28.3.07

Lidar com a memória

Não, Paulo, não é indiferente a maneira como gerimos a nossa relação com o passado, porque disso depende uma relação saudável com o presente.

Pedir desculpa por aquilo que um povo fez de errado é indispensável se quisermos que a nossa memória colectiva contribua para a consolidação de uma ética pública marcada pelo sentido da responsabilidade.

Sem esse noção de responsabilidade histórica não há propriamente países, mas apenas sítios habitados por bandos que não se respeitam a si próprios.

Em Portugal, por exemplo, desconhece-se como o esclavagismo marcou durante séculos a nossa sociedade, porque os historiadores optaram na sua maioria por esconder essa realidade que justamente reputam vergonhosa.

A consequência prática é não se entender como isso envenenou os nossos comportamentos e moldou atitudes que hoje permanecem vivas, sem que consigamos entender as suas origens. Estou a pensar, por exemplo, na escassa dignididade que persistimos em atribuír ao trabalho - uma coisa que, como dizem alguns mais sinceros ou desbocados, "é bom para o preto".

A psicanálise destas patologias através da crítica histórica teria sem dúvida efeitos muito superiores ao dos sermões moralistas que os intelectuais de serviço nos servem com tanto afã.

Todos os países civilizados, Vaticano incluído, acham normal pedir desculpa pelas barbaridades cometidas. Também nisso a nossa classe dirigente se distingue desses bons exemplos pela negativa. Não admira que ande sempre tão zangada com a "Europa".

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