29.12.03

Tolkien meets George Bush



Aparentemente, o Senhor dos Anéis trata da luta entre o Bem e o Mal.

O conteúdo deste Bem e deste Mal é, todavia, mais estético do que ético. Além disso, não se está de um lado ou do outro por escolha, mas porque se nasceu lá. Certas pessoas nascem elvos, outras nascem orcs -- e é tudo.

Os orcs e os trolls não são maus por fazerem coisas más -- eles limitam-se a matar inimigos, tal e qual como os bons -- mas por serem feios e mostruosos, ou seja: diferentes.

A única acusação séria que podemos fazer contra estes maus é carecerem de individualidade, mas também nunca temos ocasião de saber como se relacionam com as suas mulheres, os seus filhos e os seus amigos -- será que os têm? Mas, vendo bem as coisas, isso também não interessa porque eles são apenas inimigos que devem ser abatidos sem piedade.

Pelo contrário, os bons são ecologistas e diferentes. Tão diferentes, aliás, que as diferentes castas não se misturam umas com as outras, e só algumas são predestinadas para mandar.

Diz-se que Tolkien era um católico tradicionalista. Percebo onde está o tradicionalismo, porque os temas que lhe são caros repetem o conhecido cânone anti-moderno que pode ser encontrado em Wagner, Spengler, Heidegger, Evola e outros proto-fascistas do género.

Mas o catolicismo, esse, escapa-me completamente. O que eu vejo aqui é um neo-paganismo de pacotilha, na sua essência oposto a todos os princípios essenciais do cristinianismo, que, para meu espanto, os católicos não cuidam de combater.

Tolkien busca inspiração e legitimação numa ordem natural-feudal distinta da linhagem humanista greco-romana e oposta à tradição iluminista fundadora do mundo moderno. À beira deste primarismo ideológico, o paganismo New Age da Guerra das Estrelas parece mais profundo e aceitável.

Mas este filme reflecte bem a ideologia dominante da nossa época e permite-nos entender melhor o pensamento político de George Bush e dos neo-conservadores de todo o mundo. É o perfeito filme de época para o pós 11 de Setembro.

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