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Pode ser lido como o pensamento do dia:
Felix Salmon highlights an important point to bear in mind when it comes to banks and short sales. Actually, it’s as important to bear in mind when you’re thinking about any big private sector company, be it Citigroup or British Petroleum. Yes, companies do things in their own self-interest that hurt other people and may not be net benefits to society. But they also do things that are not in their own self-interest all the time, because companies just aren’t all that efficient.
Felix’s post is largely about two factors. One is that big company executives are prone to exactly the same sort of cognitive fallacies as ordinary people, and hence make stupid decisions routinely. The second is that the incentives of individual people who make decisions (or provide information to people who make decisions) are only tangentially related to the interests of the company as a whole, and certainly not when you think of those interests over the long term.
A third factor is simply that companies are big, dumb, poorly designed institutions. There’s lots of talk about how individual human beings do not resemble the rational actors of textbook economic theory. The same is at least as true of big companies, of which I have seen many, from various perspectives.
Yet the belief that the private sector is the answer to all our problems remains deeply rooted. One might even call it an ideology. I would hope that the financial crisis (and the BP disaster) might cause people to question that ideology, at least a little bit.
James Kwak, no The Baseline Scenario.
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30.6.10
“Perguntem ao Queiroz”
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A selecção ganhou um jogo, empatou dois e perdeu outro. Nada mau, tendo em conta o real potencial dela (entre as primeiras 20, mas muito abaixo do nº 3 que o equivocado ranking da FIFA lhe atribui) e a qualidade dos adversários. Tirando Cavaco Silva e mais uns quantos águias, teremos todos que nos resignar.
Não é por a selecção ter sido eliminada nos oitavos que Queiroz não presta. É porque não presta.
Queiroz falhou da forma mais estrondosa precisamente no único jogo que ganhou, e logo por sete a zero. Ele previu que a Coreia do Norte jogaria fechada como fizera contra o Brasil, por isso lançou Miguel, Coentrão e Hugo Almeida. Enganou-se, por isso esmagou; se tivesse antecipado correctamente a táctica adversária, teria, quando muito, ganho à rasquinha.
Só alguém muito muito muito burro não percebia que, até à saída de Almeida, a equipa portuguesa estava a jogar presa por arames. Foi aí que uma ideia – ocorrência tão funesta quanto improvável - atravessou o cérebro de Queiroz: “Vamos tirar os arames.”
Do primeiro ao último jogo, todos os livres a 40 metros da baliza foram rematados directamente ao golo pelo Ronaldo, o que significa que nenhum desses lances se aproveitou. Quem decidiu assim?
Se foi Queiroz, fica claro que a sua táctica resumia-se a esperar que Ronaldo resolvesse os problemas da selecção num rasgo de génio. Se foi Ronaldo, fica claro que a selecção não tem orientação. Vendo bem, ambas as alternativas levam à mesma conclusão.
A gente não precisa de assistir aos treinos para entender, não é preciso ver aquilo que se imagina. O Professor (desconfiemos de todas as pessoas que se apresentam como Professores com P grande), publicamente, só diz tolices.
É claro que os jogadores não o respeitam. Ninguém respeita líderes que repetida e consistentemente provam a sua total e absoluta incapacidade.
Ele combina a saloice arcaica dos “heróis do mar” com a parolice cool da “imagem moderna”. Vocês imaginam as reuniões do Madaíl com o Queiroz? É isso, aposto que se fala dos concertos dos Black Eyed Peas, das exigências dos patrocinadores e das relações com os media. De futebol, nada.
A saída de Queiroz não garantiria apoteóticas vitórias futuras, limitar-se-ia a, reconhecendo o óbvio, criar uma situação mais sã. Infelizmente, estamos impedidos pelo PEC.
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A selecção ganhou um jogo, empatou dois e perdeu outro. Nada mau, tendo em conta o real potencial dela (entre as primeiras 20, mas muito abaixo do nº 3 que o equivocado ranking da FIFA lhe atribui) e a qualidade dos adversários. Tirando Cavaco Silva e mais uns quantos águias, teremos todos que nos resignar.
Não é por a selecção ter sido eliminada nos oitavos que Queiroz não presta. É porque não presta.
Queiroz falhou da forma mais estrondosa precisamente no único jogo que ganhou, e logo por sete a zero. Ele previu que a Coreia do Norte jogaria fechada como fizera contra o Brasil, por isso lançou Miguel, Coentrão e Hugo Almeida. Enganou-se, por isso esmagou; se tivesse antecipado correctamente a táctica adversária, teria, quando muito, ganho à rasquinha.
Só alguém muito muito muito burro não percebia que, até à saída de Almeida, a equipa portuguesa estava a jogar presa por arames. Foi aí que uma ideia – ocorrência tão funesta quanto improvável - atravessou o cérebro de Queiroz: “Vamos tirar os arames.”
Do primeiro ao último jogo, todos os livres a 40 metros da baliza foram rematados directamente ao golo pelo Ronaldo, o que significa que nenhum desses lances se aproveitou. Quem decidiu assim?
Se foi Queiroz, fica claro que a sua táctica resumia-se a esperar que Ronaldo resolvesse os problemas da selecção num rasgo de génio. Se foi Ronaldo, fica claro que a selecção não tem orientação. Vendo bem, ambas as alternativas levam à mesma conclusão.
A gente não precisa de assistir aos treinos para entender, não é preciso ver aquilo que se imagina. O Professor (desconfiemos de todas as pessoas que se apresentam como Professores com P grande), publicamente, só diz tolices.
É claro que os jogadores não o respeitam. Ninguém respeita líderes que repetida e consistentemente provam a sua total e absoluta incapacidade.
Ele combina a saloice arcaica dos “heróis do mar” com a parolice cool da “imagem moderna”. Vocês imaginam as reuniões do Madaíl com o Queiroz? É isso, aposto que se fala dos concertos dos Black Eyed Peas, das exigências dos patrocinadores e das relações com os media. De futebol, nada.
A saída de Queiroz não garantiria apoteóticas vitórias futuras, limitar-se-ia a, reconhecendo o óbvio, criar uma situação mais sã. Infelizmente, estamos impedidos pelo PEC.
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29.6.10
Apple IIe
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Compreendo que isso não vos interesse demasiado, mas este foi o primeiro computador com que trabalhei, em 1983.
Note-se que nunca houve um Apple I, começaram logo pelo II para dar a impressão que já tinham uma história de sucesso. O "e" indica que se tratava da versão "extended".
Outro facto notável: não era possível gravar ficheiros no disco duro, apenas nas diskettes floppy 5.2.
Estas coisas é que nos fazem velhos.
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Compreendo que isso não vos interesse demasiado, mas este foi o primeiro computador com que trabalhei, em 1983.
Note-se que nunca houve um Apple I, começaram logo pelo II para dar a impressão que já tinham uma história de sucesso. O "e" indica que se tratava da versão "extended".
Outro facto notável: não era possível gravar ficheiros no disco duro, apenas nas diskettes floppy 5.2.
Estas coisas é que nos fazem velhos.
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Onde está o dinheiro?
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Os bancos centrais expandiram dramaticamente desde 2008 a base monetária, que é a parte da oferta de moeda que controlam directamente.
Em condições normais, estaríamos agora com uma taxa de inflação bem superior a 30%. Por que é que isso não aconteceu?
Numa palavra, porque o dinheiro injectado pelos bancos centrais não está a circular. A agravada percepção de risco fez as empresas e particulares aumentarem bruscamente a sua poupança. Não gastam, nem investem.
Todavia, as poucas empresas que querem investir não conseguem crédito, visto que os bancos têm dificuldade em avaliar rigorosamente o risco envolvido.
Os estados intervieram então para sustentar a procura agregada. Os bancos não se importavam de lhes emprestar porque se sentiam seguros, mas a crise das dívidas soberanas inverteu a situação. Agora, não há dinheiro para ninguém.
Apesar de o sistema bancário no seu conjunto estar encharcado em dinheiro, os bancos temem emprestar uns aos outros porque desconhecem a situação real dos candidatos a devedores. Para evitar o colapso do crédito, o BCE substituíu-se nos últimos meses ao mercado inter-bancário.
O sistema financeiro é um morto vivo. Continua a captar as poupanças mas não cumpre a sua função de alocá-las de uma forma eficiente. Está exclusivamente centrado nos seus próprios problemas, fruto dos níveis de alavancagem atingidos na última década. Por outras palavras, encontra-se ligado à máquina.
Mas eis que, para agravar as coisas, Trichet anuncia a suspensão do programa de refinanciamento dos bancos europeus, lançando o pânico na zona euro. A máquina vai ser desligada.
Apertem os cintos de segurança. Esta vai ser uma semana para gente crescida.
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Os bancos centrais expandiram dramaticamente desde 2008 a base monetária, que é a parte da oferta de moeda que controlam directamente.
Em condições normais, estaríamos agora com uma taxa de inflação bem superior a 30%. Por que é que isso não aconteceu?
Numa palavra, porque o dinheiro injectado pelos bancos centrais não está a circular. A agravada percepção de risco fez as empresas e particulares aumentarem bruscamente a sua poupança. Não gastam, nem investem.
Todavia, as poucas empresas que querem investir não conseguem crédito, visto que os bancos têm dificuldade em avaliar rigorosamente o risco envolvido.
Os estados intervieram então para sustentar a procura agregada. Os bancos não se importavam de lhes emprestar porque se sentiam seguros, mas a crise das dívidas soberanas inverteu a situação. Agora, não há dinheiro para ninguém.
Apesar de o sistema bancário no seu conjunto estar encharcado em dinheiro, os bancos temem emprestar uns aos outros porque desconhecem a situação real dos candidatos a devedores. Para evitar o colapso do crédito, o BCE substituíu-se nos últimos meses ao mercado inter-bancário.
O sistema financeiro é um morto vivo. Continua a captar as poupanças mas não cumpre a sua função de alocá-las de uma forma eficiente. Está exclusivamente centrado nos seus próprios problemas, fruto dos níveis de alavancagem atingidos na última década. Por outras palavras, encontra-se ligado à máquina.
Mas eis que, para agravar as coisas, Trichet anuncia a suspensão do programa de refinanciamento dos bancos europeus, lançando o pânico na zona euro. A máquina vai ser desligada.
Apertem os cintos de segurança. Esta vai ser uma semana para gente crescida.
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28.6.10
Sem pés nem cabeça
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"Who’s to blame for the craptacularness of the England team? Fabio Capello? Matthew Upson? The Fifa official who appointed David Blunkett as a linesman?
None of them. I blame Taylor. Not Graham Taylor, but Frederick Winslow Taylor."
Para repousar das inanidades que por estes dias se lêem um pouco por toda a parte, vale a pena ler esta explicação do sistemático fracasso do futebol inglês. Apesar de algumas considerações totalmente fora de jogo, entre elas a referência ao Milan de 93-94.
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"Who’s to blame for the craptacularness of the England team? Fabio Capello? Matthew Upson? The Fifa official who appointed David Blunkett as a linesman?
None of them. I blame Taylor. Not Graham Taylor, but Frederick Winslow Taylor."
Para repousar das inanidades que por estes dias se lêem um pouco por toda a parte, vale a pena ler esta explicação do sistemático fracasso do futebol inglês. Apesar de algumas considerações totalmente fora de jogo, entre elas a referência ao Milan de 93-94.
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Estamos entregues aos bichos
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Krugman acha que, graças à histeria dos adeptos da austeridade, a Terceira Depressão está aí:
"I don’t think this is really about Greece, or indeed about any realistic appreciation of the tradeoffs between deficits and jobs. It is, instead, the victory of an orthodoxy that has little to do with rational analysis, whose main tenet is that imposing suffering on other people is how you show leadership in tough times.
And who will pay the price for this triumph of orthodoxy? The answer is, tens of millions of unemployed workers, many of whom will go jobless for years, and some of whom will never work again."
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Krugman acha que, graças à histeria dos adeptos da austeridade, a Terceira Depressão está aí:
"I don’t think this is really about Greece, or indeed about any realistic appreciation of the tradeoffs between deficits and jobs. It is, instead, the victory of an orthodoxy that has little to do with rational analysis, whose main tenet is that imposing suffering on other people is how you show leadership in tough times.
And who will pay the price for this triumph of orthodoxy? The answer is, tens of millions of unemployed workers, many of whom will go jobless for years, and some of whom will never work again."
