13.9.05

Corrupção: a autárquica e a outra

Há uma irritação generalizada no país contra a corrupção autárquica com laivos de paranóia irracional.

A verdade é esta: quando falamos de corrupção autárquica estamos a falar de tremoços em comparação com a corrupção do Estado central, pela simples razão de que este último movimenta mais de 90% das verbas dispendidas pela administração pública. Ora os ladrões costumam concentrar os seus esforços onde está o dinheiro, não onde ele escasseia.

O que às gentes bem pensantes mais incomoda nos autarcas é o perfil burgesso, o bigode à Saddam, a peúga branca, os tiques do novo rico que, como se sabe, caem sempre muito mal, principalmente entre quem deseja esquecer rapidamente as suas origens. O ódio de classe manifesta-se hoje nestes pequenos detalhes.

Mas, se olharmos para as coisas com distância, que é como devem ser vistas quando se quer entender e agir com eficácia, as autarquias são meros subúrbios do Estado Central, esse sim, pejado de gabirús perfumados que vestem Emiliano Zegna e frequentam as festas organizadas pelas melhores famílias. Gatuno elegante é outra coisa!

No debate de ontem no Pró e Contras, alguém - olha, o Montalvo! - lembrou da plateia isto mesmo, fazendo ver que a pequena e média corrupção de pé rapado é, ao fim e ao cabo, um epifenómeno de uma máquina estatal tão centralizada que, para alguém vender gelados na praia, precisa de obter uma licença do Ministério da Defesa. Silêncio sepulcral entre os participantes do debate.

Quem estiver disposto a pensar, cedo entenderá que, sem regionalização administrativa, estes e outros problemas nunca terão solução. A regionalização é a reforma da administração pública de que de facto o país precisa. Sem ela, continuaremos a ter um Estado caro, ineficiente e corrupto.

Há nove anos atrás o país parou no tempo porque as trampolinices do Professor Marcello tiveram sucesso e, no espaço de meses, a interrupção voluntária da gravidez e a regionalização democraticamente controlada do país foram rejeitadas.

Agora, queixam-se de quê?

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