16.7.07

Ao lisboeta desconhecido



Os lisboetas têm dedicado tanta atenção aos temas da corrupção em Felgueiras, das rotundas em Viseu ou da fraca ocupação do Estádio do Algarve que, compreensivelmente, sobra-lhes pouco tempo para pensarem nos problemas da sua terra.

Pode ser que, num improvável assomo de lucidez, venham um dia a reconhecer ser Lisboa um dos concelhos mais consistentemente mal geridos do país ao longo das três últimas décadas.

Sim, porque, para além de todos os factores ocasionais, a vitória de Santana Lopes na capital há cinco anos encontra a sua principal explicação no lamentável estado a que já sob João Soares a cidade tinha chegado. Que o mal vem de longe, eis o que é fácil constatar observando essas urbanizações modernas aprovadas por Abecassis e Sampaio em cujos minúsculos passeios não há, por vezes, espaço para passar um carrinho de bébé. Há método, e método persistente, nesta loucura.

Não acredito em sobressaltos cívicos, nem sequer sei muito bem o que isso quer dizer. Não esperava, por isso, grande coisa das eleições intercalares de ontem. Ainda assim, considero deprimentes os resultados de uma votação que, no essencial, premiou a insensatez.

É claro que isto tem uma explicação: a principal consequência da absurda política urbanistica das últimas décadas foi retalhar a sociedade lisboeta, afastando as pessoas umas das outras e remetendo cada qual para a sua vidinha privada num dia a dia em que os habitantes raramente têm oportunidade de se encontrarem uns com os outros fora do centro comercial ou do hipermercado. O sentimento do viver colectivo e do interesse comum perdem-se numa cidade assim, em que o espaço público primeiro se degrada, e depois quase desaparece.

Que poderemos, nestas circunstâncias, esperar de António Costa?

A sua campanha deu sinais contraditórios. Por um lado, prometeu o enésimo programa mágico de revitalização de Lisboa, desta vez centrado na Baixa da cidade. Por outro, prometeu coisas triviais, tais como pintar as faixas de atravessamento para peões, limpar as ruas e arrancar o mato que hoje cresce nos jardins.

Não conheço bem o programa de revitalização da Baixa-Chiado, mas faz-me impressão que uma autarquia consiga mobilizar-se em torno de projectos que implicam gastos colossais, mas não para pôr em prática aquelas transformações simples que contribuem para tornar a cidade mais habitável. Porque do que hoje se trata é disso mesmo: tornar a cidade agradável para quem nela reside.

Sucede que esta necessaria inversão de política vai contra todos os instintos que os partidos em geral, e o PS em particular, têm revelado quando se apoderam do poder autárquico.

Acredito que António Costa é um homem inteligente, sério e com capacidade organizativa. Acontece, porém, que, neste momento, aquilo que antes de mais se exige do novo Presidente da Câmara é fibra.

Será que ele a tem na dose necessária?

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