19.7.07

Desenvolvimento e desigualdade



Escrevem Alesina e Giavazzi nas primeiras páginas do seu livro O Futuro da Europa, recentemente editado em Portugal:
"A experiência da Argentina é um fantasma que paira sobre a Europa. No início do século passado, a Argentina era um dos países mais ricos do mundo (...). Entretanto, o mundo mudou, mas os argentinos continuaram a pensar que exportar milho e carne de vaca bastava para se manterem ricos."
Acreditarão eles de facto que o problema dos argentinos foi terem continuado a exportar milho e carne de vaca?

Muito resumidamente, quando, no início do século XX, o país conheceu um extraordinário surto de prosperidade, os pobres ficaram cada vez mais pobres. Com o agravamento das desigualdades sociais, acirrou-se a luta de classes.

Quando um governo moderado procurou reestabelecer algum equilíbrio, defrontou-se com a resistência violenta da oligarquia local coligada com os interesses comerciais e financeiros britânicos.

A frágil tradição liberal argentina esboroou-se, de tal modo que Péron subiu ao poder com uma orientação pró-fascista no próprio momento em que o Eixo fora aniquilado no resto do mundo.

Os sindicatos, que queriam antes de tudo vingança, aliaram-se a Péron, o qual, para assegurar o apoio dos trabalhadores argentinos, aplicou políticas distributivas extremistas que deram cabo do pouco que, após décadas de lutas sem quartel entre patrões e operários, ainda restava de uma economia saudável.

Ainda assim, em 1975, ao fim de seis décadas sem crescimento, a Argentina permanecia um país mais rico do que a Espanha.

Nos poucos momentos em que houve liberdade, as forças anti-democráticas ganharam as eleições. Surgiu o terrorismo, tanto de extrema-direita como de extrema-esquerda. Por último, uma ditadura sanguinária e militarista instalou-se no país.

A Argentina é um caso exemplar de um país onde as desigualdades sociais acabam por hipotecar as hipóteses de crescimento económico. Esse é o risco que hoje correm os Estados Unidos, não a Europa.

A ignorância revelada na citação de Alesina e Giavazzi é típica da mentalidade que hoje predomina entre os economistas. Desconhecedores como são, na sua grande maioria, da história económica, não suspeitam que os problemas económicos mais graves têm as suas origens profundas não na economia, mas na política e na sociedade.

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