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Notícias dos FUKD
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Wolfgang Munchau no FT de hoje:
"At some point the markets will realise that large parts of the German and French banking systems are insolvent, and that they are going to stay insolvent. You might think that Europe’s policy elites cannot be so stupid as to commit themselves to stress tests without a resolution strategy up their sleeves. But I am afraid they probably are. Europe’s political leaders and their economic advisers are, for the most part, financially illiterate.
Is there a way out? Yes there is, but the chance of a resolution to the crisis is starting to fade. The first step would have to be a serious attempt to resolve bank balance sheets. This is as much a German and French banking crisis as it is a Greek and Spanish debt crisis. You need to resolve both problems simultaneously. Resolution would require a large fiscal transfer, not from Germany to Greece, but from the German public sector to the German bank sector – in the form of new capital. The same would apply to France."
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Wolfgang Munchau no FT de hoje:
"At some point the markets will realise that large parts of the German and French banking systems are insolvent, and that they are going to stay insolvent. You might think that Europe’s policy elites cannot be so stupid as to commit themselves to stress tests without a resolution strategy up their sleeves. But I am afraid they probably are. Europe’s political leaders and their economic advisers are, for the most part, financially illiterate.
Is there a way out? Yes there is, but the chance of a resolution to the crisis is starting to fade. The first step would have to be a serious attempt to resolve bank balance sheets. This is as much a German and French banking crisis as it is a Greek and Spanish debt crisis. You need to resolve both problems simultaneously. Resolution would require a large fiscal transfer, not from Germany to Greece, but from the German public sector to the German bank sector – in the form of new capital. The same would apply to France."
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25.6.10
Serviço ou talvez não
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Em qualquer sistema de self-service, incluindo os super ou hipermercados, o cliente faz uma parte do serviço outrora a cargo de empregados. Noutros tempos, ele dirigia-se a um balcão, pedia o que desejava e recebia as suas compras já embaladas e prontas a transportar. A retirada do balcão permitiu ou obrigou o cliente a ir directamente buscar o que pretende.
Nas estações de serviço não havia sequer balcão, de modo que parece hoje absolutamente natural que cada qual trate de encher o depósito, verificar a pressão dos pneus e limpar os vidros.
Muitos estabelecimentos de fast-food conseguem também economias significativas de mão-de-obra à nossa custa. Quando optamos pelo take away, ajudamos a empresa a poupar no espaço do estabelecimento. Pessoas usualmente exigentes aceitam inclusive levantar a mesa no McDonald's sem qualquer contrapartida óbvia.
Quando as empresas compreenderam que os consumidores aceitam de bom grado desempenhar certos trabalhos a troco de conveniência, rapidez e economia, o sistema self-service generalizou-se progressivamente no sector dos serviços.
Ao levantarmos dinheiro ou fazermos pagamentos no ATM, contribuímos graciosamente para a maior eficiência dos bancos. O mesmo se passa quando aderimos ao home banking. Se trocarmos os extractos em papel pelos extractos digitais, o banco deixa de ter que imprimi-los e enviá-los pelo correio, ficando a nosso cargo procurar a informação no respectivo site num computador e com recurso a telecomunicações que nós pagamos.
A IKEA vende mobiliário mais barato porque a montagem final corre por nossa conta. A economia conseguida corresponde euro por euro às horas de trabalho não contabilizadas que dispendemos no processo. Parte da fábrica foi transferida para nossa casa sem que disso nos dessemos conta.
Tornámo-nos funcionários subservientes das empresas que nos vendem produtos e serviços. Trabalhamos para elas sem horários, nem salários, nem direitos laborais. Mais: se o serviço funcionar mal, muito provavelmente a culpa será nossa.
É evidente o padrão que se criou. O aumento de produtividade do sector dos serviços consiste em grande medida em persuadir-nos a suportarmos uma carga de trabalho cada vez maior, trabalho esse que, deixando de ser feito pelos empregados do fornecedor, lhe assegura poupanças muito significativas.
Inevitavelmente, porém, cada vez dispomos menos de genuíno tempo livre. Toda a gente se queixa de que esteve muito ocupada no fim de semana. A fazer o quê? Ora, a fazer compras no supermercado, a lavar o carro, a meter gasolina, a consultar os movimentos bancários, a esperar na bicha do fast food ou a montar móveis. Tanta modernidade deixa-nos esgotados.
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Em qualquer sistema de self-service, incluindo os super ou hipermercados, o cliente faz uma parte do serviço outrora a cargo de empregados. Noutros tempos, ele dirigia-se a um balcão, pedia o que desejava e recebia as suas compras já embaladas e prontas a transportar. A retirada do balcão permitiu ou obrigou o cliente a ir directamente buscar o que pretende.
Nas estações de serviço não havia sequer balcão, de modo que parece hoje absolutamente natural que cada qual trate de encher o depósito, verificar a pressão dos pneus e limpar os vidros.
Muitos estabelecimentos de fast-food conseguem também economias significativas de mão-de-obra à nossa custa. Quando optamos pelo take away, ajudamos a empresa a poupar no espaço do estabelecimento. Pessoas usualmente exigentes aceitam inclusive levantar a mesa no McDonald's sem qualquer contrapartida óbvia.
Quando as empresas compreenderam que os consumidores aceitam de bom grado desempenhar certos trabalhos a troco de conveniência, rapidez e economia, o sistema self-service generalizou-se progressivamente no sector dos serviços.
Ao levantarmos dinheiro ou fazermos pagamentos no ATM, contribuímos graciosamente para a maior eficiência dos bancos. O mesmo se passa quando aderimos ao home banking. Se trocarmos os extractos em papel pelos extractos digitais, o banco deixa de ter que imprimi-los e enviá-los pelo correio, ficando a nosso cargo procurar a informação no respectivo site num computador e com recurso a telecomunicações que nós pagamos.
A IKEA vende mobiliário mais barato porque a montagem final corre por nossa conta. A economia conseguida corresponde euro por euro às horas de trabalho não contabilizadas que dispendemos no processo. Parte da fábrica foi transferida para nossa casa sem que disso nos dessemos conta.
Tornámo-nos funcionários subservientes das empresas que nos vendem produtos e serviços. Trabalhamos para elas sem horários, nem salários, nem direitos laborais. Mais: se o serviço funcionar mal, muito provavelmente a culpa será nossa.
É evidente o padrão que se criou. O aumento de produtividade do sector dos serviços consiste em grande medida em persuadir-nos a suportarmos uma carga de trabalho cada vez maior, trabalho esse que, deixando de ser feito pelos empregados do fornecedor, lhe assegura poupanças muito significativas.
Inevitavelmente, porém, cada vez dispomos menos de genuíno tempo livre. Toda a gente se queixa de que esteve muito ocupada no fim de semana. A fazer o quê? Ora, a fazer compras no supermercado, a lavar o carro, a meter gasolina, a consultar os movimentos bancários, a esperar na bicha do fast food ou a montar móveis. Tanta modernidade deixa-nos esgotados.
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24.6.10
Um pensamento que eles podem compreeender
Uma boa sugestão de George Soros:
"Germans should consider the following thought experiment: withdrawal from the euro. The restored Deutschemark would soar, the euro would plummet. The rest of Europe would become competitive and could grow its way out of its difficulties but Germany would find out how painful it can be to have an overvalued currency. Its trade balance would turn negative, and there would be widespread unemployment. Banks would suffer severe losses on exchange rates and require large injections of public funds. But the government would find it politically more acceptable to rescue German banks than Greece or Spain. And there would be other compensations; German pensioners could retire to Spain and live like kings, helping Spanish real estate to recover."
Nós por cá todos bem
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O leitor está preocupado com a eventualidade de eleições legislativas a curto prazo em Portugal? Está indeciso sobre em quem votar nas próximas presidenciais? Inquieta-o a eventualidade de mais instabilidade política depois dessa eleição?
Não se rale. Nada disso tem a mínima importância para as nossas vidas em comparação com a anunciada nomeação de Axel Weber para a presidência do Banco Central Europeu.
Weber tem defendido incansavelmente nos últimos anos a prioridade do combate à inflação na zona euro, apesar de não se vislumbrar a mínima ameaça de inflação nos horizontes. Quer que as taxas de juro subam e que seja imediatamente suspensa a intervenção directa do BCE nos mercados monetários.
A direita domina hoje esmagadoramente as instituições centrais da União Europeia. Isso deve ser considerado normal, tratando-se de um mero reflexo da hegemonia que exerce nos governos europeus e também dos resultados das eleições do ano passado para o parlamento europeu.
Já é menos aceitável que se furte a assumir a responsabilidade das políticas económicas pró-cíclicas que favorece, refugiando-se atrás de órgãos pretensamente técnico-administrativos e apolíticos como a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu.
A previsível indigitação de Weber como Presidente do BCE está a suscitar muita polémica nos EUA, compreensivelmente assustados com o que se está a passar, mas não na Europa.
O que pensam sobre isso os nossos partidos, o nosso governo e os nossos deputados europeus? Seria interessante sabê-lo.
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O leitor está preocupado com a eventualidade de eleições legislativas a curto prazo em Portugal? Está indeciso sobre em quem votar nas próximas presidenciais? Inquieta-o a eventualidade de mais instabilidade política depois dessa eleição?
Não se rale. Nada disso tem a mínima importância para as nossas vidas em comparação com a anunciada nomeação de Axel Weber para a presidência do Banco Central Europeu.
Weber tem defendido incansavelmente nos últimos anos a prioridade do combate à inflação na zona euro, apesar de não se vislumbrar a mínima ameaça de inflação nos horizontes. Quer que as taxas de juro subam e que seja imediatamente suspensa a intervenção directa do BCE nos mercados monetários.
A direita domina hoje esmagadoramente as instituições centrais da União Europeia. Isso deve ser considerado normal, tratando-se de um mero reflexo da hegemonia que exerce nos governos europeus e também dos resultados das eleições do ano passado para o parlamento europeu.
Já é menos aceitável que se furte a assumir a responsabilidade das políticas económicas pró-cíclicas que favorece, refugiando-se atrás de órgãos pretensamente técnico-administrativos e apolíticos como a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu.
A previsível indigitação de Weber como Presidente do BCE está a suscitar muita polémica nos EUA, compreensivelmente assustados com o que se está a passar, mas não na Europa.
O que pensam sobre isso os nossos partidos, o nosso governo e os nossos deputados europeus? Seria interessante sabê-lo.
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Pixinguinha: 1 a 0
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Vai começar o futebol,pois é,
Com muita garra e emoção
São onze de cá, onze de lá
E o bate-bola do meu coração
É a bola, é a bola, é a bola,
É a bola e o gol!
Numa jogada emocionante
O nosso time venceu por um a zero
E a torcida vibrou
Vamos lembrar
A velha história desse esporte
Começou na Inglaterra
E foi parar no Japão
Habilidade, tiro cruzado,
Mete a cabeça, toca de lado,
Não vale é pegar com a mão
E o mundo inteiro
Se encantou com esta arte
Equilíbrio e malícia
Sorte e azar também
Deslocamento em profundidade
Pontaria
Na hora da conclusão
Meio-de-campo organizou
E vem a zaga rebater
Bate, rebate, é de primeira
Ninguém quer tomar um gol
É coisa séria, é brincadeira
Bola vai e volta
Vem brilhando no ar
E se o juiz apita errado
É que a coisa fica feia
Coitada da sua mãe
Mesmo sendo uma santa
Cai na boca do povão
Pode ter até bolacha
Pontapé, empurrão
Só depois de uma ducha fria
É que se aperta a mão
Ou não!
Vai começar...
Aos quarenta do segundo tempo
O jogo ainda é zero a zero
Todo time quer ser campeão
Tá lá um corpo estendido no chão
São os minutos finais
Vai ter desconto
Mas, numa jogada genial
Aproveitando o lateral
Um cruzamento que veio de trás
Foi quando alguém chegou
Meteu a bola na gaveta
E comemorou
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Vai começar o futebol,pois é,
Com muita garra e emoção
São onze de cá, onze de lá
E o bate-bola do meu coração
É a bola, é a bola, é a bola,
É a bola e o gol!
