15.9.05

Simpatia pelos velhos mafarricos



Os Rolling Stones eram seis, não cinco. O sexto elemento, Ian Stewart, participou em todas as gravações e tournées do grupo até 1970. Mas tinha uma aparência demasiado normal para poder ser apresentado como um dos Stones.

Efectivamente, o sucesso do grupo exigia que os jovens fãs acreditassem que o comportamento dos músicos na sua vida privada correspondia rigorosamente à sediciosa imagem que exibiam em público.

O que escandalizava os adultos tanto quanto deslumbrava os adolescentes era precisamente a recusa dos bons costumes e das boas maneiras, a descarada assumpção do mau gosto, a transgressão dos tabús mais sagrados, o desafio ao estado de coisas dominante, a sensualidade sem peias - tudo coisas próprias de um grupo que abraçara sem vergonha o rythm n´blues, música demoníaca de negros americanos marginais e debochados.

Quando os Beatles foram acusados de posse de droga, tudo fizeram para provar a sua inocência, que, sabe-se hoje, era real. Quando o mesmo aconteceu com os Stones, o tema foi orgulhosamente exibido no LP seguinte e transformado, com toda a naturalidade, em mais um hit.

Esta intenção deliberada de provocar a rejeição da sociedade respeitável foi assumida da forma mais extrema pelo sinistro e repelente Keith Richards, uma espécie de moderno Heathcliff repescado de "O Monte dos Vendavais", o género de patife que todos desejamos ver o mais longe possível das nossas filhas.

Com o passar do tempo, é claro, o rastilho apagou-se, e os Stones acabaram por simbolizar um anémico satanismo middle-class que nos deixa indiferentes. Tirando o professor Espada, já não incomodam ninguém.

Como dizia Mick Jagger, num tempo já longínquo: "não se deve confiar em ninguém com mais de 40 anos". Por muito que nos custe, a mim e a eles, Deus falou pela boca do Jagger criança.

Em 2005, com A Bigger Bang, eles continuam a fazer o que sempre fizeram, e, o que é mais, a fazê-lo bem. Nem outra coisa se poderia pedir-lhes.

Quanto àqueles que não apreciam a música, devem ao menos reconhecer que, ao recusarem-se a passar à reforma, os Stones dão a sua contribuição para evitar que a segurança social vá à falência.

Sem comentários: