Um dia destes haveremos de tentar perceber como pode considerar-se competitiva uma economia que, depois de ter desvalorizado a sua moeda cerca de 40% de há cinco anos para cá, continua a apresentar um défice das transacções correntes equivalente a 9% do seu produto.
Estou a falar dos EUA, evidentemente.
30.11.06
Há coisas fantásticas, não há?
O Mãos ao ar é um blogue de dois sportinguistas que não só escrevem maravilhosamente como ainda por cima percebem mesmo de futebol.
Sportinguistas que percebem de futebol? Mas isso não é uma contradição nos termos? Eu estaria inclinado a dizer que sim, mas, depois de conhecê-los, terei provavelmente que rever a minha opinião.
Não percam, em especial a estupenda série "Os Merdinhas". Ainda vai na Parte 3.
Sportinguistas que percebem de futebol? Mas isso não é uma contradição nos termos? Eu estaria inclinado a dizer que sim, mas, depois de conhecê-los, terei provavelmente que rever a minha opinião.
Não percam, em especial a estupenda série "Os Merdinhas". Ainda vai na Parte 3.
Confirma-se a retoma
Após três meses consecutivos de crescimento acelerado, espera-se que também a OCDE e o FMI revejam em alta as suas previsões para o próximo ano.
Lá que há, há
Enquanto Ratzinger, ele era contra a entrada da Turquia na União Europeia. Enquanto Papa, a acreditar nos jornais de ontem, ele é a favor.
Obviamente, há aqui mãozinha do Espirito Santo.
Obviamente, há aqui mãozinha do Espirito Santo.
27.11.06
Ilhas de prosperidade
Querem mesmo imitar Singapura? A sério? Então vamos fazer o seguinte.
No nosso país, quase 50% da riqueza concentra-se nuns 10 concelhos. Se esses 10 concelhos se independentizassem, criar-se-ia um país altamente.
Mas isso seria um tanto complicado porque não há continuidade territorial entre todos eles. De modo que o plano poderia ser um bocadinho diferente.
Lisboa declararia a independência. Na margem Norte, ficaria com os concelhos de Lisboa, Oeiras, Sintra e Cascais. Na margem Norte, agregaria apenas Almada. Tudo o resto ficaria para Portugal.
O novo país - chamemos-lhe Nova Lisboa, visto que a cidade angolana do mesmo nome adoptou outra designação - guardaria para si os bancos, as seguradoras, as telecomunicações e as sedes de todas as grandes empresas industriais e de serviços. Reteria, no máximo, uns 20% dos funcionários públicos existentes. Acabaria com o exército e, em contrapartida, criaria uma imponente força policial para patrulhar as suas fronteiras. Os portugueses de Loures, Amadora, Barreiro e por aí fora, necessitariam de passaporte para virem trabalhar em Nova Lisboa. Evidentemente, seriam proibidos de ter acesso às praias da Caparica e da Linha. De vez em quando, o Benfica faria uma digressão por Portugal para gáudio dos indígenas.
Nova Lisboa tornar-se-ia numa sociedade próspera e competitiva, ao nível dos países mais evoluídos da Europa. Não teria de preocupar-se com o desenvolvimento do interior e das Ilhas. Não teria que financiar a construção de auto-estradas para Trás-os Montes. Não teria que subsidiar o ensino das crianças de aldeias longínquas. Não teria que tratar das doenças dos alentejanos. Essa inenarrável perda de tempo e de recursos que dá pelo nome de agricultura seria lançada às urtigas. A floresta poderia arder à vontade.
Em suma, esse país modelar povoado quase em exclusivo pela classe alta servida por criadagem portuguesa da província poderia dedicar-se inteiramente e sem estorvos à criação de riqueza.
Só haveria um problema: tenho a impressão de que os "doutores do Porto", como lhes chama o Franco Atirador, não iriam gostar.
No nosso país, quase 50% da riqueza concentra-se nuns 10 concelhos. Se esses 10 concelhos se independentizassem, criar-se-ia um país altamente.
Mas isso seria um tanto complicado porque não há continuidade territorial entre todos eles. De modo que o plano poderia ser um bocadinho diferente.
Lisboa declararia a independência. Na margem Norte, ficaria com os concelhos de Lisboa, Oeiras, Sintra e Cascais. Na margem Norte, agregaria apenas Almada. Tudo o resto ficaria para Portugal.
O novo país - chamemos-lhe Nova Lisboa, visto que a cidade angolana do mesmo nome adoptou outra designação - guardaria para si os bancos, as seguradoras, as telecomunicações e as sedes de todas as grandes empresas industriais e de serviços. Reteria, no máximo, uns 20% dos funcionários públicos existentes. Acabaria com o exército e, em contrapartida, criaria uma imponente força policial para patrulhar as suas fronteiras. Os portugueses de Loures, Amadora, Barreiro e por aí fora, necessitariam de passaporte para virem trabalhar em Nova Lisboa. Evidentemente, seriam proibidos de ter acesso às praias da Caparica e da Linha. De vez em quando, o Benfica faria uma digressão por Portugal para gáudio dos indígenas.
Nova Lisboa tornar-se-ia numa sociedade próspera e competitiva, ao nível dos países mais evoluídos da Europa. Não teria de preocupar-se com o desenvolvimento do interior e das Ilhas. Não teria que financiar a construção de auto-estradas para Trás-os Montes. Não teria que subsidiar o ensino das crianças de aldeias longínquas. Não teria que tratar das doenças dos alentejanos. Essa inenarrável perda de tempo e de recursos que dá pelo nome de agricultura seria lançada às urtigas. A floresta poderia arder à vontade.
Em suma, esse país modelar povoado quase em exclusivo pela classe alta servida por criadagem portuguesa da província poderia dedicar-se inteiramente e sem estorvos à criação de riqueza.
Só haveria um problema: tenho a impressão de que os "doutores do Porto", como lhes chama o Franco Atirador, não iriam gostar.
Alhos e bogalhos
Fiquei logo a tremer de medo quando um dos blasfemos ameaçou que iria responder à minha sequência de posts sobre Milton Friedman no Chile.
Estes tipos fazem-me lembrar o cão de Pavlov: toca-se-lhes no santinho, e põem-se logo a rosnar. Altamente previsíveis.
Enfim, lá pensaram (ai! ai!) um bocadinho, e o que é que saíu? Isto, ou seja, uma típica mistura de alhos com bogalhos.
Como seria de esperar, a habitual preguiça não lhes permitiu sequer darem-se ao trabalho de lerem o que escrevi. Para quê? Eles já viram tudo, já pensaram em tudo e já sabem tudo.
Eu digo que Friedman teve um comportamenmto vergonhoso no caso do Chile. Que respondem eles? Que o Chile é o país mais desenvolvido da América Latina. Que não faz sentido acabar com o embargo a Cuba. Que o investimento estrangeiro na China é uma coisa boa. Que a Nike faz bem em abrir fábricas no Vietname.
Digam-me vocês se estes tipos são bons da cabeça!
Não sei se vale a pena tentar impor o debate racional num manicómio, mas sempre vos direi duas ou três coisas:
1. O PNB foi inventado para se tentar quantificar a felicidade, pelo menos aquela parte que pode ser atribuida ao desfrute de bens materiais. Julgar que ele a esgota, porém, é asneira da grossa. Para usar um exemplo em que é mais provável que estejamos de acordo: imaginem que, sendo a Arábia Saudita criticada por as mulheres adúlteras serem apedrejadas até à morte, alguém contra-argumentava que, afinal, não podemos esquecer que o produto per capita do país impõe respeito. Topam?
2. Por muito estranho que vos pareça, o Chile já era o país mais rico da América Latina bem antes de vocês terem nascido. Embora não as conheça em detalhe (mas vocês também não), fico muito contente por saber que as políticas económicas aplicadas no país terão tido bons resultados. As mesmas orientações, porém, deram péssimos resultados noutros locais. Querem falar um dia do caso da Nova Zelândia? Estou certo que, com a vossa prosápia, não custa nada.
3. Como não sou fanático, reconheço muitos méritos (e também alguns deméritos) como economista ao Milton Friedman. Pura e simplesmente, não foi disso que falei. Em parte porque o essencial já foi dito por muita gente, em parte porque ainda não tive tempo para alinhavar um comentário a um tempo crítico e justo, ou seja, equilibrado. Esta palavra consta do vosso dicionário?
Estes tipos fazem-me lembrar o cão de Pavlov: toca-se-lhes no santinho, e põem-se logo a rosnar. Altamente previsíveis.
Enfim, lá pensaram (ai! ai!) um bocadinho, e o que é que saíu? Isto, ou seja, uma típica mistura de alhos com bogalhos.
Como seria de esperar, a habitual preguiça não lhes permitiu sequer darem-se ao trabalho de lerem o que escrevi. Para quê? Eles já viram tudo, já pensaram em tudo e já sabem tudo.
Eu digo que Friedman teve um comportamenmto vergonhoso no caso do Chile. Que respondem eles? Que o Chile é o país mais desenvolvido da América Latina. Que não faz sentido acabar com o embargo a Cuba. Que o investimento estrangeiro na China é uma coisa boa. Que a Nike faz bem em abrir fábricas no Vietname.
Digam-me vocês se estes tipos são bons da cabeça!
Não sei se vale a pena tentar impor o debate racional num manicómio, mas sempre vos direi duas ou três coisas:
1. O PNB foi inventado para se tentar quantificar a felicidade, pelo menos aquela parte que pode ser atribuida ao desfrute de bens materiais. Julgar que ele a esgota, porém, é asneira da grossa. Para usar um exemplo em que é mais provável que estejamos de acordo: imaginem que, sendo a Arábia Saudita criticada por as mulheres adúlteras serem apedrejadas até à morte, alguém contra-argumentava que, afinal, não podemos esquecer que o produto per capita do país impõe respeito. Topam?
2. Por muito estranho que vos pareça, o Chile já era o país mais rico da América Latina bem antes de vocês terem nascido. Embora não as conheça em detalhe (mas vocês também não), fico muito contente por saber que as políticas económicas aplicadas no país terão tido bons resultados. As mesmas orientações, porém, deram péssimos resultados noutros locais. Querem falar um dia do caso da Nova Zelândia? Estou certo que, com a vossa prosápia, não custa nada.
3. Como não sou fanático, reconheço muitos méritos (e também alguns deméritos) como economista ao Milton Friedman. Pura e simplesmente, não foi disso que falei. Em parte porque o essencial já foi dito por muita gente, em parte porque ainda não tive tempo para alinhavar um comentário a um tempo crítico e justo, ou seja, equilibrado. Esta palavra consta do vosso dicionário?
E se a escravatura se revelasse o regime economicamente mais eficiente?
Robert W. Fogel, vencedor do Prémio Nobel da Economia em 1993.
Há três anos já escrevi um post sobre o problema muito apropriadamente levantado pelo Lutz.
Pode ser relido aqui. Basicamente, fiz então notar que, segundo Robert W. Fogel, laureado com o Prémio Nobel da Economia em 1993, a escravatura era um regime de trabalho eficiente e rentável.
Assim, segundo este autor, está demonstrado que o crescimento económico e tecnológico é perfeitamente possível, mesmo no interior de uma ordem sócio-económica profundamente imoral.
Era costume ensinar-se nas faculdades de economia que a escravatura terminara porque constituía um entrave ao progresso. Mas isso, pura e simplesmente, não é verdade: a abolição da escravatura resultou da determinação política de muita gente, impulsionada por factores de ordem diversíssima, entre os quais os éticos, para pôr termo à escravatura.
25.11.06
Liberais à antiga (7)
O comportamento de Milton Friedman em relação ao Chile de Pinochet foi vergonhoso. Como explicá-lo?
Algumas pessoas acreditam que se tratou apenas de mais uma manifestação do síndroma de Siracusa, o mesmo que levou Platão a colocar-se ao serviço do tirano que governava aquela cidade para aí instaurar a República perfeita. Muitos intelectuais orgulhosos, incluindo Heidegger, d’Anunzio e Gorki, sucumbiram ao longo dos anos a essa tentação.
Quando se envolveu na política chilena, em meados dos anos 70, Friedman ainda não gozava dos favores de governos de países importantes, como um pouco mais tarde veio a suceder com Margaret Thatcher no Reino Unido e Ronald Reagan nos EUA. A vaidade ter-se-ia, portanto, sobreposto ao mais elementar bom senso.
Pode ser que sim, mas as próprias declarações de Friedman sugerem que não terá sido apenas isso. Em muitos dos seus escritos encontramos insinuada a ideia de que, para ele, a liberdade económica é primordial, a liberdade política secundária, e a democracia um estorvo no caminho da primeira. Quando aos direitos humanos, pura e simplesmente não figuram na sua cartilha.
O que torna evidente que Friedman não era, de facto, um liberal à moda antiga, na linha de Hume, Humboldt ou Stuart Mill. Bem pelo contrário, a sua crença dogmática constitui uma usurpação inaceitável dos conceitos centrais do liberalismo, algo a que infelizmente nos habituámos ao longo das últimas décadas.
Por conseguinte, o título "Liberais à moda antiga" que utilizei na série de posts sobre a intervenção político-económica de Hayek e Friedman no Chile de Pinochet tinha uma intenção irónica que não terá passado desapercebida aos mais assíduos frequentadores deste blogue.
Algumas pessoas acreditam que se tratou apenas de mais uma manifestação do síndroma de Siracusa, o mesmo que levou Platão a colocar-se ao serviço do tirano que governava aquela cidade para aí instaurar a República perfeita. Muitos intelectuais orgulhosos, incluindo Heidegger, d’Anunzio e Gorki, sucumbiram ao longo dos anos a essa tentação.
Quando se envolveu na política chilena, em meados dos anos 70, Friedman ainda não gozava dos favores de governos de países importantes, como um pouco mais tarde veio a suceder com Margaret Thatcher no Reino Unido e Ronald Reagan nos EUA. A vaidade ter-se-ia, portanto, sobreposto ao mais elementar bom senso.
Pode ser que sim, mas as próprias declarações de Friedman sugerem que não terá sido apenas isso. Em muitos dos seus escritos encontramos insinuada a ideia de que, para ele, a liberdade económica é primordial, a liberdade política secundária, e a democracia um estorvo no caminho da primeira. Quando aos direitos humanos, pura e simplesmente não figuram na sua cartilha.
O que torna evidente que Friedman não era, de facto, um liberal à moda antiga, na linha de Hume, Humboldt ou Stuart Mill. Bem pelo contrário, a sua crença dogmática constitui uma usurpação inaceitável dos conceitos centrais do liberalismo, algo a que infelizmente nos habituámos ao longo das últimas décadas.
Por conseguinte, o título "Liberais à moda antiga" que utilizei na série de posts sobre a intervenção político-económica de Hayek e Friedman no Chile de Pinochet tinha uma intenção irónica que não terá passado desapercebida aos mais assíduos frequentadores deste blogue.
Liberais à moda antiga (6)
(Continuação)
Fiquemos por aqui, sim?
Friedman too saw himself in the vanguard. "In every generation," he is quoted in his flattering New York Times obituary, which spares just a sentence on his role in Chile, "there's got to be somebody who goes the whole way, and that's why I believe as I do."
And trailblazer both men were, harbinger of a brave and merciless new world. But if Pinochet's revolution was to spread throughout Latin America and elsewhere, it first had to take hold in the United States. And even as the dictator was "torturing people so prices could be free," as Uruguayan writer Eduardo Galeano once mordantly observed, the insurgency that would come to unite behind Ronald Reagan was gathering steam.
Today, Pinochet is under house arrest for his brand of "shock therapy," and Friedman is dead. But the world they helped usher in survives, in increasingly grotesque form. What was considered extreme in Chile in 1975 has now become the norm in the US today: a society where the market defines the totality of human fulfillment, and a government that tortures in the name of freedom.
Fiquemos por aqui, sim?
Liberais à moda antiga (5)
(Continuação)
(Continua)
Where Friedman made allusions to the superiority of economic freedom over political freedom in his defense of Pinochet, the Chicago group institutionalized such a hierarchy in a 1980 constitution named after Hayek's 1960 treatise The Constitution of Liberty. The new charter enshrined economic liberty and political authoritarianism as complementary qualities. They justified the need of a strong executive such as Pinochet not only to bring about a profound transformation of society but to maintain it until there was a "change in Chilean mentality." Chileans had long been "educated in weakness," said the president of the Central Bank, and a strong hand was needed in order to "educate them in strength." The market itself would provide tutoring: When asked about the social consequences of the high bankruptcy rate that resulted from the shock therapy, Admiral José Toribio Merino replied that "such is the jungle of . . . economic life. A jungle of savage beasts, where he who can kill the one next to him, kills him. That is reality."
But before such a savage nirvana of pure competition and risk could be attained, a dictatorship was needed to force Chileans to accept the values of consumerism, individualism, and passive rather than participatory democracy. "Democracy is not an end in itself," said Pinochet in a 1979 speech written by two of Friedman's disciples, but a conduit to a truly "free society" that protected absolute economic freedom. Friedman hedged on the relationship between capitalism and dictatorship, but his former students were consistent: "A person's actual freedom," said Finance Minister de Castro, "can only be ensured through an authoritarian regime that exercises power by implementing equal rules for everyone." "Public opinion," he admitted, "was very much against [us], so we needed a strong personality to maintain the policy."
(Continua)
24.11.06
Liberais à moda antiga (4)
(Continuação)
(Continua)
Hayek's University of Chicago colleague Milton Friedman got the grief, but it was Hayek who served as the true inspiration for Chile's capitalist crusaders. It was Hayek who depicted Allende's regime as a way station between Chile's postwar welfare state and a hypothetical totalitarian future. Accordingly, the Junta justified its terror as needed not only to prevent Chile from turning into a Stalinist gulag but to sweep away fifty years of tariffs, subsidies, capital controls, labor legislation, and social welfare provisions -- a "half century of errors," according to finance minister Sergio De Castro, that was leading Chile down its own road to serfdom.
"To us, it was a revolution," said government economist Miguel Kast, an Opus Dei member and follower of both Hayek and American Enterprise Institute theologian Michael Novak. The Chicago economists had set out to affect, radically and immediately, a "foundational" conversion of Chilean society, to obliterate its "pseudo-democracy" (prior to 1973, Chile enjoyed one of the most durable constitutional democracies in the Americas).
(Continua)
Liberais à moda antiga (3)
(Continuação)
(Continua)
Friedrich von Hayek, the Austrian émigré and University of Chicago professor whose 1944 Road to Serfdom dared to suggest that state planning would produce not "freedom and prosperity" but "bondage and misery," visited Pinochet's Chile a number of times. He was so impressed that he held a meeting of his famed Société Mont Pélérin there. He even recommended Chile to Thatcher as a model to complete her free-market revolution. The Prime Minister, at the nadir of Chile's 1982 financial collapse, agreed that Chile represented a "remarkable success" but believed that Britain's "democratic institutions and the need for a high degree of consent" make "some of the measures" taken by Pinochet "quite unacceptable."
Like Friedman, Hayek glimpsed in Pinochet the avatar of true freedom, who would rule as a dictator only for a "transitional period," only as long as needed to reverse decades of state regulation. "My personal preference," he told a Chilean interviewer, "leans toward a liberal dictatorship rather than toward a democratic government devoid of liberalism." In a letter to the London Times he defended the junta, reporting that he had "not been able to find a single person even in much maligned Chile who did not agree that personal freedom was much greater under Pinochet than it had been under Allende." Of course, the thousands executed and tens of thousands tortured by Pinochet's regime weren't talking.
(Continua)
Liberais à moda antiga (2)
(Continuação)
(Continua)
While he was in Chile Friedman gave a speech titled "The Fragility of Freedom" where he described the "role in the destruction of a free society that was played by the emergence of the welfare state." Chile's present difficulties, he argued, "were due almost entirely to the forty-year trend toward collectivism, socialism and the welfare state . . . a course that would lead to coercion rather than freedom." The Pinochet regime, he argued, represented a turning point in a protracted campaign, a tearing off of democracy's false husks to reach true freedom's inner core. "The problem is not of recent origin," Friedman wrote in a follow-up letter to Pinochet, but "arises from trends toward socialism that started forty years ago, and reached their logical and terrible climax in the Allende regime." He praised the general for putting Chile back on the "right track" with the "many measures you have already taken to reverse this trend."
(Continua)
23.11.06
Liberais à moda antiga (1)
Através de Brad de Long cheguei a este artigo de Greg Grandin sobre as aventuras de Friedman e Hayek no reino de Pinochet. Muito instrutivo. Ora leiam:
(Continua)
Friedman defended his relationship with Pinochet by saying that if Allende had been allowed to remain in office Chileans would have suffered "the elimination of thousands and perhaps mass starvation . . . torture and unjust imprisonment." But the elimination of thousands, mass hunger, torture and unjust imprisonment were what was taking place in Chile exactly at the moment the Chicago economist was defending his protégé. Allende's downfall came because he refused to betray Chile's long democratic tradition and invoke martial law, yet Friedman nevertheless insisted that the military junta offered "more room for individual initiative and for a private sphere of life" and thus a greater "chance of a return to a democratic society." It was pure boilerplate, but it did give Friedman a chance to rehearse his understanding of the relationship between capitalism and freedom.
(Continua)
Uma semana depois
Uma semana depois, os comentadores continuam a perguntar-se por que se decidiu Cavaco a conceder aquela entrevista naquelas circunstâncias àquele canal e àquela entrevistadora, se não tinha nada para dizer.
Cavaco Silva ainda não descobriu o que deve fazer um Presidente da República. Irá descobri-lo algum dia? A irrelevância e a inconsequência das suas iniciativas desde que tomou posse permitem que se duvide.
A pouco e pouco instala-se no país a sensação de que actualmente não há Presidente.
Ao aparecer, Cavaco quis apenas e só demonstrar que há.
Tê-lo-á conseguido? O tom desajustado da sua intervenção, justamente notado, entre outros, por Pacheco Pereira, confirma que se trata de um homem sem perfil para um cargo não executivo.
Esta necessidade de afirmação não augura nada de bom.
Neste momento, resolveu o problema apoiando o Governo sem qualquer distanciamento, o que, francamente, não é bom.
Algures no futuro afirmar-se-á opondo-se-lhe, o que poderá ser ainda pior.
Não se iludam: como o futuro se encarregará de comprovar, a instabilidade mora em Belém. A insegurança é sempre um perigo, ainda mais no titular do supremo cargo público da República.
Cavaco Silva ainda não descobriu o que deve fazer um Presidente da República. Irá descobri-lo algum dia? A irrelevância e a inconsequência das suas iniciativas desde que tomou posse permitem que se duvide.
A pouco e pouco instala-se no país a sensação de que actualmente não há Presidente.
Ao aparecer, Cavaco quis apenas e só demonstrar que há.
Tê-lo-á conseguido? O tom desajustado da sua intervenção, justamente notado, entre outros, por Pacheco Pereira, confirma que se trata de um homem sem perfil para um cargo não executivo.
Esta necessidade de afirmação não augura nada de bom.
Neste momento, resolveu o problema apoiando o Governo sem qualquer distanciamento, o que, francamente, não é bom.
Algures no futuro afirmar-se-á opondo-se-lhe, o que poderá ser ainda pior.
Não se iludam: como o futuro se encarregará de comprovar, a instabilidade mora em Belém. A insegurança é sempre um perigo, ainda mais no titular do supremo cargo público da República.
Vendam-no depressa
O jogo de ontem em Milão serviu para provar mais uma vez, a quem ainda tivesse dúvidas, que o Sporting não é bem um clube de futebol, embora também não se perceba exactamente o que deseja ser.
Como foi possível perder daquela forma perante um team que exibe a mais patética relação do planeta entre performance desportiva e euros gastos?
A explicação chama-se Nani.
Nani é o símbolo do que está mal no Sporting, mas os adeptos e os comentadores desportivos, em vez de o assobiarem, aplaudem-no. Para agravar as coisas, o Scolari veio agora compará-lo ao Figo.
Está a gozar, evidentemente. Há à face da Terra inúmeros futebolistas tanto ou mais habilidosos do que o Figo - o Nani, por exemplo - mas, de momento, não deve haver nenhum com aquele carácter e aquela personalidade. Como afirmava o Cruyff, não há nenhum que com tanto gosto aceite assumir responsabilidades.
O contrário disto é precisamente o Nani. O Nani gastou o jogo a fintar e a humilhar adversários, para gáudio dos amadores de espectáculos circenses. Apesar disso, nunca criou perigo para a baliza adversária, porque se limitou a fazer centros sem sentido ou a rematar para a bancada.
O que ele quis foi exibir-se para os olheiros, e cumpriu o seu propósito. Só o Sporting não conseguiu o que queria. Mas o que interessa isso, se os adeptos estão orgulhosos por a equipa ter dado show e por poderem atribuir a derrota à infelicidade?
Querem um conselho amigo? Vendam depressa o Nani, enquanto ele não se transforma definitivamente num novo Dominguez. Ao Inter, por exemplo...
Posner sobre Friedman
Eis algumas palavras sábias de Richard Posner acerca do legado intelectual de Milton Friedman:
(...) I find slightly off-putting what I sensed to be a dogmatic streak in Milton Friedman. I think his belief in the superior efficiency of free markets to government as a means of resource allocation, though fruitful and largely correct, was embraced by him as an article of faith and not merely as a hypothesis. I think he considered it almost a personal affront that the Scandinavian nations, particularly Sweden, could achieve and maintain very high levels of economic output despite very high rates of taxation, an enormous public sector, and extensive wealth redistribution resulting in much greater economic equality than in the United States. I don't think his analytic apparatus could explain such an anomaly.
I also think that Friedman, again more as a matter of faith than of science, exaggerated the correlation between economic and political freedom. A country can be highly productive though it has an authoritarian political system, as in China, or democratic and impoverished, as was true for the first half century or so of India's democracy and remains true to a considerable extent, since India remains extremely poor though it has a large and thriving middle class--an expanding island in the sea of misery. What is true is that commercial values are in tension with aristocratic and militaristic values that support authoritarian government, and also that as people become economically independent they are less subservient, and so less willing to submit to control by politicians; and also that they become more concerned with the protection of property rights, which authoritarian government threatens. But Friedman seemed to share Friedrich Hayek's extreme and inaccurate view that socialism of the sort that Britain embraced under the old Labour Party was incompatible with democracy, and I don't think that there is a good theoretical or empirical basis for that view. The Road to Serfdom flunks the test of accuracy of prediction!
I imagine that without the element of faith that I have been stressing, Friedman might have lacked the moral courage to propound his libertarian views in the chilly intellectual and political climate in which he first advanced them. So it should probably be reckoned on balance a good thing, though not to my personal taste. His advocacy of school vouchers, the volunteer army (in the era in which he advocated it--which we are still in), and the negative income tax demonstrates the fruitfulness of his master micreconomic insight that, in general, people know better than government how to manage their lives. But perhaps not always...
19.11.06
18.11.06
17.11.06
Onde estavas no 25 de Novembro?
Uma ou duas semanas antes do 25 de Novembro de 1975 teve lugar um debate no grande anfiteatro da Faculdade de Letras. Na mesa estavam Sottomayor Cardia, o Padre Manuel Antunes, Joana de Barros e este vosso amigo.
Não sei bem qual era o tema. Fosse ele qual fosse, discutiu-se, como por esses dias sempre se discutia, a eminente revolução socialista. Na plateia predominavam simpatizantes comunistas e (como se dizia na altura) seus satélites.
O debate foi muito civlizado, sobretudo tendo em conta a situação política explosiva que se vivia. Nas associações recreativas da Margem Sul e nas assembleias sindicais não era assim.
A dada altura, alguém acusou o PS de desempenhar o papel de Kerensky na Rússia de 1917 - um dos qualificativos mais achincalhantes que naquele momento se podia atribuir a alguém.
Foi então que Sottomayor Cardia se levantou lentamente e respondeu, muito calmo, que teria o maior orgulho em ficar na história como o Kerensky português.
Recordemo-lo pois assim no dia em que faleceu.
Os mistérios da produtividade
Para variar, uma excelente entrevista no Dia D de Luis Cabral, autor de um dos melhores manuais de "Organização Industrial" e investigador de créditos firmados na Stern School of Business de Nova Iorque.
É especialmente interessante o que ele tem para dizer sobre os problemas de produtividade das empresas portuguesas: "A melhor forma de aumentar a produtividade média é melhorar o mecanismo de selecção. O simples facto de retirar de circulação os menos produtivos já vai aumentar muitíssimo a produtividade média." E reforça o seu parecer com alguns exemplos.
Infelizmente, porém, a entrevistadora não explorou suficientemente o assunto, o que me faz mais uma vez pensar que continua a não lhe ser atribuída a importância que merece.
É especialmente interessante o que ele tem para dizer sobre os problemas de produtividade das empresas portuguesas: "A melhor forma de aumentar a produtividade média é melhorar o mecanismo de selecção. O simples facto de retirar de circulação os menos produtivos já vai aumentar muitíssimo a produtividade média." E reforça o seu parecer com alguns exemplos.
Infelizmente, porém, a entrevistadora não explorou suficientemente o assunto, o que me faz mais uma vez pensar que continua a não lhe ser atribuída a importância que merece.
16.11.06
Mensagem
A cordialidade sugerida pela foto é enganadora. Toda a verdade, nesta nova versão do Monstrengo de Fernando Pessoa.
Notícia sem ponta de interesse: Indústria do calçado admite aumentar nível de emprego
Lido na página 24 do Suplemento de Economia do Diário de Notícias de hoje:
"O número de empresas que consideram que o estado de negócios é bom ultrapassou, pela primeira vez desde 2001, o das que pensam que é mau, refere a Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes e Artigos de Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS). Reflectindo o bom momento da indústria, as empresas que admitem aumentar o seu nível de emprego excedem, pela primeira vez em oito anos, as que prevêm a sua redução."
15.11.06
Estou pouco confiante no fim da crise do Público
Quem lê a primeira página de hoje do Público fica com a impressão de que o Banco de Portugal reviu em baixa as suas previsões para o comportamento da economia portuguesa em 2006.
Nada mais falso:
1. O BP mantém a previsão de crescimento de 1,2% do PIB adiantada em Agosto;
2. Sobe de 8,4% para 9% a estimativa de crescimento das exportações;
3. Reduz de 5,7% para 4% a do crescimento das importações;
4. Em resultado de (2) e (3), o défice da balança de transacções correntes desce de 9,4% para 7,6% do PIB;
5. A estimativa de crescimento do consumo privado desce de 1,3% para 1,1%;
6. A do consumo público, de 0,7% para -0,2%;
7. Finalmente, prevê agora uma maior queda do investimento (-3,2%) do que em Agosto (-1,2%).
É preciso ser-se muito tendencioso para não se vislumbrarem as boas notícias. Assim:
1. Não só o crescimento continua a basear-se na exportação, como se consolida a contribuição desse factor para a retoma;
2. Reduz-se claramente o défice da balança de transacções correntes, o indicador sintético mais importante no actual momento da economia portuguesa;
3. Diminui em termos reais o consumo público.
Contra isto, que argumenta o Público? Fundamentalmente, três coisas:
1. O crescimento baseado nas exportações é frágil e incerto, porque depende da evolução da economia europeia. Seria melhor que dependesse de quê? Bem espremido, isto equivale a dizer: as coisas estão bem, mas pode ser que venham a piorar um dia. Muito obrigado pelo esclarecimento!
2. O investimento continua em quebra. E por que haveria ele de aumentar? Após um período de estagnação prolongada, o normal é que as empresas disponham de abundante capacidade excedentária. Quando a procura começa a recuperar é natural que necessitem de mais trabalhadores, mas não de mais equipamentos. Logo, só mais tarde o investimento deverá começar a crescer.
3. A previsão de crescimento do PIB do Banco de Portugal é inferior à do Governo. Há alguma novidade nisso? Pela própria natureza das suas funções, o Banco de Portugal é muito mais prudente nas suas previsões. Nessas condições, se ele prevê que o PIB cresça 1,2% é porque dispõe de dados que lhe asseguram que nunca ficará abaixo desse patamar. Por outras palavras, é praticamente certo que acabará por ser superior.
A interpretação tendenciosa dos resultados económicos é infelizmente a regra na nossa imprensa. Daí até se inventar um título alarmista de primeira página - "Banco de Portugal ainda está pouco confiante no fim da crise" - que engana completamente os leitores quanto ao que se está a passar, vai uma grande distância.
Nada mais falso:
1. O BP mantém a previsão de crescimento de 1,2% do PIB adiantada em Agosto;
2. Sobe de 8,4% para 9% a estimativa de crescimento das exportações;
3. Reduz de 5,7% para 4% a do crescimento das importações;
4. Em resultado de (2) e (3), o défice da balança de transacções correntes desce de 9,4% para 7,6% do PIB;
5. A estimativa de crescimento do consumo privado desce de 1,3% para 1,1%;
6. A do consumo público, de 0,7% para -0,2%;
7. Finalmente, prevê agora uma maior queda do investimento (-3,2%) do que em Agosto (-1,2%).
É preciso ser-se muito tendencioso para não se vislumbrarem as boas notícias. Assim:
1. Não só o crescimento continua a basear-se na exportação, como se consolida a contribuição desse factor para a retoma;
2. Reduz-se claramente o défice da balança de transacções correntes, o indicador sintético mais importante no actual momento da economia portuguesa;
3. Diminui em termos reais o consumo público.
Contra isto, que argumenta o Público? Fundamentalmente, três coisas:
1. O crescimento baseado nas exportações é frágil e incerto, porque depende da evolução da economia europeia. Seria melhor que dependesse de quê? Bem espremido, isto equivale a dizer: as coisas estão bem, mas pode ser que venham a piorar um dia. Muito obrigado pelo esclarecimento!
2. O investimento continua em quebra. E por que haveria ele de aumentar? Após um período de estagnação prolongada, o normal é que as empresas disponham de abundante capacidade excedentária. Quando a procura começa a recuperar é natural que necessitem de mais trabalhadores, mas não de mais equipamentos. Logo, só mais tarde o investimento deverá começar a crescer.
3. A previsão de crescimento do PIB do Banco de Portugal é inferior à do Governo. Há alguma novidade nisso? Pela própria natureza das suas funções, o Banco de Portugal é muito mais prudente nas suas previsões. Nessas condições, se ele prevê que o PIB cresça 1,2% é porque dispõe de dados que lhe asseguram que nunca ficará abaixo desse patamar. Por outras palavras, é praticamente certo que acabará por ser superior.
A interpretação tendenciosa dos resultados económicos é infelizmente a regra na nossa imprensa. Daí até se inventar um título alarmista de primeira página - "Banco de Portugal ainda está pouco confiante no fim da crise" - que engana completamente os leitores quanto ao que se está a passar, vai uma grande distância.
14.11.06
Acto de contrição
Extracto de "Has neo-liberalism failed Mexico?", por Brad de Long:
"We neo-liberals point out that NAFTA did not cause poor infrastructure, high crime, and official corruption. We thus implicitly suggest that Mexicans would be far worse off today without NAFTA and its effects weighing in on the positive side of the scale.
"That neo-liberal story may be true. But it is an excuse. It may not be true. Having witnessed Mexico’s slow growth over the past 15 years, we can no longer repeat the old mantra that the neo-liberal road of NAFTA and associated reforms is clearly and obviously the right one."
Vasco Pulido Valente e a modernização
A época moderna é aquela que continuamente se questiona a si mesma e se propõe como supremo propósito a auto-superação.
A modernização é o movimento que, assentando numa atitude de descontentamento metódico, põe em causa o presente em nome de algo que não existe nem se sabe ainda ao certo o que poderá vir a ser.
A modernidade idolatra o novo como critério valorativo supremo. Não tem outro conteúdo para além desse.
Pode-se achar (ou não) o moderno uma boa ideia. Pode-se achar (ou não) a modernidade um estado de coisas recomendável. Pode-se achar (ou não) o esforço de modernização uma orientação recomendável para os indivíduos e a sociedade.
Mas convém pelo menos que se saiba do que se fala quando se fala de modernização.
Quando, na sua crónica do passado sábado, Vasco Pulido Valente declara que o mero facto de se falar tanto em Portugal de modernização desde o século XVIII prova que o país continua a não ser moderno, ele comete dois erros:
1. No século XVIII ninguém falava de modernização, nem cá nem em parte nenhuma. O conceito de modernização é, digamos assim, moderno: só apareceu no final do século XIX, e ainda assim com um significado algo distinto daquele que hoje lhe damos. Antes disso falava-se de progresso, não de modernização.
2. Como a modernização é uma coisa que, por definição, não tem fim, o facto de se insistir na ideia não pode ser interpretado como sinónimo de fracasso, bem pelo contrário.
Todavia, temos que reconhecer que o prolongado sucesso do cronista Vasco Pulido Valente, conseguido pela repetição década após década da mesma homilia, parece efectivamente confirmar que o país resiste a modernizar-se.
A modernização é o movimento que, assentando numa atitude de descontentamento metódico, põe em causa o presente em nome de algo que não existe nem se sabe ainda ao certo o que poderá vir a ser.
A modernidade idolatra o novo como critério valorativo supremo. Não tem outro conteúdo para além desse.
Pode-se achar (ou não) o moderno uma boa ideia. Pode-se achar (ou não) a modernidade um estado de coisas recomendável. Pode-se achar (ou não) o esforço de modernização uma orientação recomendável para os indivíduos e a sociedade.
Mas convém pelo menos que se saiba do que se fala quando se fala de modernização.
Quando, na sua crónica do passado sábado, Vasco Pulido Valente declara que o mero facto de se falar tanto em Portugal de modernização desde o século XVIII prova que o país continua a não ser moderno, ele comete dois erros:
1. No século XVIII ninguém falava de modernização, nem cá nem em parte nenhuma. O conceito de modernização é, digamos assim, moderno: só apareceu no final do século XIX, e ainda assim com um significado algo distinto daquele que hoje lhe damos. Antes disso falava-se de progresso, não de modernização.
2. Como a modernização é uma coisa que, por definição, não tem fim, o facto de se insistir na ideia não pode ser interpretado como sinónimo de fracasso, bem pelo contrário.
Todavia, temos que reconhecer que o prolongado sucesso do cronista Vasco Pulido Valente, conseguido pela repetição década após década da mesma homilia, parece efectivamente confirmar que o país resiste a modernizar-se.
Revelação
Escreve Santana Lopes nas suas memórias do período em que esteve internado em São Bento:
Ora vejamos. Admitindo como altamente provável que Sá Carneiro, Emídio Guerreiro e Mota Pinto também não terão respondido, e que não fazia sentido telefonar a Durão Barroso, Santana poderia antes dizer que apenas Balsemão e Nogueira lhe deram troco.
"Quando fui eleito Presidente do PSD telefonei aos meus antecessores. Apenas Cavaco e Marcelo não responderam."
Ora vejamos. Admitindo como altamente provável que Sá Carneiro, Emídio Guerreiro e Mota Pinto também não terão respondido, e que não fazia sentido telefonar a Durão Barroso, Santana poderia antes dizer que apenas Balsemão e Nogueira lhe deram troco.
Notícia sem ponta de interesse: o autocarro fantasma
Lido na página 30 do Diário de Notícias de hoje:
"A autarquia de Torres Vedras irá manter o sistema de transportes iniciado há sete meses, apesar de admitir o fracasso da medida. O autocarro que liga o parque periférico ao centro da cidade tem tido uma média de apenas 20 utilizadores por dia."Agora vem a pergunta verdadeiramente difícil: acabar com este autocarro é de esquerda ou é de direita?
11.11.06
Notícias sem ponta de interesse
Lido na página 36 do Público de hoje:
"O saldo [positivo, entenda-se] da Segurança Social mais do que duplicou no primeiro semestre do ano, face ao mesmo período do ano passado, para 893,6 milhões de euros (...) o que traduz um crescimento de 125,4 por cento."Claro que isto não tem significado nenhum, porque daqui a 50 anos a Segurança Social poderá vir a apresentar um saldo negativo.
10.11.06
Do miguelismo texano
"Filhos de uma velha e relha direita que, por cá, tem medo (e ainda algum bom senso) de se assumir, acolheram-se ("liberais", mas à moda europeia da palavra) à sombra do império pentagonal, bizarramente seduzidos por uma espécie de miguelismo texano, visionário de um mundo a preto-e-branco soprado lá do alto a alguns eleitos (sabe-se lá como...), a quem o seu próprio país acaba de dar, embora tardiamente, a resposta apropriada."
E ainda:
"E por aí continuam a dar aulas de direita modernaça em escolecas universitárias para filhos-família dos "tios", com um proselitismo digno dos cursos para comandantes-de-castelo da antiga Mocidade (agora, sim, já podem ler Saramago)."
A imagem é perfeita: eu sempre imaginei que o Paulo Portas haveria de ficar um assombro com a farda da Mocidade Portuguesa.
O resto deste post definitivo e insuperável sobre os bushistas lusos pode ser lido no Espírito de Xabregas. Sob o título "Parochial Cons".
E ainda:
"E por aí continuam a dar aulas de direita modernaça em escolecas universitárias para filhos-família dos "tios", com um proselitismo digno dos cursos para comandantes-de-castelo da antiga Mocidade (agora, sim, já podem ler Saramago)."
A imagem é perfeita: eu sempre imaginei que o Paulo Portas haveria de ficar um assombro com a farda da Mocidade Portuguesa.
O resto deste post definitivo e insuperável sobre os bushistas lusos pode ser lido no Espírito de Xabregas. Sob o título "Parochial Cons".
Por outro lado...
Percebo. Mas também poderia ser assim: É por a América ser mais democrática que a Europa, mas também muito mais dada ao autoritarismo, que a sua política é infinitamente mais interessante que a europeia.
Cá vamos indo
Não só sou de raciocínio lento, como ainda por cima orgulho-me disso. Ainda irei a tempo de dizer qualquer coisa sobre as eleições nos EUA?
Muita gente continua a teimar em não perceber que George W. Bush não é um republicano como os outros.
O caso não é apenas que ele tenha governado a economia no exclusivo interesse dos ricos, tornado a Casa Branca num sítio onde principalmente se congeminam negócios e cometido erros graves de política internacional - o que já seria suficientemente mau.
Trata-se de alguém a quem não repugna roer nos direitos e garantias fundamentais, que não revela a mínima consideração pela vida humana e que fala directamente com Deus.
É possível que a derrota republicana não provoque automaticamente alterações de fundo na política externa norte-americana.
Mas - e isto é o mais importante - quebrou-se uma dinâmica extremista que nos levava a todos não se sabe bem para onde, e abriu-se de novo espaço à moderação, esse bem precioso que só valorizamos plenamente quando desaparece da vida política.
E isso é muito.
8.11.06
Tudo bem?
O meu amigo Jayme Kopke surpreendeu-se muito quando, ao chegar a Portugal vindo do Brasil , recebia as mais das vezes como resposta à trivial saudação: "Como vai?" desabafos do género: "Menos mal" ou "Nunca pior". Uma vez por outra, notava ele, lá aparecia algum optimista fanático capaz de reagir com um: "Cá vamos andando".
É claro que ele reconheceu imediatamente como absolutamente desadequada - por susceptível de ser considerada provocatória - a mais usual saudação brasileira: "Tudo bem?"
"Tudo bem? Tudo bem o quê? Aonde quer chegar com essa insinuação? Como é possível alguém assegurar que está tudo bem? Só um tolo pode pensar assim. Às vezes parece que está tudo bem, mas depois, num instante, fica tudo estragado. Não podemos esquecermo-nos de que a vida é uma história que acaba sempre mal."
Esta pérola da sabedoria popular é expressa de forma lapidar na conhecida frase: "Ninguém diga que está bem."
A felicidade só pode resultar de inconsciência ou má-fé. Qualquer pessoa sensata sabe que as coisas estão mal e tendem naturalmente a piorar. Para quê iludirmo-nos?
É claro que ele reconheceu imediatamente como absolutamente desadequada - por susceptível de ser considerada provocatória - a mais usual saudação brasileira: "Tudo bem?"
"Tudo bem? Tudo bem o quê? Aonde quer chegar com essa insinuação? Como é possível alguém assegurar que está tudo bem? Só um tolo pode pensar assim. Às vezes parece que está tudo bem, mas depois, num instante, fica tudo estragado. Não podemos esquecermo-nos de que a vida é uma história que acaba sempre mal."
Esta pérola da sabedoria popular é expressa de forma lapidar na conhecida frase: "Ninguém diga que está bem."
A felicidade só pode resultar de inconsciência ou má-fé. Qualquer pessoa sensata sabe que as coisas estão mal e tendem naturalmente a piorar. Para quê iludirmo-nos?
7.11.06
Notícia sem ponta de interesse: a piscina está meio cheia
Paulo Gorjão sugere que, tendo em conta as previsões da UE hoje conhecidas, eu terei embandeirado em arco antes de tempo com alguns indicadores conjunturais favoráveis.
Não creio que tenha razão. Em primeiro lugar, porque eu jamais embandeirei em arco. Limitei-me a sublinhar os factos. Em segundo lugar, porque as previsões da UE não contrariam em nada a expectativa de continuação da retoma económica.
Eu explico-me:
1. Fala-se usualmente de crise quando o crescimento do produto se reduz fortemente e o desemprego aumenta. (Quando o produto cai durante dois trimestres consecutivos fala-se de recessão.) É evidente que, com o crescimento do produto a consolidar-se e o desemprego a diminuir ao longo do ano, a crise económica acabou, a menos que se queira adoptar uma definição muito peculiar de crise económica.
2. Faço desde já notar que essa evolução não é mérito do governo, mas sim das empresas, pois são elas os principais agentes do desenvolvimento. Aquilo que os governos podem fazer para estimular o crescimento de um país só tem efeitos significativos a muito longo prazo.
3. Dizer isto não implica negar que permanecem problemas muito graves, designadamente dois: a) o enorme desequilíbrio da balança de transacções correntes, não compensado por um afluxo de investimento directo estrangeiro; b) o défice das contas públicas. Um e outro implicam o aumento descontrolado da dívida externa.
4. É por isso que o termo da crise económica não deverá traduzir-se tão cedo em políticas orçamentais expansionistas. Sei que isto não é fácil de explicar ao comum dos cidadãos, mas não creio que se deva mentir-lhes para tornar a política económica do governo mais aceitável.
5. O ministro Manuel Pinho pode ser criticado por a sua vistosa declaração se prestar a mal-entendidos e, designadamente, por criar dificuldades ao governo no momento ele procura justificar a necessidade de persistir numa política de austeridade. Mas não por ser falsa, porque não o é.
6. Alguns pretendem que é absurdo falar-se de fim da crise enquanto houver fábricas a fechar. É difícil encontrar palavras para qualificar uma tal afirmação. Segundo esse critério estaremos sempre em crise desde que algo corra mal ou, pelo menos, não corra inteiramente bem. Ora isso não é sério.
7. Relativamente às previsões da União Europeia, é preciso recordar três coisas. Em primeiro lugar, tendo elas subavaliado sistematicamente o desempenho da economia portuguesa nos últimos anos, a verdadeira notícia é que acabam de revê-las em alta. Em segundo lugar, as previsões hoje divulgadas não põem em dúvida a melhoria continuada da situação económica portuguesa em 2007. Em terceiro lugar, e isto é o mais importante, não há nenhuma forma científica de fazer previsões económicas, pelo que se trata apenas de mais uma opinião - certamente respeitável, mas apenas uma opinião.
8. O que me parece altamente criticável é a forma tendenciosa - ou será apenas estúpida? - como os nossos media sistematicamente destacam qualquer má notícia (mesmo que só na aparência) e desvalorizam ou ocultam (como nos casos que referi) qualquer boa nova. Se algum indicador piora, trata-se decerto de uma tendência de fundo destinada a perdurar nas próximas décadas. Se alguma coisa parece arribar, há-de haver qualquer situação particular que autorize a desvalorização do facto.
9. Qualquer pessoa, mesmo que não versada em teoria económica, entende que a criação de um ambiente de injustificada descrença só contribui para piorar as coisas, designadamente na medida em que trava as iniciativas empresariais e inibe o investimento.
10. Sobre a magnitude da tarefa que recai sobre o governo em 2007 não cabe a mínima dúvida. Mas não vejo nenhuma razão séria para apostar que ele vai falhar. Pelo contrário, a avaliar pelo que fez até agora.
Não creio que tenha razão. Em primeiro lugar, porque eu jamais embandeirei em arco. Limitei-me a sublinhar os factos. Em segundo lugar, porque as previsões da UE não contrariam em nada a expectativa de continuação da retoma económica.
Eu explico-me:
1. Fala-se usualmente de crise quando o crescimento do produto se reduz fortemente e o desemprego aumenta. (Quando o produto cai durante dois trimestres consecutivos fala-se de recessão.) É evidente que, com o crescimento do produto a consolidar-se e o desemprego a diminuir ao longo do ano, a crise económica acabou, a menos que se queira adoptar uma definição muito peculiar de crise económica.
2. Faço desde já notar que essa evolução não é mérito do governo, mas sim das empresas, pois são elas os principais agentes do desenvolvimento. Aquilo que os governos podem fazer para estimular o crescimento de um país só tem efeitos significativos a muito longo prazo.
3. Dizer isto não implica negar que permanecem problemas muito graves, designadamente dois: a) o enorme desequilíbrio da balança de transacções correntes, não compensado por um afluxo de investimento directo estrangeiro; b) o défice das contas públicas. Um e outro implicam o aumento descontrolado da dívida externa.
4. É por isso que o termo da crise económica não deverá traduzir-se tão cedo em políticas orçamentais expansionistas. Sei que isto não é fácil de explicar ao comum dos cidadãos, mas não creio que se deva mentir-lhes para tornar a política económica do governo mais aceitável.
5. O ministro Manuel Pinho pode ser criticado por a sua vistosa declaração se prestar a mal-entendidos e, designadamente, por criar dificuldades ao governo no momento ele procura justificar a necessidade de persistir numa política de austeridade. Mas não por ser falsa, porque não o é.
6. Alguns pretendem que é absurdo falar-se de fim da crise enquanto houver fábricas a fechar. É difícil encontrar palavras para qualificar uma tal afirmação. Segundo esse critério estaremos sempre em crise desde que algo corra mal ou, pelo menos, não corra inteiramente bem. Ora isso não é sério.
7. Relativamente às previsões da União Europeia, é preciso recordar três coisas. Em primeiro lugar, tendo elas subavaliado sistematicamente o desempenho da economia portuguesa nos últimos anos, a verdadeira notícia é que acabam de revê-las em alta. Em segundo lugar, as previsões hoje divulgadas não põem em dúvida a melhoria continuada da situação económica portuguesa em 2007. Em terceiro lugar, e isto é o mais importante, não há nenhuma forma científica de fazer previsões económicas, pelo que se trata apenas de mais uma opinião - certamente respeitável, mas apenas uma opinião.
8. O que me parece altamente criticável é a forma tendenciosa - ou será apenas estúpida? - como os nossos media sistematicamente destacam qualquer má notícia (mesmo que só na aparência) e desvalorizam ou ocultam (como nos casos que referi) qualquer boa nova. Se algum indicador piora, trata-se decerto de uma tendência de fundo destinada a perdurar nas próximas décadas. Se alguma coisa parece arribar, há-de haver qualquer situação particular que autorize a desvalorização do facto.
9. Qualquer pessoa, mesmo que não versada em teoria económica, entende que a criação de um ambiente de injustificada descrença só contribui para piorar as coisas, designadamente na medida em que trava as iniciativas empresariais e inibe o investimento.
10. Sobre a magnitude da tarefa que recai sobre o governo em 2007 não cabe a mínima dúvida. Mas não vejo nenhuma razão séria para apostar que ele vai falhar. Pelo contrário, a avaliar pelo que fez até agora.
5.11.06
Ámen (2)
"Todas as justuificações anteriores, ao longo da História, pressupunham uma verdade última na democracia - a nação, Deus, a História, o princípio de utilidade. Hoje, a minha ideia é que o ideal de democracia contém muita arrogância e é preciso torná-lo mais humilde. Se pudermos democratizar o ideal da democracia, veremos que a democracia é superior, é universal, porque é um modo de vida que permite a monitorização permanente do exercício do poder, a interrogação permanente de quem somos, a permanente possibilidade de encontrarmos um sentido para nós próprios neste mundo."
(John Keane, Público, 5.11.06)
(John Keane, Público, 5.11.06)
Ámen (1)
«[João Cravinho] mostrou-se convicto que o fenómeno [da corrupção] não é hoje um problema restrito a "um pequeno grupo de pessoas que vão cometendo alguns desvios nesta matéria", mas um "problema de sistema" que foi crescendo com a passagem para a democracia, num processo que "favoreceu o tráfico de influências, a colocação de pessoas em pontos-chave do sistema e a fidelização de clientelas a vários partidos". O resultado é a "captura do Estado", primeiro por grupos isolados, mas com o tempo através mesmo da "partilha de influência, entre grupos, de certos sectores" da administração. (...) Existe hoje "uma corrosão da democracia que, se nada for feito, vai desenvolver-se e profundar-se", até chegarmos a uma "italianização da vida pública portuguesa".»
(João Cravinho, Público, 5.11.06)
(João Cravinho, Público, 5.11.06)
4.11.06
Notícias sem ponta de interesse
Numa pequena notícia inserida na secção de Economia do Público de hoje pode ler-se:
Por que é que estas notícias não merecem destaque? Ora, porque desmentem directamente os cabeçalhos e os doutos comentários segundo os quais "os portugueses já desistiram de esperar a luz ao fundo do túnel". Tudo isso está muito bem explicadinho pelo Rui Tavares no artigo "A Grelha Queimada" que, só por si, vale bem os 1,25 € que custa o Público de hoje.
"O indicador de confiança dos consumidores melhorou em todas as suas componentes em Outubro, segundo os resultados dos inquéritos de conjuntura a empresas e consumidores do INE ontem divulgados."Noutra notícia sem ponta de interesse encontrada na mesma página, encontro isto:
"Desde o princípio do ano que a taxa de desemprego do Eurostat tem vindo a cair tanto na Zona Euro como em Portugal."
Por que é que estas notícias não merecem destaque? Ora, porque desmentem directamente os cabeçalhos e os doutos comentários segundo os quais "os portugueses já desistiram de esperar a luz ao fundo do túnel". Tudo isso está muito bem explicadinho pelo Rui Tavares no artigo "A Grelha Queimada" que, só por si, vale bem os 1,25 € que custa o Público de hoje.
O teste
Escreve Teodora Cardoso no Diário Económico de ontem:
"No nosso caso, a responsabilidade pelo avanço das reformas está agora muito mais no campo de uma Oposição e de parceiros sociais responsáveis que no do próprio Governo. Esta é, de facto, a altura para mostrarmos de que têmpera somos feitos."
Quem manda?
Se um administrador do BES vier para a praça pública discutir se a família Espírito Santo deve comprar ou vender acções do banco, e em que montante, o mais provável é que se veja na rua no dia seguinte.
António Mexia ainda deve estar recordado de como estas coisas são. No entanto, na esteira de outros casos similares, o actual Presidente da EDP nomeado por este Governo veio ontem a terreiro sustentar que o Estado deve manter a sua golden share na empresa por um período indeterminado.
Tendo em conta que o apoio a este tipo de intervenção do Estado na economia é tudo o contrário do que o próprio e os seus amigos políticos têm sustentado no âmbito do "Compromisso Portugal", apetece perguntar em nome de que interesses fala o Presidente da EDP ao defender a manutenção do presente statu quo.
António Mexia ainda deve estar recordado de como estas coisas são. No entanto, na esteira de outros casos similares, o actual Presidente da EDP nomeado por este Governo veio ontem a terreiro sustentar que o Estado deve manter a sua golden share na empresa por um período indeterminado.
Tendo em conta que o apoio a este tipo de intervenção do Estado na economia é tudo o contrário do que o próprio e os seus amigos políticos têm sustentado no âmbito do "Compromisso Portugal", apetece perguntar em nome de que interesses fala o Presidente da EDP ao defender a manutenção do presente statu quo.
3.11.06
A Agustina é o Quaresma da nossa literatura
A Agustina - uma típica escritora brinca-na-areia - ganha muito em ser lida aos bocadinhos. O problema dela é a incapacidade de encaixar as frases brilhantes que lhe invadem as alucinadas meninges numa estrutura que faça sentido.
Como o Eduardo Pitta já fez o favor de seleccionar os melhores trechos, acho que não vou precisar de ler o livro.
Como o Eduardo Pitta já fez o favor de seleccionar os melhores trechos, acho que não vou precisar de ler o livro.
Adolescência milenar
Os adolescentes sofrem horrores por imaginarem que toda a gente os espia continuamente e continuamente troça dos seus ridículos. Nem sonham que, pelo contrário, ninguém está minimamente interessado em seja o que for que eles façam ou digam.
De tudo o que se passa no mundo os portugueses interessam-se apenas pelo que sobre eles pensam os outros povos. Indignam-se muito quando descobrem que eles pensam em tudo menos em nós.
De tudo o que se passa no mundo os portugueses interessam-se apenas pelo que sobre eles pensam os outros povos. Indignam-se muito quando descobrem que eles pensam em tudo menos em nós.
Apartheid
Às sextas, o Público tem dois suplementos culturais.
O primeiro trata de cultura (cinema, rock, jazz); o segundo, digamos assim, de Cultura (romances, poesia, pintura, música clássica).
Para não haver confusões.
O primeiro trata de cultura (cinema, rock, jazz); o segundo, digamos assim, de Cultura (romances, poesia, pintura, música clássica).
Para não haver confusões.
Reestruturação ou conflito tribal
Faz todo o sentido, a meu ver, o receio de que a reestruturação do aparelho de Estado possa vir a tornar o seu colorido, por assim dizer, mais uniforme.
Aliás, é só por todos sabermos que os partidos políticos tendem a tratar o Estado como coisa sua que se justifica a quase impossibilidade de se despedirem funcionários públicos. Se assim não fosse, veriamos dezenas de milhar de funcionários serem afastados com os mais absurdos pretextos de cada vez que mudasse o governo.
Voltando à questão inicial, estamos pois avisados para nos mantermos atentos. É claro que, para os protestos do PSD virem a ser devidamente escutados quando (e se) isso se vier a justificar, conviria que ele nos habituasse a críticas mais equilibradas à acção governamental.
