É bom recordar que estas trapalhadas que andam aí por causa da integração do negócio do gás natural na EDP começaram com o governo PS e, mais concretamente, com o inefável Pina Moura.
Assim que começou a haver um bocadinho de concorrência no sector da energia, Pina Moura congeminou um plano brilhante para juntar numa mesma empresa os derivados do petróleo, o gás natural e a electricidade e acabar outra vez com essa coisa chata de ter de lutar pelos clientes. Tudo com o pretexto espúrio de criar empresas nacionais com suficiente dimensão para poderem competir no plano internacional.
É neste tipo de políticas que reside, creio eu, o cerne da nossa desgraça económica. Os nossos grupos económicos são umas florzinhas de estufa que só se interessam por actividade protegidas da concorrência. Devemos ser o único país europeu onde o grande capital não tem qualquer envolvimento na produção de bens ou serviços transaccionáveis no mercado internacional.
Depois, como estes grupos absorvem o essencial dos recursos humanos, financeiros e materiais do país, a inovação é inexistente, as empresas não acrescentam valor e a produtividade estagna.
O Estado pelo seu lado, acha que a sua obrigação é arranjar negócios para estes grupos económicos, uma vez que eles não são capazes de se desenrrascar sozinhos. Por isso, é preciso privatizar mais negócios onde a concorrência seja escassa - como a saúde ou as águas, por exemplo. Não vejo, neste particular, grandes diferenças entre os governos de Cavaco, Guterres, Durão e Santana Lopes, excepto no facto de que , sendo esta lógica cada vez mais assumida, agora os grupos nomeiam directamente os ministros (ou primeiros-ministros) e tratam dos seus assuntos sem intermediários.
Admiram-se depois as pessoas que as pastas ministeriais sejam entregues a jovenzinhos recém-licenciados ou a pessoas cuja competência na área em questão é, no melhor dos casos, muito discutível. É claro que este é o sistema que convém aos negócios. Há método nesta loucura.
Como se não bastasse os ministros não perceberem nada dos assuntos e mudarem constantemente (Guterres teve 4 ministros diferentes com a pasta dos transportes, e esta maioria já conta 3), ainda por cima a teoria dominante, com grande receptividade nos media, é que o importante é decidir. Mas decidir o quê, se quem decide não entende sequer o que está em jogo? É assim que brincamos continuamente aos planos ferroviários, como se as opções em cima da mesa fossem uma mera questão de opinião. Não admira que, vistos de Espanha, pareçamos um país de tolos.
Eu não acredito que o Estado seja a encarnação mais ou menos hegeliana do bem colectivo, particularmente em Portugal, país onde os interesses sectoriais se aliam a grupos de funcionários para instrumentalizar a administração pública. Mas não sou tolo ao ponto de ignorar que as constantes catilinárias a favor de um Estado mínimo têm por objectivo principal remover os impedimentos à concretização dos grandes negócios.
O aparelho de Estado foi efectivamente desmantelado com método e competência (nem em tudo somos incapazes!) ao longo das duas últimas décadas. Hoje, os directores-gerais não contam para nada, porque são meros comissários políticos mal-pagos e desprestigiados. O Estado não tem, por isso, know-how próprio, até porque todos os gabinetes de estudos e planeamento foram desmantelados.
Quando é preciso estudar qualquer assunto, chama-se a McKinsey, de forma que, actualmente, o Estado português também não tem memória. Subcontratou-a, e já não se lembra onde a deixou. Mais recentemente, inventou-se um sistema ainda melhor: os estudos são agora feitos pelas próprias empresas que mais tarde executarão as obras.
De modo que, chegados a este ponto, o problema não é propriamente económico. É um problema político de poder, ou seja, de saber quem manda em quê e quem controla quem. Sem resolvê-lo, qualquer plano tecnológico, educacional ou outro é pura perda de tempo e dinheiro jogado à rua.
É por tuto isto que sou levado a concordar com o que tem afirmado a Maria José Morgado: o cerne dos problemas do país reside hoje na corrupção e no seu inevitável companheiro de cama, o crime organizado.
18.11.04
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário