29.2.08

Mal-estar confuso

Grande lição de história nos oferece Vasco Pulido Valente no Público de hoje:
"No meio desta persistente desgraça, Portugal julgou três vezes que se aproximava da Europa: durante os primeiros tempos da "Regeneração", durante o "fontismo" e durante o "cavaquismo". Ao todo, trinta e tal anos de uma ordem política "civilizada" e de um crescimento económico razoável. Mesmo assim, os fundamentos destes raríssimos milagres não eram sólidos. Nos três casos (embora com um ligeiro atraso), uma crise financeira pôs fim à festa (...)"
E, noutro passo:
"A sociedade ia, como é óbvio, mudando: devagar, aos sacões. Só que a distância que nos separava da Europa não diminuía."
Fascinante. Mas será verdade? Vejamos então como evoluíu ao longo do tempo a proporção entre o produto per capita português e o inglês:
1870 - 30,6%

1913 - 25,4%

1950 - 30,0%

1973 - 58,7%

2003 - 64,8%
A posição relativa de Portugal melhorou progressivamente e de forma muito acentuada na segunda metade do século XX. A evolução comparada com outros países mais desenvolvidos revela a mesma tendência, pelo que não vale a pena continuar. Logo, Vasco Pulido Valente está errado quando pretende que não tem diminuído a distância que nos separa da Europa.

Está também errado quando enumera os três períodos de alegada convergência. Nem a Regeneração nem o Fontismo produziram resultados notáveis, e foi nos anos 50 e 60 do século passado, não durante o consulado de Cavaco, que o país mais cresceu tanto em termos absolutos como relativos.

Os dados que utilizei foram retirados de Contours of the World Economy (1-2030 AD), um livro publicado em 2007 por Angus Maddison - provavelmente a maior autoridade mundial na matéria - na Oxford University Press.

É claro que a metodologia adoptada por Maddison para construir as suas séries estatísticas pode ser discutida, e que quanto mais se recua no tempo maior é a probabilidade de erro. Mas não só não se afastam muito do que os historiadores económicos já sabiam como, representando o estado da arte, ninguém tem o direito de ignorá-las.

Este é apenas mais um dos muitos casos em que, comprovadamente, Vasco Pulido Valente não sabe do que fala.

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