23.8.10

O ciclista que impediu uma guerra civil

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Extracto da auto-biografia do filósofo italiano Gianni Vattimo (Non Essere Dio):

"Recordo bem o 14 de Julho de 1948, porque a minha irmã estava de férias em Cetraro no dia em que Antonio Pallante abriu fogo sobre Palmiro Togliatti [secretário-geral do Partido Comunista Italiano]. Distúrbios em Roma, mortes em Nápoles, Livorno, Génova.

"Aqui em Turim um grupo de operários aprisionou Vittorio Valletta , Presidente da FIAT, no seu escritório. O exército preparava-se para avançar. No dia seguinte, 15 de Julho, os telefones não funcionavam e os comboios não circulavam. A Itália estava partida em duas em Bolonha. Então De Gasperi e o Papa Pio XII telefonaram à equipa de ciclismo italiana que disputava o Tour de France. Gino Bartali estava vinte e dois minutos atrás do camisola amarela, mas escapou-se nesse dia na montanha e ganhou o Tour. A gigantesca manifestação convocada para as cinco e trinta na Piazza Duomo em Milão transformou-se - quando a rádio anunciou a vitória de Bartali - num grande festejo nacional. Todos falavam de Bartali. Togliatti e a revolução podiam esperar. Comecei a entender vagamente em que país vivia."
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4 comentários:

Diogo disse...

Tal o poder dos Media e tal o grau de bovinidade que move mais de 90% das pessoas.

António Araújo disse...

Diogo, mas podes ver isso das duas maneiras. As motivações políticas, aparentemente mais altivas e sérias que os motivavam a manifestar-se na rua e a preparar-se para a violencia, seriam assim tão sérias ou eram comportamentos igualmente bovinos (e mais destrutivos)? Quando eu vejo as massas a moverem-se por uma causa que não compreendem, que não analisaram, com a qual se relacionam meramente emocionalmente, por serem instigadas por quem delas pode beneficiar (segundo o velho argumento "se estás mal, alguém tem a culpa e tem que ser castigado") preferia por vezes que os desviassem para o ciclismo ou o futebol ou outra treta igualmente pacificante.

Penso nos idiotas anti-globalização que protestam contra as multi-nacionais destruindo os carros e lojas de uns pobres coitados que na maioria das vezes devem ser mais pobres que os merdas envolvidos nos protestos. Conheço o caso caricato de um ocupa que de vez em quando sai da casa degradada que infesta para ir tomar um banhinho à casa que o pai lhe dispensa, naqueles prédios reluzentes da expo. Antes os divertissem com futebol.

João Pinto e Castro disse...

Meu Deus, que afã de polemizar! Não conseguem mesmo tirar prazer da estória e tirar dela mais que conclusões apressadas e superficiais?

António Araújo disse...

Caro JPC,
o próprio autor parece fazer exactamente o mesmo...

>Comecei a entender vagamente em que >país vivia

...de forma mais lacónica, é certo, mas está tudo dito.

O que não quer dizer que o episódio não seja divertido, num certo sentido estranho da palavra...mas é impossível não causar também calafrios.