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Publicado no blogoexisto em 14.5.09:
Cenas dos próximos episódios
Os media entenderam rapidamente que Pinto Monteiro adora ouvir-se. No seu gabinete, à saída de uma conferência, à entrada de uma audiência ou de passagem para sítio nenhum, o PGR tinha sempre um esclarecimento a dar ou uma clarificação a fazer. Imagino a família a dizer-lhe, ao vê-lo diariamente na TV: “Hoje estiveste bem”.
No auge do entusiasmo com a sua própria pessoa, proclamou o combate aos condes, duques e marquesas que pululavam na Procuradoria, e aí terá começado o seu calvário. Nesse dia, alguns terão pensado com os seus botões: “Deixa-o pousar…”
Os acontecimentos dos últimos meses terão mostrado a Pinto Monteiro quem de facto manda na casa que superiormente não dirige. Talvez ele continue a inquirir-se se o seu telefone estará sob escuta, mas não pode ignorar que o segredo de justiça é quotidianamente violado sob as suas barbas ao sabor das conveniências de alguns e na mais completa impunidade.
Com o caso Freeport, a Procuradoria tomou definitivamente o freio nos dentes. De Janeiro para cá, Pinto Monteiro é queimado em lume brando na praça pública. Todos podemos ver que a sua autonomia de juízo e acção compara-se à de uma punching-ball atirada continuamente de um lado para o outro por jornalistas e magistrados.
Mais recentemente, o folhetim Freeport reanimou-se com o episódio das alegadas pressões sobre os investigadores do caso. Significativamente, os supostamente atingidos, em vez de se queixarem aos seus superiores hierárquicos, e antes de mais a Pinto Monteiro, impeliram o seu Sindicato a convocar a imprensa e a pedir uma audiência ao Presidente da República. Ficou assim clara perante todos a relevância do PGR na instituição que lhe está confiada.
Sob a pressão dos media, ele determinou então a abertura de um inquérito acerca de “pressões” do poder político que, por definição, e dada a autonomia do Ministério Público, não podem existir, e cujo conteúdo se resume a pedir uma investigação expedita, coisa que o próprio Sócrates fizera publicamente algum tempo antes.
“Não me toques, que me desafinas”, eis o grito angustiado de investigadores que se sentem ofendidos por alguém lhes sugerir que cumpram com diligência os seus mais elementares deveres profissionais.
No estilo a que a PGR nos habituou, não há caso, mas há ruído, muito ruído para consumo público. Como também seria de esperar, foram ouvidos amigos e conhecidos dos queixosos e produziu-se um volumoso relatório cujas conclusões mais uma vez chegaram primeiro às redações do que aos seus destinatários naturais, com a agravante de que, nesta circunstância, é muito mais fácil inferir quem promoveu a fuga.
Vale a pena notar que a mesma metodologia de inquirição incompetente e facciosa que nos ofereceu os maravilhosos dossiês Casa Pia, Maddie, Apito Dourado ou Operação Relâmpago, para citar apenas alguns, foi agora virada para o interior da organização. Encontramo-nos, pois, em plena intriga palaciana fomentada por um sindicato que parece arrogar-se o direito de comandar a investigação do país.
Na prática, estamos a assistir à tentativa de afastar alguém que parece não concordar inteiramente com a orientação que o Sindicato entende ser a mais adequada à condução de um caso de grande impacto público. Se a coisa pega, é de temer que os investigadores adiram a esta nova moda de se queixarem uns dos outros e conduzirem investigações uns sobre os outros – se é que não o fazem já.
Trata-se de uma evolução comum em instituições dominadas por uma lógicaconspirativa e revanchista: concluída a eliminação dos inimigos externos, Estaline promoveu a condenação dos seus camaradas do Comité Central.
A implosão pode estar próxima.
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5.8.10
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