ou centros culturais. Acredito que não será preciso fazer um desenho para se perceber porquê.

A atitude de Graça Moura revela, desde logo, falta de profissionalismo e ausência de perfil para dirigir uma instituição com as responsabilidades do CCB.

Ele foi nomeado para cumprir uma tarefa, não para promover as suas idiossincrasias pessoais. Tem o direito de conservar tanto as ideias próprias como a ausência delas, mas não de se valer do cargo que ocupa para impô-las contra tudo e contra todos.

Gente prepotente e mal-educada beneficia entre nós de uma surpreendente tolerância. O anterior governo também colocou uma mão cheia desses exemplares em lugares de responsabilidade, com a consequente desmoralização dos subordinados e paralisia das instituições.

Graça Moura pertence a essa categoria de figurões que tem que perfumar-se muito para disfarçar o fedor da grosseria.
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