30.12.06

O século dos barretes



Primeiro foi a ameaça do bug do milénio, que pôs o mundo inteiro na expectativa de uma catástrofe económica de proporções inomináveis. Na data aprazada, porém, nada sucedeu, excepto meia dúzia de indivíduos terem enriquecido à custa de centenas de milhões de tansos.

Depois, veio o susto das armas de destruição massiva, a breve trecho transformado em guerra contra o terror. Vale a pena dizer mais?

Seguiu-se uma distracção fabricada para exclusivo consumo doméstico. O processo Casa Pia foi anunciado como uma investigação destinada a desmantelar uma rede internacional de pedofilia envolvendo gente muito poderosa. Saldo final: a expectável condenação de um bode expiatório, a decapitação do principal partido da oposição e a colocação sob escuta do Presidente da República.

De regresso às grandes produções à escala global, fomos em seguida introduzidos à gripe das aves, uma pandemia vinda, como convém, do Oriente, que ameaçava varrer de um sopro uma grande parcela da humanidade. Passados dois anos, das aves nem pio.

O barrete que se segue chama-se nuclearização do Irão, e é o pretexto mais expedito para resolver o conflito do Iraque alargando o teatro das operações de guerra.

Anestesiado por tanto alarme gratuito, e descrente dos líderes que regularmente lhe atenazam os miolos com catástrofes anunciadas que os factos logo se encarregam de desmentir, o público acaba, como na história do pastorinho e do lobo, por encarar com descabida bonomia o aquecimento global do planeta que, esse sim, parece configurar uma ameaça séria e global para todos nós.

Mas - perguntarão - como é que eu sei que o aquecimento global não é apenas mais um barrete a juntar à longa (mas, ainda assim, incompleta) série que mencionei? Ora, porque, ao contrário do que sucedeu em todos os outros casos, este não é glosado em tons apocalípticos pelo Pacheco Pereira.

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