10.7.06

Toma, e vai-te curar



Quando tudo estiver há muito esquecido - os golos inesperados, e os penalties falhados, e as defesas impossíveis - quando as lesões tiverem sarado e as bandeiras apodrecido, daqui a muitos anos, quando os vencedores e os vencidos estiverem reformado, a única memória que restará deste Mundial será a cabeçada de Zidane, e, se o próprio entretanto não o contar, a insaciada curiosidade sobre o que lhe tirá dito Materazzi.

Mas, seja o que for que o outro lhe disse, é claro que alguém tão controlado como Zizou só agiu assim porque quis, nunca por um impulso irracional. Reparem como ele primeiro se afastou tranquilamente de Materazzi e, depois de pensar e repensar, se virou e, sem sinal de irritação, se dirigiu para ele com passos medidos e frios, lhe aplicou cirurgicamente a cabeçada em pleno peito e depois esperou, sem sobressalto, que o árbitro lhe apontasse o inevitável cartão cor de sangue.

Como pôde ele fazer aquilo apenas dez minutos antes de concluir uma brilhante carreira, perguntam os filisteus?

Mas por alma de quem haveria Zidane, depois de trazer a França ao colo até à final, correr o risco de se despedir dos relvados falhando um penalty? Depois de anos a aturar os Le Pen, os Chirac, os Floriano Perez, os Wanderley Luxemburgo, os Platini, os Blatter, os Domenech, sem falar dos dirigentes corruptos, dos jornalistas ignorantes e das claques boçais, os dichotes de Materazzi foram a gota de água que fez transbordar o vaso.

Primeiro, sentiu-se inclinado a ignorá-lo. Depois, pensando melhor, atentou na esplêndida oportunidade que assim lhe era oferecida.

Vendo bem, este era o momento tão ansiado em que, sem cuidar do que dirão dele no dia seguinte, marimbando-se para o público e os comentadores, ele finalmente podia exclamar, por interposta cabeçada: "E se fosseis todos para o ...?"

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