"Deixai vir o futuro, que alguma coisa haveremos de fazer com ele."
Chaim Azriel Weizmann (Primeiro Presidente do Estado de Israel)
31.12.06
Maluquinhos
Não sei porquê, o balanço de 2006 proposto por Vasco Pulido Valente fez-me lembrar aquele moderno Jeremias que, não há muito tempo, costumava instalar uma banquinha pejada de cartazes e folhetos na extrema do Rossio que conduz à Rua do Carmo. De megafone em punho, ameaçava os passantes com o eminente Fim do Mundo e instava-os a fazerem penitência para se prepararem para o Dia do Juízo Final.
Por mim, prefiria o maluquinho do Rossio. Não invocava nenhum conhecimento privilegiado da política internacional, mas tão somente uma íntima familiaridade com a palavra de Deus. De modo que os transeuntes se sentiam mais à vontade para ignorarem aquelas terríveis profecias com um encolher de ombros e irem às suas vidas, limitando-se a deixarem cair de passagem um caridoso desabafo de comiseração: "Coitadinho!"
Por mim, prefiria o maluquinho do Rossio. Não invocava nenhum conhecimento privilegiado da política internacional, mas tão somente uma íntima familiaridade com a palavra de Deus. De modo que os transeuntes se sentiam mais à vontade para ignorarem aquelas terríveis profecias com um encolher de ombros e irem às suas vidas, limitando-se a deixarem cair de passagem um caridoso desabafo de comiseração: "Coitadinho!"
30.12.06
Não reconciliados
"Departed" é um dos melhores Scorsese desde há um porradão de tempo. Mas é preciso reconhecer que, depois de fitas tão medíocres como "Gangs de Nova Iorque" e "O Aviador", também não era difícil.
Os primeiros minutos são quase mágicos: a rápida e subtil definição dos principais personagens, os inteligentes movimentos de camera, a acumulação de detalhes significativos definidores de um ambiente, e, é claro, a banda sonora, tudo contribui para nos mergulhar prontamente no cerne da intriga.
Em menos de um fósforo, damos por nós de pés e mãos atados à mercê do capricho artístico do realizador.
O fim do filme, porém, é desastroso. Quando tudo parecia apontar para um desenlace perturbadoramente amoral, em que os maus triunfam e os bons são castigados, uma disparatada série de assassinatos conduzem a história para um desenlace que, no dia em que fui ao cinema, pôs parte da plateia a rir.
E é claro que, quando um realizador falha o final de uma forma tão estrondosa, muito dificilmente poderemos considerar estarmos perante um grande filme.
60s Crash Course - Gene Pitney: Something's Gotten Hold of My Heart
Durante algum tempo estiveram na moda estas vozinhas de falseto, em descarado e agressivo contraste com as dos crooners machões que até então faziam lei no segmento das canções lamechas. Que me recorde, ninguém batia Gene Pitney nessa especialidade.
Durante algum tempo estiveram na moda estas vozinhas de falseto, em descarado e agressivo contraste com as dos crooners machões que até então faziam lei no segmento das canções lamechas. Que me recorde, ninguém batia Gene Pitney nessa especialidade.
Pensando melhor
Durante breves dias, o tempo pára de correr: O Natal é um anti-acontecimento. Eis a prova: os próprios centros comerciais chegam a encerrar por um dia, como se o mundo tivesse fechado para limpezas.
Interrompido o curso normal do quotidiano, abate-se sobre o país um estado geral de auto-satisfeita sonolência.
Recomendam-se para a ceia bacalhau ou outros pratos pesados que, dificultando a digestão, estimulam o embotamento das almas, demasiado prazeirentas para reagirem a estímulos.
O álcool em quantidade reforça o efeito. O calor da lareira, preferentemente excessivo, prolonga-o. Conversas indiferentes, sem objecto nem sentido, consolidam-no.
Pensando melhor, o verdadeiro espírito natalício é o torpor.
Interrompido o curso normal do quotidiano, abate-se sobre o país um estado geral de auto-satisfeita sonolência.
