28.8.09

Premissas e conclusões

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Louçã defende na sua entrevista de ontem ao Jornal de Negócios a nacionalização da Galp e da EDP, e explica: "Pretendemos que os serviços estratégicos de energia e de comunicações sejam públicos." Se é essa a ideia, esqueceu-se de mencionar as empresas de telecomunicações, de transportes e de auto-estradas.

Mais adiante, porém, Louçã precisa o seu pensamento. Os grandes grupos portugueses estão acoitados em sectores onde não há (ou há pouca) concorrência. Ora, não faz sentido deixar à iniciativa privada sectores de monopólio natural. Simpatizo, com reticências, com esta linha de raciocínio.

Helena Garrido, a entrevistadora, pergunta então a Louçã se o problema não poderia resolver-se com regulação. Louçã troça da ideia: "Por amor de Deus. Regulação em Portugal?" Mais uma vez, entendo o que ele diz: o desempenho das entidades reguladoras não tem sido brilhante entre nós.

Noto, porém, sérias fragilidades no argumento.

Primeiro: nem a Galp nem a EDP são monopólios naturais (a REN, sim), logo, a justificação para nacionalizar essas empresas não tem cabimento.

Segundo: a objecção de Louçã à regulação é obviamente de fundo e não circunstancial. O que está em causa não são as debilidades da sua implementeção em Portugal, caso contrário Louçã proporia formas de melhorá-la - e não o faz.

Terceiro: Louçã presume, portanto, a superioridade da gestão pública sobre a privada em circunstâncias de fraca competição. Acontece que a longa experiência de que nós e outros países dispomos nesta matéria não autoriza esse optimismo beato. Às vezes (note-se: às vezes), a gestão pública funciona mesmo muito mal.

Louçã quer mobilizar os lucros da Galp e da EDP para pagar o défice orçamental, mas é bem possível que, sob gestão pública, parte significativa desses lucros desaparecesse em menos de um fósforo.

Não fica claro para que quer Louçã nacionalizar algumas empresas. Começa por insinuar uma motivação liberal: não há suficiente concorrência, e ele quer estimular o capital a deslocar-se para sectores mais arduamente competitivos.

Mas trata-se de uma falsa pista, como se torna claro quando ele rejeita a regulação.

A lógica, então, parece ser submeter à gestão pública os chamados sectores estratégicos. E o que são sectores estratégicos? A banca (comercial e de investimento) não se enquadra nesse conceito? A indústria automóvel (Auto-Europa incluída), também não?

Trocadas por miúdos, as ideias de Louçã são tão consistentes como gelatina.
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