Numa jogada emocionante
O nosso time venceu por um a zero
E a torcida vibrou
Vamos lembrar
A velha história desse esporte
Começou na Inglaterra
E foi parar no Japão
Habilidade, tiro cruzado,
Mete a cabeça, toca de lado,
Não vale é pegar com a mão
E o mundo inteiro
Se encantou com esta arte
Equilíbrio e malícia
Sorte e azar também
Deslocamento em profundidade
Pontaria
Na hora da conclusão
Meio-de-campo organizou
E vem a zaga rebater
Bate, rebate, é de primeira
Ninguém quer tomar um gol
É coisa séria, é brincadeira
Bola vai e volta
Vem brilhando no ar
E se o juiz apita errado
É que a coisa fica feia
Coitada da sua mãe
Mesmo sendo uma santa
Cai na boca do povão
Pode ter até bolacha
Pontapé, empurrão
Só depois de uma ducha fria
É que se aperta a mão
Ou não!
Vai começar...
Aos quarenta do segundo tempo
O jogo ainda é zero a zero
Todo time quer ser campeão
Tá lá um corpo estendido no chão
São os minutos finais
Vai ter desconto
Mas, numa jogada genial
Aproveitando o lateral
Um cruzamento que veio de trás
Foi quando alguém chegou
Meteu a bola na gaveta
E comemorou
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Notícias da guerra das portagens
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Tanto quanto percebo, é este o estado das coisas:
1. Aparentemente, o PM improvisa a estratégia das SCUTS em cima do joelho durante as suas viagens pelo país, presume-se que consultando a opinião do seu chófer. Depois, liga para o grupo parlamentar e diz-lhe como é.
2. O PSD é favor da generalização do pagamento das SCUTS pelos utilizadores a todo o país, com a condição de que, na prática, ninguém pague.
3. Não está em causa instalar nos carros um "chip" (ou seja, um micro-processador), mas um simples identificador (ou seja, uma matrícula electrónica). Todavia, alguns jornais de hoje anunciam que o PSD vai obrigar o governo a recuar na questão dos "chips" (ou seja, numa questão que nunca existiu senão na propaganda da oposição).
4. O PSD está a trabalhar na concepção de uma solução que assegure custos superiores às receitas geradas pelas portagens.
5. O pessoal do Norte ainda não percebeu que os seus dirigentes regionais se calarão quando lhes forem garantidas "medidas compensatórias", que consistirão, seguramente, em mais subsídios para indústrias falidas. Daqui a uns anos ficaremos a saber em que consistiram e quanto custaram.
6. É uma pena ninguém ter a bondade de nos esclarecer sobre os indiscutíveis méritos e a sustentação teórica da doutrina do utilizador-pagador.
Até amanhã.
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Tanto quanto percebo, é este o estado das coisas:
1. Aparentemente, o PM improvisa a estratégia das SCUTS em cima do joelho durante as suas viagens pelo país, presume-se que consultando a opinião do seu chófer. Depois, liga para o grupo parlamentar e diz-lhe como é.
2. O PSD é favor da generalização do pagamento das SCUTS pelos utilizadores a todo o país, com a condição de que, na prática, ninguém pague.
3. Não está em causa instalar nos carros um "chip" (ou seja, um micro-processador), mas um simples identificador (ou seja, uma matrícula electrónica). Todavia, alguns jornais de hoje anunciam que o PSD vai obrigar o governo a recuar na questão dos "chips" (ou seja, numa questão que nunca existiu senão na propaganda da oposição).
4. O PSD está a trabalhar na concepção de uma solução que assegure custos superiores às receitas geradas pelas portagens.
5. O pessoal do Norte ainda não percebeu que os seus dirigentes regionais se calarão quando lhes forem garantidas "medidas compensatórias", que consistirão, seguramente, em mais subsídios para indústrias falidas. Daqui a uns anos ficaremos a saber em que consistiram e quanto custaram.
6. É uma pena ninguém ter a bondade de nos esclarecer sobre os indiscutíveis méritos e a sustentação teórica da doutrina do utilizador-pagador.
Até amanhã.
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23.6.10
Finanças para literatos
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John Lanchester é um romancista que decidiu estudar a teoria financeira contemporânea como parte da preparação de uma obra de ficção que planeava escrever.
O primeiro resultado desses esforços foi o seu genial artigo Cityphilia publicado em Janeiro de 2008 na London Review of Books.
Após treinar-se a escrever sobre temas financeiros para literatos, produziu Whoops! - Why everybody owes everyone and no one can pay. O livro é de longe o melhor já publicado sobre a presente crise financeira internacional. Qualquer pessoa medianamente inteligente fica a entender não só as causas da crise, como também o funcionamento do sistema financeiro internacional, os problemas associados à gestão do risco e ainda os derivados, os CDOs e os CDSs.
Cada vez me convenço mais de que a economia só parece uma ciência difícil porque os economistas não sabem escrever.
Como aperitivo à leitura de Whoops!, ouçam a apresentação que o próprio John Lanchester faz do seu livro neste video, às vezes hilariante, sempre instrutivo.
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John Lanchester é um romancista que decidiu estudar a teoria financeira contemporânea como parte da preparação de uma obra de ficção que planeava escrever.
O primeiro resultado desses esforços foi o seu genial artigo Cityphilia publicado em Janeiro de 2008 na London Review of Books.
Após treinar-se a escrever sobre temas financeiros para literatos, produziu Whoops! - Why everybody owes everyone and no one can pay. O livro é de longe o melhor já publicado sobre a presente crise financeira internacional. Qualquer pessoa medianamente inteligente fica a entender não só as causas da crise, como também o funcionamento do sistema financeiro internacional, os problemas associados à gestão do risco e ainda os derivados, os CDOs e os CDSs.
Cada vez me convenço mais de que a economia só parece uma ciência difícil porque os economistas não sabem escrever.
Como aperitivo à leitura de Whoops!, ouçam a apresentação que o próprio John Lanchester faz do seu livro neste video, às vezes hilariante, sempre instrutivo.
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Herói ontem, vilão hoje
Atempada reflexão de John Kay no FT de hoje sobre a contemporânea obsessão com a redução de custos:
"Safety is not the only area in which managers are required to balance incompatible and incommensurable factors. Any business whose long-run viability depends on its reputation faces a similar dilemma – the damage to BP’s reputation may well exceed the direct cost of the Gulf of Mexico spill. Has a bank, or a retailer, sacrificed the trust of its customers for short-term profitability? Have pharmaceutical companies neglected their pipeline of new drugs in favour of cost-cutting and marketing? Only time will tell, and perhaps we won’t know even then. As the Greek philosopher Solon put it: “We don’t consider any man successful until he has died well.” But ancient philosophers were subject only to the verdict of posterity. Today’s managers are victims of the tyranny of the quarterly earnings report. And that is why yesterday’s cost-savings are so often today’s corporate crisis."