Recomendam-se para a ceia bacalhau ou outros pratos pesados que, dificultando a digestão, estimulam o embotamento das almas, demasiado prazeirentas para reagirem a estímulos.
O álcool em quantidade reforça o efeito. O calor da lareira, preferentemente excessivo, prolonga-o. Conversas indiferentes, sem objecto nem sentido, consolidam-no.
Pensando melhor, o verdadeiro espírito natalício é o torpor.
O século dos barretes
Primeiro foi a ameaça do bug do milénio, que pôs o mundo inteiro na expectativa de uma catástrofe económica de proporções inomináveis. Na data aprazada, porém, nada sucedeu, excepto meia dúzia de indivíduos terem enriquecido à custa de centenas de milhões de tansos.
Depois, veio o susto das armas de destruição massiva, a breve trecho transformado em guerra contra o terror. Vale a pena dizer mais?
Seguiu-se uma distracção fabricada para exclusivo consumo doméstico. O processo Casa Pia foi anunciado como uma investigação destinada a desmantelar uma rede internacional de pedofilia envolvendo gente muito poderosa. Saldo final: a expectável condenação de um bode expiatório, a decapitação do principal partido da oposição e a colocação sob escuta do Presidente da República.
De regresso às grandes produções à escala global, fomos em seguida introduzidos à gripe das aves, uma pandemia vinda, como convém, do Oriente, que ameaçava varrer de um sopro uma grande parcela da humanidade. Passados dois anos, das aves nem pio.
O barrete que se segue chama-se nuclearização do Irão, e é o pretexto mais expedito para resolver o conflito do Iraque alargando o teatro das operações de guerra.
Anestesiado por tanto alarme gratuito, e descrente dos líderes que regularmente lhe atenazam os miolos com catástrofes anunciadas que os factos logo se encarregam de desmentir, o público acaba, como na história do pastorinho e do lobo, por encarar com descabida bonomia o aquecimento global do planeta que, esse sim, parece configurar uma ameaça séria e global para todos nós.
Mas - perguntarão - como é que eu sei que o aquecimento global não é apenas mais um barrete a juntar à longa (mas, ainda assim, incompleta) série que mencionei? Ora, porque, ao contrário do que sucedeu em todos os outros casos, este não é glosado em tons apocalípticos pelo Pacheco Pereira.
29.12.06
O bom gosto do Rod Stewart
Num comentário colocado na caixa correspondente, o Ivan Nunes questiona a minha opinião sobre aquilo a que chamei o "bom gosto musical" do Rod Stewart.
O post que escrevi limita-se a dar conta da perplexidade que a música dele sempre suscitou em mim. Por um lado, as canções transmitem-me invariavelmente um sentimento de energia que me põe de bem comigo próprio; por outro, repele-me o personagem meio aparvalhado que ele compõe. É isso que sinto, e os sentimentos não podem negar-se.
Acredito que o Rod Stewart tira o melhor partido possível das peculiaridades da sua voz, sabe escolher o seu reportório, rodeia-se de músicos e arranjadores capazes. Numa palavra: tem bom gosto musical.
Dito isto, gostaria de destacar alguns pontos. Primeiro, quero esclarecer que a minha simpatia pela música que o Rod Stewart faz nunca chegou ao extremo de me levar a comprar um disco dele. Ouço-o de vez em quando na rádio, e isso basta-me.
Segundo, estou consciente de que, tal como o Mick Jagger é um tipo muito mais sensato do que a imagem pública de Mefistófeles que construíu para si mesmo pretende fazer crer, o Rod Stewart não é certamente o cretino que aparenta. Note-se, por exemplo, como as mulheres que exibe em público - perfeitamente alinhadas pelo estereótipo da espampanante "mulher de jogador de futebol" - se encaixam às mil maravilhas na máscara que procura projectar para o seu público.