Aliás, é só por todos sabermos que os partidos políticos tendem a tratar o Estado como coisa sua que se justifica a quase impossibilidade de se despedirem funcionários públicos. Se assim não fosse, veriamos dezenas de milhar de funcionários serem afastados com os mais absurdos pretextos de cada vez que mudasse o governo.
Voltando à questão inicial, estamos pois avisados para nos mantermos atentos. É claro que, para os protestos do PSD virem a ser devidamente escutados quando (e se) isso se vier a justificar, conviria que ele nos habituasse a críticas mais equilibradas à acção governamental.
Iniquidade fiscal
A generalizada passividade em relação à iniquidade do nosso sistema fiscal, aqui mais uma vez denunciada, é um dos sintomas mais evidentes do regime de crueldade social que entre nós vigora. É necessário e premente pôr-lhe cobro.
Pode o governo dizer (e talvez seja verdade) que, de momento, não tem margem de manobra para alterar a situação. Mas, se não traçar uma estratégia para invertê-la, as decisões pontuais que conduziram ao presente estado de coisas continuarão a prevalecer no futuro.
Ora aí está uma bandeira que os sindicatos poderiam e deveriam agarrar.
Pode o governo dizer (e talvez seja verdade) que, de momento, não tem margem de manobra para alterar a situação. Mas, se não traçar uma estratégia para invertê-la, as decisões pontuais que conduziram ao presente estado de coisas continuarão a prevalecer no futuro.
Ora aí está uma bandeira que os sindicatos poderiam e deveriam agarrar.
1.11.06
Um breviário
Há dias, comprei nuns saldos a colectânea "Outra Opinião: Ensaios de História", do historiador tablóide Rui Ramos.
Dei o meu dinheirinho por bem empregado, porque aprendi imensa coisa.
A esquerda governou quase ininterruptamente o país desde o final da guerra civil, em 1833, até à Revolução de 28 de Maio de 1926. Durante todo esse período, "o povo, desconfiado de um estado professoral e intrometido, não ia às escolas, faltava às eleições, resistia ao cumprimento dos deveres fiscais e militares, e insistia em manter-se fiel àquilo que, para os liberais, eram 'superstições' e 'fanatismo religioso'".
Dezasseis anos depois de "a 5 de Outubro, os republicanos portugueses [terem derrubado] um regime que honrava os princípios do Estado de Direito e representativo", Portugal estava maduro para cair nos braços de Salazar, que não era propriamente de direita: "a missão das direitas, cujos partidos também estavam proibidos, era singelamente a de o apoiar".
"Não havia muita liberdade, é certo, mas também não a tinha havido no tempo do PRP." Havia repressão, é verdade, mas temos que nos lembrar que a política europeia da época também era muito violenta. Salazar era um crítico acerbo do liberalismo e da democracia, mas o que tinha em mente era o entendimento que os republicanos portugueses faziam desses conceitos.
O que mais o motivava era o confronto civilizacional contra o comunismo. Se ele se tivesse retirado do poder em 1945 é muito provável que fosse hoje um ídolo da esquerda, mas o país teria caído na guerra civil. Quase tudo o que ele fez era inevitável. Por exemplo, se não houvesse salazarismo teríamos tido guerra colonial à mesma.
O 25 de Abril não teve como propósito instaurar um regime democrático-liberal, mas apenas voltar a entregar o poder à esquerda. Por oportunismo, os chamados partidos de direita têm infelizmente pactuado com esta situação.
O herói do autor é Sá Carneiro. Ao contrário de todos os outros políticos portugueses sem excepção, era guiado por um projecto impoluto de liberdade que prosseguia sem tibiezas nem cedências. Infelizmente, o falecimento prematuro desse D. Sebastião retrospectivo nunca nos permitirá tirar a limpo se teria podido conservar a sua pureza ideológica após 1980. Ramos está convencido que sim, visto que, no almoço de 4 de Dezembro de 1980, Sá Carneiro explicou o seu plano:
"Ia deixar o governo aos dirigentes apolíticos do PSD. Dava-lhes um ano até eles se 'espetarem'. Depois, formaria um novo partido, juntando os militantes do PSD e a direcção do CDS. Então, voltaria ao ataque. De facto, como ele tinha previsto, eles 'espetaram-se'. Mas ele já não estava lá."Se vocês acham que este homem era um aventureiro, estão errados. Sá Carneiro era portador do único projecto genuíno de liberdade que nestes últimos trinta anos foi proposto aos portugueses.
Confesso que estou exausto. Um homem não aguenta mais do que uma certa dose de desmistificação de cada vez, e isto excede claramente a minha modesta capacidade.
Reconheço, todavia, que aprendi muita coisa. Neste livrinho reconheci o breviário inspirador de muito blogue, muita opinião publicada e alguma revista que por aí circula. Por outro lado, é curioso - mas pouco tranquilizador - que este dogmatismo torrencial seja produzido por um historiador profissional, do qual, imagino eu, seria de esperar uma abordagem mais escrupulosa e nuanceada dos factos.
Bendita a pátria que tais historiadores dá ao mundo.
PS - A exemplo de outros historiadores, Rui Ramos fulmina constantemente o anti-clericalismo da 1ª República. Se o anti-clericalismo foi um fenómeno tão importante como parece ter sido, eu esperaria que alguém tivesse a amabilidade de gastar também algumas páginas a contar-nos o que foi o clericalismo. Será pedir de mais?
Há sempre um fado desconhecido que espera por si
Outubro foi oficialmente declarado o mês horribilis do governo de José Sócrates.
E porquê? Terá o povo reagido mal à intransigência do executivo face aos sindicatos, às taxas moderadoras nos internamentos hospitalares, à introdução de portagens nalgumas SCUTs?
Não, mil vezes não. O que deixou o povo à beira de um ataque de nervos foi o anúncio, da responsabilidade de Manuel Pinho, de que a crise teria terminado.
Pode lá ser uma coisa dessas? Que seria de nós se nalgum dia, mesmo distante, a crise viesse mesmo acabasse? De que iriam as pessoas queixar-se? De que iriam os jornais falar? Como iria a oposição poder continuar a exigir o desmantelamento do regime, a privatização da segurança social, o facilitamento dos despedimentos e a redução dos impostos sobre os rendimentos do capital?
A cirse é o nosso modo de vida, o estado normal de existência do país, a única forma de estabilidade a que podemos legitimamente aspirar. Que Nossa Senhora nos defenda!
Como pode a crise ter acabado, argumenta-se, se continua a haver fábricas a fechar? Enquanto houver fábricas a fechar, loucos a guiarem fora da mão na A1, desempregados a assaltarem bancos em Setúbal, gangs a assaltarem velhotas na linha de Sintra - enquanto tudo isso suceder, não necessitaremos de nos preocupar, porque o futuro da crise estará assegurado.
Mas eis que o Ministro da Economia, que com tanta frequência diz asneiras, teve desta vez a infelicidade de dizer uma coisa certa. Não será isso razão mais do que suficiente para nos sentirmos todos preocupadíssimos?
E porquê? Terá o povo reagido mal à intransigência do executivo face aos sindicatos, às taxas moderadoras nos internamentos hospitalares, à introdução de portagens nalgumas SCUTs?
Não, mil vezes não. O que deixou o povo à beira de um ataque de nervos foi o anúncio, da responsabilidade de Manuel Pinho, de que a crise teria terminado.
Pode lá ser uma coisa dessas? Que seria de nós se nalgum dia, mesmo distante, a crise viesse mesmo acabasse? De que iriam as pessoas queixar-se? De que iriam os jornais falar? Como iria a oposição poder continuar a exigir o desmantelamento do regime, a privatização da segurança social, o facilitamento dos despedimentos e a redução dos impostos sobre os rendimentos do capital?
A cirse é o nosso modo de vida, o estado normal de existência do país, a única forma de estabilidade a que podemos legitimamente aspirar. Que Nossa Senhora nos defenda!
Como pode a crise ter acabado, argumenta-se, se continua a haver fábricas a fechar? Enquanto houver fábricas a fechar, loucos a guiarem fora da mão na A1, desempregados a assaltarem bancos em Setúbal, gangs a assaltarem velhotas na linha de Sintra - enquanto tudo isso suceder, não necessitaremos de nos preocupar, porque o futuro da crise estará assegurado.
Mas eis que o Ministro da Economia, que com tanta frequência diz asneiras, teve desta vez a infelicidade de dizer uma coisa certa. Não será isso razão mais do que suficiente para nos sentirmos todos preocupadíssimos?
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