21.6.10
Trampolineiros
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Quem vive na área metropolitana de Lisboa não nota muito a crise, porque, aí, o desemprego cresceu pouco e afectou sobretudo os imigrantes.
A crise portuguesa é, sobretudo, a crise do Norte, que, na última década, se tornou na região mais pobre do país - mais pobre ainda que o Alentejo - pois lá residia a indústria que foi liquidada pela concorrência da China e do Leste Europeu.
Estupidamente, o governo achou apropriado desviar fundos comunitários destinados ao Norte para aplicá-los no TGV que deverá ligar Lisboa a Espanha. Como se isso não bastasse, decidiu também fazer concentrar no Norte o esforço essencial de pagamento das SCUTs pelos utilizadores.
Sempre trampolineiro, o PSD, que desde sempre exigiu o que o PS agora se resignou a fazer, mudou subitamente de posição. Exactamente em quê?
Defende que as SCUTs devem continuar a ser gratuitas nas regiões mais atrasadas do país? Não propriamente. Sustenta então que outras regiões, entre elas o Algarve, deverão ter o mesmo tratamento que o Norte? Também não.
Para desviar as atenções, faz incidir a sua crítica sobre o meio de cobrar as portagens que o governo propõe, mais especificamente, sobre a colocação obrigatória de identificadores nos automóveis a pretexto de que isso ameaça a privacidade dos cidadãos.
Esta alegação é absurda. Mais portugueses têm telemóveis do que automóveis. O telemóvel é um equipamento mais pessoal do que o automóvel. Tendo em conta que os telemóveis têm chips e os identificadores não, que ameaça adicional à privacidade de cada um resulta do sistema de cobrança de portagens previsto? Nenhuma.
Há, como atrás escrevi, boas razões para se estar contra as portagens, mas a utilização obrigatória dos identificadores não é decerto uma delas.
Quando terá finalmente o PSD a coragem de assumir sem ambiguidades as suas próprias convicções?
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Quem vive na área metropolitana de Lisboa não nota muito a crise, porque, aí, o desemprego cresceu pouco e afectou sobretudo os imigrantes.
A crise portuguesa é, sobretudo, a crise do Norte, que, na última década, se tornou na região mais pobre do país - mais pobre ainda que o Alentejo - pois lá residia a indústria que foi liquidada pela concorrência da China e do Leste Europeu.
Estupidamente, o governo achou apropriado desviar fundos comunitários destinados ao Norte para aplicá-los no TGV que deverá ligar Lisboa a Espanha. Como se isso não bastasse, decidiu também fazer concentrar no Norte o esforço essencial de pagamento das SCUTs pelos utilizadores.
Sempre trampolineiro, o PSD, que desde sempre exigiu o que o PS agora se resignou a fazer, mudou subitamente de posição. Exactamente em quê?
Defende que as SCUTs devem continuar a ser gratuitas nas regiões mais atrasadas do país? Não propriamente. Sustenta então que outras regiões, entre elas o Algarve, deverão ter o mesmo tratamento que o Norte? Também não.
Para desviar as atenções, faz incidir a sua crítica sobre o meio de cobrar as portagens que o governo propõe, mais especificamente, sobre a colocação obrigatória de identificadores nos automóveis a pretexto de que isso ameaça a privacidade dos cidadãos.
Esta alegação é absurda. Mais portugueses têm telemóveis do que automóveis. O telemóvel é um equipamento mais pessoal do que o automóvel. Tendo em conta que os telemóveis têm chips e os identificadores não, que ameaça adicional à privacidade de cada um resulta do sistema de cobrança de portagens previsto? Nenhuma.
Há, como atrás escrevi, boas razões para se estar contra as portagens, mas a utilização obrigatória dos identificadores não é decerto uma delas.
Quando terá finalmente o PSD a coragem de assumir sem ambiguidades as suas próprias convicções?
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19.6.10
O que eu apreciava em Saramago
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Os portugueses são, ainda hoje, educados para serem modestos, humildes, mesquinhos, submissos, subservientes, tacanhos e bem comportados. Numa palavra, para serem invertebrados.
Saramago foi afirmativo, inquisitivo, convicto, ousado, persistente, ambicioso, cosmopolita e intelectualmente generoso.
Fez muitas coisas erradas e algumas altamente condenáveis, mas um país constrói-se inspirando-se nas forças dos seus melhores, não nas suas fraquezas.
Não sou um grande apreciador dos livros que Saramago escreveu, como não o sou dos de várias outras grandes figuras da literatura mundial. O mais provável é que a falha seja minha, não dele.
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Os portugueses são, ainda hoje, educados para serem modestos, humildes, mesquinhos, submissos, subservientes, tacanhos e bem comportados. Numa palavra, para serem invertebrados.
Saramago foi afirmativo, inquisitivo, convicto, ousado, persistente, ambicioso, cosmopolita e intelectualmente generoso.
Fez muitas coisas erradas e algumas altamente condenáveis, mas um país constrói-se inspirando-se nas forças dos seus melhores, não nas suas fraquezas.
Não sou um grande apreciador dos livros que Saramago escreveu, como não o sou dos de várias outras grandes figuras da literatura mundial. O mais provável é que a falha seja minha, não dele.
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18.6.10
Quem detém o poder?
A seguinte pergunta, formulada pelo Paulo Querido, e a minha resposta, que reproduzo na sequência, foram originariamente publicadas em Uma Pergunta por Dia:
Escreveu que a crise financeira levou à transferência de grande parte do endividamento do setor privado para o público, porque os Estados decidiram, na emergência, assegurar a solvência do sistema. Há a ideia de reformar o funcionamento do sistema financeiro com o reforço dos instrumentos públicos europeus sobre, entre outras, as agências de rating. Mas há também muitas resistências e a verdade é que a crise enfraqueceu mais os governos do que os bancos e instituições financeiras, cujo poder parece ter aumentado. A pergunta é: até que ponto ficámos mais próximo da substituição dos Estados-nação pelos
Estados-multinacionais, supondo que este cenário não existe só na mente dos autores de ficção científica?
Um dos problemas centrais da nossa época é a contradição entre a crescente globalização da economia e o persistente paroquialismo dos poderes públicos. Isto implica a subalternização dos poderes políticos em relação aos poderes fácticos e, logo, a despromoção da democracia a um jogo formal sem conteúdo.
Onde está, então, na actualidade, o poder económico-financeiro?
Quer a Europa quer os EUA dispõem de escassa margem de manobra; mas a situação dos EUA é pior, dado que o desequilíbrio financeiro europeu é interno (Alemanha vs. restantes países da UE), ao passo que o americano é externo (China vs. EUA).
A ausência de instituições democráticas federais e de um normal jogo democrático à escala continental torna a UE prisioneira do absurdo provincianismo da RFA, uma grande potência com miolos de galinha no que toca à política internacional.
Quanto aos americanos, hesitam em tomar medidas proteccionistas contra as importações provenientes da China, na medida em que ao fazê-lo correriam o risco secar a principal fonte externa de capitais que lhes permite suprir a insuficiência da poupança interna.
Aparentemente, o único país que dispõe das condições necessárias para ajudar o mundo a sair da crise é, pois, a China, o que implicaria que aceitasse a progressiva valorização da sua moeda e reorientasse o seu crescimento para o mercado interno em detrimento das exportações.
Até ao momento, porém, ela parece relutante em assumir esse papel: em coerência com a sua tradição milenar, o resto do mundo interessa-lhe apenas na medida em que o abastece em matérias-primas essenciais de que carece e lhe assegura mercados em expansão para as suas mercadorias, sem parecer entender que parceiros comerciais empobrecidos deixarão a breve trecho de poder comprar-lhas.
A conclusão é que os poucos estados ou associações de estados suficientemente poderosos para exercerem uma influência positiva ou não podem ou não querem enfrentar as disfunções globais do sistema económico-financeiro. Tampouco as escassas e frágeis instituições de cooperação internacional existentes, de que se destaca o FMI, têm condições para fazê-lo.
De modo que nos encontramos hoje apanhados entre o fogo cruzado de duas forças perversas momentânea e paradoxalmente convergentes: de um lado, os mercados financeiros globalizados desregulados; do outro, os retrógrados nacionalismos que pressionam cada estado a buscar a sua salvação à custa dos outros. Esta aliança será, porém, efémera, porque os instintos e os valores dos especuladores internacionais são incompatíveis com os dos populismos de inspiração chauvinista que, presentemente, ressurgem ou tomam mesmo o poder um pouco por toda a parte.
Em última instância, a resposta à pergunta: quem detém o poder? depende do que formos capazes de fazer com esta crise, tendo em conta que situações instáveis como a actual são aquelas em que existe uma maior abertura a novas possibilidades, ou seja, uma mais ampla margem de indeterminação e, logo, de escolha entre opções alternativas – na condição, porém, de que elas sejam formuladas de forma consistente e propostas com clareza aos cidadãos.
No caso da Europa, é urgente desfazermos o mito de que na UE não deve haver um confronto entre direita e esquerda, mas apenas uma negociação de bastidores entre estados-nações representados pelos respectivos governos. A UE não pode ser encarada como um tema de política externa pelos seus estados membros, mas como o único terreno em que pode ter lugar uma saudável luta política democrática assente no livre confronto entre concepções opostas.
Lisboa, 14 de Junho de 2010
Escreveu que a crise financeira levou à transferência de grande parte do endividamento do setor privado para o público, porque os Estados decidiram, na emergência, assegurar a solvência do sistema. Há a ideia de reformar o funcionamento do sistema financeiro com o reforço dos instrumentos públicos europeus sobre, entre outras, as agências de rating. Mas há também muitas resistências e a verdade é que a crise enfraqueceu mais os governos do que os bancos e instituições financeiras, cujo poder parece ter aumentado. A pergunta é: até que ponto ficámos mais próximo da substituição dos Estados-nação pelos
Estados-multinacionais, supondo que este cenário não existe só na mente dos autores de ficção científica?
Um dos problemas centrais da nossa época é a contradição entre a crescente globalização da economia e o persistente paroquialismo dos poderes públicos. Isto implica a subalternização dos poderes políticos em relação aos poderes fácticos e, logo, a despromoção da democracia a um jogo formal sem conteúdo.
Onde está, então, na actualidade, o poder económico-financeiro?
Quer a Europa quer os EUA dispõem de escassa margem de manobra; mas a situação dos EUA é pior, dado que o desequilíbrio financeiro europeu é interno (Alemanha vs. restantes países da UE), ao passo que o americano é externo (China vs. EUA).
A ausência de instituições democráticas federais e de um normal jogo democrático à escala continental torna a UE prisioneira do absurdo provincianismo da RFA, uma grande potência com miolos de galinha no que toca à política internacional.
Quanto aos americanos, hesitam em tomar medidas proteccionistas contra as importações provenientes da China, na medida em que ao fazê-lo correriam o risco secar a principal fonte externa de capitais que lhes permite suprir a insuficiência da poupança interna.
Aparentemente, o único país que dispõe das condições necessárias para ajudar o mundo a sair da crise é, pois, a China, o que implicaria que aceitasse a progressiva valorização da sua moeda e reorientasse o seu crescimento para o mercado interno em detrimento das exportações.
Até ao momento, porém, ela parece relutante em assumir esse papel: em coerência com a sua tradição milenar, o resto do mundo interessa-lhe apenas na medida em que o abastece em matérias-primas essenciais de que carece e lhe assegura mercados em expansão para as suas mercadorias, sem parecer entender que parceiros comerciais empobrecidos deixarão a breve trecho de poder comprar-lhas.
A conclusão é que os poucos estados ou associações de estados suficientemente poderosos para exercerem uma influência positiva ou não podem ou não querem enfrentar as disfunções globais do sistema económico-financeiro. Tampouco as escassas e frágeis instituições de cooperação internacional existentes, de que se destaca o FMI, têm condições para fazê-lo.
De modo que nos encontramos hoje apanhados entre o fogo cruzado de duas forças perversas momentânea e paradoxalmente convergentes: de um lado, os mercados financeiros globalizados desregulados; do outro, os retrógrados nacionalismos que pressionam cada estado a buscar a sua salvação à custa dos outros. Esta aliança será, porém, efémera, porque os instintos e os valores dos especuladores internacionais são incompatíveis com os dos populismos de inspiração chauvinista que, presentemente, ressurgem ou tomam mesmo o poder um pouco por toda a parte.
