25.11.04
No desaniversário de Mikail Bulgakov
Num momento de desespero, Mikail Bulgakov escreveu a Estaline em Março de 1930 pedindo-lhe que o autorizasse a emigrar para o estrangeiro, já que era impedido de trabalhar na União Soviética.
Já quase esquecera a sua carta quando, uma noite, o telefone tocou às quatro da manhã do dia 18 de Abril, sexta-feira santa, quatro dias depois do suicídio de Maiakovski. Era Estaline.
Bulgakov ficou siderado. Ele sabia que Estaline assistira sete vezes à sua peça Os Turbine, versão para o teatro do romance A Guarda Branca, e ouvira inclusivamente dizer que se comovia com ela até às lágrimas. Mas não estava à espera de uma coisa destas.
Estaline perguntou-lhe o que gostaria de poder fazer. Bulgakov respondeu-lhe que o seu desejo era poder voltar a trabalhar no teatro, mas que todas as suas peças tinham sido proibidas, a começar por Os Turbine, na sequência de uma crítica arrasadora publicada pelo próprio Lunacharski nos Izvestia, denunciando-a como uma tentativa de humanizar os contra-revolucionários.
Estaline prometeu-lhe que iria «tentar usar a sua influência para resolver o assunto». Pouco depois, conseguiu emprego como assistente de produção no Teatro de Arte de Moscovo. No romance Neve Negra, Bulgakov satiriza esses anos de trabalho com Stanislavski, que considerava um oportunista sem escrúpulos.
As perseguições a Bulgakov recomeçaram durante os ensaios da sua peça sobre Molière, que se arrastaram por quatro anos, entre 1932 e 1936, dizendo-se que só a misteriosa protecção pessoal de Estaline impediu a sua prisão. Mas o facto é que ficou de novo sem trabalho e a sua saúde deteriorou-se progressivamente.
A partir de então, dedicou-se unicamente à conclusão da sua obra-prima: O Mestre e Margarida, um estranho romance em que três histórias distintas, uma visita do Diabo a Moscovo, a Paixão de Cristo e o amor entre o Mestre e Margarida, se entrelaçam de uma forma surpreendente que combina ainda a sátira política com a meditação filosófica e religiosa.
Quando cegou, em 1939, continuou a ditar alterações à sua mulher Elena. Bulgakov morreu em Março de 1940, mas o romance só pôde ser publicado pela primeira vez mais de um quarto de século depois, em 1967.
Hoje, quando de novo se agita a sua Ucrânia natal, lembrei-me dele e percorri em imaginação as ruas da velha Kiev, que apenas conheço de A Guarda Branca. Os Turbine aguardam ainda o seu dia.
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