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Há escassos dias, António Mexia explicou que, se os vencimentos e prémios que ganha são tão altos, é porque os accionistas assim decidiram. Por muito que lhe isso desagrade, não lhe resta senão resignar-se.
Mas eis que, na 5ª feira, um dos principais accionistas da EDP (mais precisamente o Estado) não conseguiu sequer incluir na ordem de trabalhos a sua proposta de congelamento temporário dos prémios dos gestores.
Parece assim confirmar-se que a opinião dos accionistas – incluindo alguns dos maiores – dificilmente consegue fazer-se ouvir, quando mais impor-se.
Serão de facto os accionistas quem fixa os vencimentos dos gestores? Não propriamente. As remunerações dos corpos gerentes são usualmente determinadas por uma comissão de vencimentos, de modo que a questão deveria antes ser: quem nomeia os membros dessa comissão? Igualmente relevante seria descobrir quem nomeia os presidentes das assembleias gerais que recusam admitir à discussão a redução ou o congelamento dos prémios dos gestores.
Esgravatando um pouco o assunto, descobre-se que, nas grandes sociedades anónimas, quem manda é de facto um reduzido núcleo de poder envolvendo um ínfimo número de accionistas detentores de posições de controlo, mancomunado com os homens de mão que a si associam para controlarem a marcha dos acontecimentos no dia a dia.
Estas pessoas não só fixam os vencimentos e os prémios dos gestores, como também nomeiam as administrações não-executivas, os conselhos de gestão, as mesas das assembleias de sócios, os conselhos fiscais, as comissões de remunerações, os directores de topo e, em geral todos os cargos influentes e bem pagos.
Em muitas das nossas maiores empresas, esses lugares são distribuídos pelos familiares dos maiores accionistas, como, tantas vezes, os seus apelidos tornam evidente. Além disso, servem-se ainda do poder que detêm para recrutar vastas clientelas de quadros superiores e intermédios e para seleccionarem fornecedores dos mais diversos bens e serviços em condições de favor.
Esta breve descrição não esgota as formas através das quais um pequeno número de accionistas dispõe em seu favor do património que é propriedade nominal de milhares ou dezenas de milhares de pessoas e de que, afinal, eles não possuem mais do que uma fracção, por vezes mínima.
Em tudo isto, a grande massa dos accionistas não é tida nem achada. Os vencimentos e prémios dos gestores são na verdade atribuídos por aqueles poucos accionistas a quem eles prestam serviços e retribuem favores. Em tudo isto, cabe apenas ao Estado o papel do corno manso.
Estamos entendidos?
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19.4.10
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4 comentários:
Negar sistematicamente a evidência do que descreves faz parte apenas da propaganda permanente desse núcleo de poderosos. Este caso da EDP é um pouco estranho, dado o Estado ter uma posição accionista tão importante. Seria interessante perceber um pouco melhor o que se passou, o Estado não é forçosamente uma entidade monolítica, deve-se ter tratado de uma luta entre dois poderes estatais.
Tem graça, que de repente dei comigo a fazer a seguinte analogia: substitui EDP por sistema político! E adere perfeitamente à realidade!
A regra de acordo com a qual uma sociedade anónima deve ser uma pequena democracia não deve ser alterada: afinal, as sociedades anónimas sao de responsabilidade limitada e, se os accionistas quiserem seguir uma via ruinosa, o problema será unicamente deles.
Esta regra tem que ser temperado contudo no caso da EDP. Estamos a falar numa empresa em situação de monopólio que actua num sector essencial para a vida de um país. Por outro lado, como qualquer boa empresa privatizada, os accionistas actuais nao realizaram os investimentos necessários à instalação da rede eléctrica nacional da qual sugam copiosos ganhos, qual cornucópia dos tempos modernos. O Estado ou uma entidade independente deve ter uma posição de controlo nessas sociedades que controle os abusos do poder accionista.
Afinal: é fácil ser capitalista quando não se tem concorrentes, o risco é reduzido e os ganhos extraordinários!
Entendidíssimos. O que eu não entendo é como os liberais conciliam a sacralização da propriedade privada individual com a existência desses colectivos impessoais que são as sociedades anónimas (uma "abominação", no dizer de Adam Smith).
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