Em última instância, a resposta à pergunta: quem detém o poder? depende do que formos capazes de fazer com esta crise, tendo em conta que situações instáveis como a actual são aquelas em que existe uma maior abertura a novas possibilidades, ou seja, uma mais ampla margem de indeterminação e, logo, de escolha entre opções alternativas – na condição, porém, de que elas sejam formuladas de forma consistente e propostas com clareza aos cidadãos.
No caso da Europa, é urgente desfazermos o mito de que na UE não deve haver um confronto entre direita e esquerda, mas apenas uma negociação de bastidores entre estados-nações representados pelos respectivos governos. A UE não pode ser encarada como um tema de política externa pelos seus estados membros, mas como o único terreno em que pode ter lugar uma saudável luta política democrática assente no livre confronto entre concepções opostas.
Lisboa, 14 de Junho de 2010
Óleo de fígado de bacalhau
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Na minha geração, toda a criança era obrigada a tomar colheres de óleo de fígado de bacalhau. Quanto mais cara feia pusesse, maior a colherada.
Para que servia exactamente o remédio? Ninguém tinha a certeza, mas, se o sabor era tão mau, decerto teria que fazer bem.
Hoje o óleo de fígado de bacalhau passou a ser comercializado em drageias, o que, desmobilizando os instintos sádicos dos torturadores de crianças, eliminou o apelo do produto. Mais uma malfeitoria do facilitismo.
Mas a geração educada a colheres de óleo de fígado bacalhau engolidas à mistura com muita lágrima e muito ranho está hoje no poder. A parte mais estúpida dela interiorizou à pancada a crença de que o bem só pode resultar do sofrimento, e que, quanto mais irracional ele for, melhor e mais santo será.
Austeridade é o nome que os economistas abusados quando crianças dão ao óleo de fígado de bacalhau.
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Na minha geração, toda a criança era obrigada a tomar colheres de óleo de fígado de bacalhau. Quanto mais cara feia pusesse, maior a colherada.
Para que servia exactamente o remédio? Ninguém tinha a certeza, mas, se o sabor era tão mau, decerto teria que fazer bem.
Hoje o óleo de fígado de bacalhau passou a ser comercializado em drageias, o que, desmobilizando os instintos sádicos dos torturadores de crianças, eliminou o apelo do produto. Mais uma malfeitoria do facilitismo.
Mas a geração educada a colheres de óleo de fígado bacalhau engolidas à mistura com muita lágrima e muito ranho está hoje no poder. A parte mais estúpida dela interiorizou à pancada a crença de que o bem só pode resultar do sofrimento, e que, quanto mais irracional ele for, melhor e mais santo será.
Austeridade é o nome que os economistas abusados quando crianças dão ao óleo de fígado de bacalhau.
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Relato ausente
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Faço parte daquela minoria de portugueses desfavorecidos que não viram o jogo de 3ª feira devido à infeliz circunstância de conservarem por ora um posto de trabalho.
Isso, somado à minha incapacidade de sofrer pela selecção, qualifica-me de forma indiscutível para opinar sobre o que se passou.
Jogámos benzinho. Empatar com um adversário recheado de valores individuais que permitem à Costa de Marfim colocar em campo uma equipa mais equilibrada do que a nossa não é coisa que, lá no túmulo donde espreita o écrã da TV, envergonhe o Bartolomeu Dias.
Só correu mal aquela coisa de o árbitro nos ter invalidado um golo limpo. (Já nem falo do absurdo amarelo mostrado ao Ronaldo e de o Drogba ter sido autorizado a jogar com uma prótese.)
Não fosse essa ocorrência fortuita, e o país em peso elogiaria agora a segurança do desempenho dos nossos. Tenho dito.
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Faço parte daquela minoria de portugueses desfavorecidos que não viram o jogo de 3ª feira devido à infeliz circunstância de conservarem por ora um posto de trabalho.
Isso, somado à minha incapacidade de sofrer pela selecção, qualifica-me de forma indiscutível para opinar sobre o que se passou.
Jogámos benzinho. Empatar com um adversário recheado de valores individuais que permitem à Costa de Marfim colocar em campo uma equipa mais equilibrada do que a nossa não é coisa que, lá no túmulo donde espreita o écrã da TV, envergonhe o Bartolomeu Dias.
Só correu mal aquela coisa de o árbitro nos ter invalidado um golo limpo. (Já nem falo do absurdo amarelo mostrado ao Ronaldo e de o Drogba ter sido autorizado a jogar com uma prótese.)
Não fosse essa ocorrência fortuita, e o país em peso elogiaria agora a segurança do desempenho dos nossos. Tenho dito.
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11.6.10
"Esto es una locura, un delirio!"
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O filme argentino "El secreto de sus ojos" inclui uma das melhores cenas de futebol no cinema de sempre, no terreno to Racing Avellaneda, de que acima se pode ver a parte inicial.
Dura menos de cinco minutos, mas podem ficar para ver o resto, que é excelente. Ganhou este ano o Óscar do melhor filme estrangeiro.
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O filme argentino "El secreto de sus ojos" inclui uma das melhores cenas de futebol no cinema de sempre, no terreno to Racing Avellaneda, de que acima se pode ver a parte inicial.
Dura menos de cinco minutos, mas podem ficar para ver o resto, que é excelente. Ganhou este ano o Óscar do melhor filme estrangeiro.
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10.6.10
3.6.10
2.6.10
Regulação e complexidade
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Reflexões de Rogoff sobre o desastre ambiental no Golfo do México, a ler na íntegra:
Reflexões de Rogoff sobre o desastre ambiental no Golfo do México, a ler na íntegra:
"The parallels between the oil spill and the recent financial crisis are all too painful: the promise of innovation, unfathomable complexity, and lack of transparency (scientists estimate that we know only a very small fraction of what goes on at the oceans’ depths.) Wealthy and politically powerful lobbies put enormous pressure on even the most robust governance structures. It is a huge embarrassment for US President Barack Obama that he proposed – admittedly under pressure from the Republican opposition – to expand offshore oil drilling greatly just before the BP catastrophe struck."
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