3.2.04

«Se o seu filho não quer estudar, é ele que está certo»



(Continuação da entrevista a Karl Marx)

Entrevistador -- Está outra vez a fugir ao assunto. Seja directo, por favor: prove-me que o que hoje se passa no mundo tem alguma coisa a ver com as suas propostas políticas.

Marx -- Eu nunca fiz muitas propostas concretas, tal como nunca fiz muitas previsões. Achava e continuo a achar que isso é uma perda de tempo. O que lhe digo é que, agora, pode-se viajar por toda a Europa sem ter a polícia sempre à perna. Vim a Portugal sem passaporte. No meu tempo, precisava de um passaporte para me deslocar dentro da própria Alemanha. Não acha que isto comprova o triunfo do ideal internacionalista?

Entrevistador -- Se, como pretende, o poder está agora nas mãos dos trabalhadores, porque é, então, cada vez menor o interesse das pessoas pela política?

Marx -- Não há razão para preocupações. Repare: o indiferentismo é o estádio supremo de desenvolvimento do socialismo. Saint-Simon sustentou que, no socialismo, o governo das coisas sobrepõe-se progressivamente ao governo dos homens. É a isso que, hoje, se chama tecnocracia. Eu apoiei essa tese com tanta insistência que muitas pessoas estão convencidas que ela é minha. Se as pessoas já não estão divididas por conflitos de valores políticos essenciais, que se há-de fazer? É um progresso, e também mais uma prova do termo da luta de classes e do fim da história. Pessoalmente, aprovo este estado de coisas.

Entrevistador -- E o desemprego e a desigualdade salarial?

Marx -- O economista Paul Krugman explicou-me que, à medida que os computadores forem substituindo as profissões técnicas, cada vez será mais valorizado o trabalho dos cozinheiros, dos jardineiros ou dos canalizadores. Se o seu filho não quer estudar, não se rale: provavelmente, é ele que está certo.

Entrevistador -- E o trabalho infantil, e a poluição, e a SIDA, e a clonagem?

Marx -- Calma, calma, uma pergunta de cada vez.

(Continua...)

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