2.1.08

O eco da rua

Há dias, Sócrates aproveitou a despropósito a mensagem de Natal para fazer propaganda aos seus sucessos governamentais.

O Presidente da República parece ter-se sentido na necessidade de ripostar, e o resultado foi o seu estranhíssimo discurso televisionado de ontem à noite.

Há um ano, Cavaco ameaçou que iria estar atento e que exigiria resultados no final de 2007, afirmação que deu azo - lembram-se? - a grande foguetório nas hostes da oposição. Concluida mais uma volta da Terra ao Sol, qual foi então a conclusão do Presidente?

Em breves palavras, nenhuma.

O mais surpreendente para mim, porém, foram estas palavras:
"[Os portugueses] não estão seguros de que os utentes, principalmente os de recursos mais baixos, ocupem, como deve ser, uma posição central nas reformas que são inevitáveis para assegurar a sustentabilidade financeira dos serviços de saúde. (...) Seria importante que os portugueses percebessem para onde vai o país em matéria de cuidados de saúde." (transcrição retirada do Público de hoje)
Deixa-me lá ver se eu entendi. Por um lado, o Presidente considera as reformas da saúde (estas? outras?) inevitáveis, mas apenas por razões financeiras. Por outro lado, em vez de tomar posição, dá voz à suspeita de que talvez os "utentes de recursos mais baixos" tenham razão para estar inquietos, e acrescenta que seria importante os portugueses poderem perceber para onde vai o país.

Que postura é esta? Estamos perante um mero comentador que se entretém a dar notas à Marcello, perante um repórter que transmite as preocupações da rua, ou perante um Presidente da República solidário com o Governo que empossou e co-responsável pelas suas políticas. Onde está afinal a prometida cooperação estratégica?

Mais uma pergunta: o Presidente da República ignora para onde vai o país em matéria de cuidados de saúde? Não é possível imaginar-se que seja esse o caso. Mas, se conhece o rumo, porque não trata de o afirmar claramente em vez de se limitar a insinuar que alguém indeterminado deverá fazê-lo?

Afinal, como interpreta Cavaco Silva o papel e as responsabilidades do Presidente da República? Eis o que não está claro, nem para ele, nem para nós. Já começa a tardar.

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