Para concluír: Deus, na sua infinita misericórdia, abriu-me o espírito para a música pop no breve intervalo de tempo decorrido entre, digamos, 1963 e 1972. De então para cá, o meu interesse restringiu-se a uma mão cheia de artistas: Smiths, Pogues, Prince, REM, Bjork e pouco mais. Por conseguinte, não só não fazia a menor ideia de que (segundo me informa o Ivan) o Rod Stewart gravou um disco de standards de jazz, como estou perfeitamente disposto a aceitar a opinião dele de que se trata de uma pepineira monumental. E, já agora, gostaria de lembrar que músicos muito mais importantes do que este escocês esgrouviado também debitam regularmente a sua chumbada.
60s Crash Course - Rod Stewart: Maggie May
Depois de falhar como futebolista, Rod Stewart tornou-se coveiro. Expulso de Espanha por vagabundagem, tentou a música como tantos outros vadios. Esteve perto de integrar os Kinks e os Fleetwood Mac. Acabou por ser aceite pelos Small Faces, de onde saíu para iniciar uma carreira a solo que dura vai para quatro décadas. Como é que este bardinas foleirão consegue ter tão bom gosto musical? Mais um Grande Mistério do Universo.
Depois de falhar como futebolista, Rod Stewart tornou-se coveiro. Expulso de Espanha por vagabundagem, tentou a música como tantos outros vadios. Esteve perto de integrar os Kinks e os Fleetwood Mac. Acabou por ser aceite pelos Small Faces, de onde saíu para iniciar uma carreira a solo que dura vai para quatro décadas. Como é que este bardinas foleirão consegue ter tão bom gosto musical? Mais um Grande Mistério do Universo.
28.12.06
27.12.06
60s Crash Course - Norman McLaren: Synchromy
Norman McLaren, a figura mais importante da história da animação, só começou a ser conhecido nos anos 60, embora por essa altura já estivesse activo há duas décadas no National Film Board do Canadá. A primeira vez que de facto pude assistir a alguns dos seus filmes foi numa sessão organizada na Sociedade Nacional de Belas-Artes em finais dos anos 60. "Synchromy", a pequena maravilha que aqui se pode ver, foi realizada em 1971.
Norman McLaren, a figura mais importante da história da animação, só começou a ser conhecido nos anos 60, embora por essa altura já estivesse activo há duas décadas no National Film Board do Canadá. A primeira vez que de facto pude assistir a alguns dos seus filmes foi numa sessão organizada na Sociedade Nacional de Belas-Artes em finais dos anos 60. "Synchromy", a pequena maravilha que aqui se pode ver, foi realizada em 1971.
60s Crash Course - The Fosbury flop
Dick Fosbury deixou toda a gente de boca aberta quando, nas Olimpíadas de 68, desdenhando o rolamento ventral, optou antes por saltar de costas. Ganhou a medalha de ouro e nunca mais ninguém pulou de outra maneira. Enfim, a maior invenção desde a lâmpada eléctrica.
Dick Fosbury deixou toda a gente de boca aberta quando, nas Olimpíadas de 68, desdenhando o rolamento ventral, optou antes por saltar de costas. Ganhou a medalha de ouro e nunca mais ninguém pulou de outra maneira. Enfim, a maior invenção desde a lâmpada eléctrica.
26.12.06
A essência do Natal
Ainda para aí certa gente a perguntar se fará sentido separar-se o Natal da sua originária essência cristã.
Ora o que comprova sem margem para dúvidas a evolução nestes últimos dias da actividade dos blogues e das visitas que eles recebem é que a essência do Natal é a modorra.
Hoje já aliviou um bocadito.
Ora o que comprova sem margem para dúvidas a evolução nestes últimos dias da actividade dos blogues e das visitas que eles recebem é que a essência do Natal é a modorra.
Hoje já aliviou um bocadito.
Falso alarme
Estará o liberalismo condenado se se vier a confirmar, como sugere a moderna neurociência, que o livre arbítrio não existe? Eis a pergunta lançada num dos leaders do Economist desta semana.
A resposta depende do tipo de liberalismo de que estivermos a falar.
O liberalismo de inspiração pluralista ao estilo de John Stuart Mill sustenta que a competição entre diversas alternativas produz melhores resultados na política, na economia, na cultura, na ciência e, se quisermos, até na religião e na moral, porque obriga as ideias, práticas e formas de vida a demonstrarem a sua superioridade.
Não vejo como é que esta variante quasi-empírica do liberalismo pode ser afectada, para o bem ou para o mal, pelas mencionadas descobertas científicas.
Mas é evidente que o mesmo não sucederá com o liberalismo doutrinário que prega a liberdade de escolha e o primado da responsabilidade individual. Não precisaremos, aliás, de esperar pela evolução da neurociência para chegar a um veredicto, dado que toda a investigação realizada nas últimas décadas demonstra que a escolha individual ou é um fenómeno muito raro ou não existe de todo.
Infelizmente, a teoria económica, frequentemente apresentada como a teoria da escolha, não se tem revelado disponível para incorporar essas descobertas. Problema dela.
A resposta depende do tipo de liberalismo de que estivermos a falar.
O liberalismo de inspiração pluralista ao estilo de John Stuart Mill sustenta que a competição entre diversas alternativas produz melhores resultados na política, na economia, na cultura, na ciência e, se quisermos, até na religião e na moral, porque obriga as ideias, práticas e formas de vida a demonstrarem a sua superioridade.
Não vejo como é que esta variante quasi-empírica do liberalismo pode ser afectada, para o bem ou para o mal, pelas mencionadas descobertas científicas.
Mas é evidente que o mesmo não sucederá com o liberalismo doutrinário que prega a liberdade de escolha e o primado da responsabilidade individual. Não precisaremos, aliás, de esperar pela evolução da neurociência para chegar a um veredicto, dado que toda a investigação realizada nas últimas décadas demonstra que a escolha individual ou é um fenómeno muito raro ou não existe de todo.
Infelizmente, a teoria económica, frequentemente apresentada como a teoria da escolha, não se tem revelado disponível para incorporar essas descobertas. Problema dela.
60s Crash Course - The Association: Along Comes Mary
Os Association eram o segundo melhor grupo vocal da Costa Oeste. O relativo esquecimento que os vitimou confirma que nunca é bom ser-se o número dois em qualquer coisa. Em me apetecendo, é possível que eu reincida na reprodução de videos deles. Porque merecem.
Os Association eram o segundo melhor grupo vocal da Costa Oeste. O relativo esquecimento que os vitimou confirma que nunca é bom ser-se o número dois em qualquer coisa. Em me apetecendo, é possível que eu reincida na reprodução de videos deles. Porque merecem.
25.12.06
Livros paralelos
Por que é que abundam os bons livros de divulgação científica e escasseiam os que se esforçam por popularizar a teoria económica? Este é um mistério tanto mais difícil de explicar quanto é certo que a economia desempenha hoje um papel central em tantas discussões sobre a situação do mundo em que vivemos e o que poderia ser feito para melhorá-lo.
"Freakonomics", de Steven D. Levitt e Stephen J. Dubner, veio ocupar esse espaço vazio no mercado livreiro. O livro é antes de mais um testemunho da qualidade da edição americana. Mediante uma selecção arguta de exemplos de grande apelo para o grande público - entre os quais se contam a relação entre o dinheiro e a política, a corrupção no desporto ou a influência da legalização do aborto sobre a criminalidade - o leitor é introduzido a alguns dos métodos de investigação correntemente utilizados pelos economistas.
Todavia, "Freakonomics" não trata verdadeiramente de teoria económica. Limita-se a demonstrar convincentemente a utilidade da análise estatística para esclarecer assuntos controversos deslindando relações inesperadas entre fenómenos económicos e sociais.
Pelo contrário, "The Undercover Economist", de Tim Harford, apresenta de uma forma acessível ideias centrais da teoria económica, entre elas o papel da escassez na distribuição dos recursos, os traços distintivos do funcionamento dos mercados, o modo correcto de corrigir as externalidades, os problemas que resultam das assimetrias de informação e os princípios da divisão do trabalho e das vantagens comparativas.
Infelizmente, o livro situa-se sempre a um nível mais abstracto do que "Freakonomics", o que o torna relativamente menos acessível aos leigos.
Recomendação final: leiam "Freaknomics" pelo prazer e "The Undercover Economics" para aprender.
Nota: Ambos os livros se encontram traduzidos para português.
24.12.06
Perder o fio à meada
Estou disposto a crer que algumas raras pessoas talvez consigam entender os cada vez mais intrincados argumentos dos thrillers, mas posso garantir-vos que nenhuma delas faz parte do círculo das minhas relações. Fazer o espectador sentir-se muito estúpido aparenta ser o propósito essencial de tais exercícios.
Parece-me que estamos agora a entrar numa nova fase, em que já nem o próprio argumentista percebe a teia que urdiu. Os últimos quinze minutos de Déjá Vu, por exemplo, são absolutamente patéticos - e este é o mais suave eufemismo que de momento me ocorre - no modo como desafiam toda a lógica na vã tentativa de salvarem um enredo cujo sentido entretanto em absoluto se perdeu.
23.12.06
22.12.06
Como é diferente o politicamente correcto em Portugal
No editorial de hoje do Público, Nuno Pacheco insurge-se contra a "rejeição de símbolos natalícios" nos EUA e em Inglaterra.
Na página 5 do mesmo jornal, Constança Cunha e Sá defende a mesma opinião na sua crónica.
Na página 8 do mesmo jornal, Esther Mucznik defende a mesma opinião na sua crónica.
Na página 48 do mesmo jornal, Vasco Pulido Valente defende a mesma opinião na sua crónica.
É caso para dizer que o pluralismo está bem assegurado no Público.
O politicamente correcto é a tentativa de impor a opinião bem-pensante, de modo que pareça mal alguém ser visto em público a defender ou a fazer algo diferente.
O Público de hoje confirma que, ao contrário do que sucede nos EUA, em Portugal o que parece bem é ser-se reaccionário.
Um traço comum a todos os comentadores horrorizados com a terrível ofensa à civilização ocidental que neste Natal teve lugar num certo número de empresas inglesas e americanas é a grosseira falsificação dos factos.
Assim, Pulido Valente garante que é hoje "quase criminoso festejar o Natal". Nuno Pacheco afirma que "se ocultam os símbolos ou as histórias associados ao nascimento de Cristo". Constança Cunha e Sá sustenta que Mozart foi censurado. Esther Mucznik entende que "o laicismo exerce (...) uma função persecutória".
Tudo isto é - pura e simplesmente - mentira.
Quanto ao que de facto se está a passar nas empresas britânicas e americanas, os comentários ficam para outro dia.
Na página 5 do mesmo jornal, Constança Cunha e Sá defende a mesma opinião na sua crónica.
Na página 8 do mesmo jornal, Esther Mucznik defende a mesma opinião na sua crónica.
Na página 48 do mesmo jornal, Vasco Pulido Valente defende a mesma opinião na sua crónica.
É caso para dizer que o pluralismo está bem assegurado no Público.
O politicamente correcto é a tentativa de impor a opinião bem-pensante, de modo que pareça mal alguém ser visto em público a defender ou a fazer algo diferente.
O Público de hoje confirma que, ao contrário do que sucede nos EUA, em Portugal o que parece bem é ser-se reaccionário.
Um traço comum a todos os comentadores horrorizados com a terrível ofensa à civilização ocidental que neste Natal teve lugar num certo número de empresas inglesas e americanas é a grosseira falsificação dos factos.
Assim, Pulido Valente garante que é hoje "quase criminoso festejar o Natal". Nuno Pacheco afirma que "se ocultam os símbolos ou as histórias associados ao nascimento de Cristo". Constança Cunha e Sá sustenta que Mozart foi censurado. Esther Mucznik entende que "o laicismo exerce (...) uma função persecutória".
Tudo isto é - pura e simplesmente - mentira.
Quanto ao que de facto se está a passar nas empresas britânicas e americanas, os comentários ficam para outro dia.
Notícias sem ponta de interesse
Notícia de primeira página do Público de hoje:
Notícia colocada na página 40 (quinta e última da Secção de Economia):
Na mesma página lê-se ainda:
Fico à espera do comentário de Eduardo Cintra Torres sobre uma eventual manipulação da informação do Público pelos partidos da Oposição. Ninguém lhe soprou nada?
"Certidões do caso "Apito Dourado" "perdidas" entre Gondomar e Lisboa"
Notícia colocada na página 40 (quinta e última da Secção de Economia):
"Os sinais de aceleração da economia em Portugal foram ontem confirmados mais uma vez pelo INE e pelo Banco de Portugal (...) Segundo os dados divulgados ontem, a economia portuguesa registou mesmo a sua melhor performance dos últimos dois anos."
Na mesma página lê-se ainda:
"O número de inscritos nos centros de emprego e formação profissional dimnuiu 5,9% em Novembro, face a igual mês do ano passado, informou ontem o IEFP."
Fico à espera do comentário de Eduardo Cintra Torres sobre uma eventual manipulação da informação do Público pelos partidos da Oposição. Ninguém lhe soprou nada?
21.12.06
60s Crash Course - David McWilliams: The Days Of Pearly Spencer
De vez em quando aparece caído do céu um desconhecido que se sai com uma canção surpreendente e logo depois desaparece sem deixar rasto. Golpe de sorte? Capricho dos deuses? Estes mistérios do universos deixam-nos a vaga ilusão de que, se calhar, se ele conseguiu, também nós poderíamos ter sido capazes.
De vez em quando aparece caído do céu um desconhecido que se sai com uma canção surpreendente e logo depois desaparece sem deixar rasto. Golpe de sorte? Capricho dos deuses? Estes mistérios do universos deixam-nos a vaga ilusão de que, se calhar, se ele conseguiu, também nós poderíamos ter sido capazes.
20.12.06
Os ansiados galardões do bl-g--x-st-
Melhor blogue do ano: Mãos ao Ar
Melhor blogue humorístico do ano: Mãos ao Ar
Melhor blogue desportivo do ano: Mãos ao Ar
Melhor blogue de futebol do ano: Mãos ao Ar
Melhor blogue sportinguista do ano: Mãos ao Ar
Melhores bloggers do ano: Bulhão Pato e Sancho Urraco ex-aequo
Melhor blogue humorístico do ano: Mãos ao Ar
Melhor blogue desportivo do ano: Mãos ao Ar
Melhor blogue de futebol do ano: Mãos ao Ar
Melhor blogue sportinguista do ano: Mãos ao Ar
Melhores bloggers do ano: Bulhão Pato e Sancho Urraco ex-aequo
19.12.06
Por que há-de o Estado ter universidades?
Na medida em que contribui para aumentar a produtividade do país, a educação não beneficia apenas aqueles que directamente a recebem.
Esse ganho social ocorre em todos os escalões do ensino, mas muito mais no elementar do que no superior, no qual os ganhos revertem proporcionalmente mais para o estudante do que para a comunidade.
Por esse motivo, são muito discutíveis as vantagens da presença directa do Estado no ensino superior.
Entende-se que o Estado deva desempenhar uma função reguladora, autorizando a abertura de universidades e de cursos e instituindo padrões de exigência mínimos que garantam a qualidade do ensino ministrado. Entende-se ainda mais que proporcione condições de acesso às universidades aos alunos que não têm recursos para suportar o seu custo. Entende-se também que fomente activamente a investigação científica universitária.
Mas nada isso exige que o Estado seja proprietário e gestor de universidades, sobretudo quando se limita a pagá-las sem dispor de poderes para controlar efectivamente o modo como o dinheiro é gasto. Ao contrário do que sucede nos escalões elementar e secundário do ensino, a lógica de subsidiar o estudante em vez de subsidiar o estabelecimento faz aqui todo o sentido.
É curioso que, sendo o argumento a favor da privatização das universidades muito mais convincente do que o argumento a favor da privatização das auto-estradas, dos hospitais ou das águas, haja tão escassa mobilização em seu favor. Se calhar, é porque as universidades não se afiguram um negócio suficientemente atraente para grandes grupos financeiros.
Esse ganho social ocorre em todos os escalões do ensino, mas muito mais no elementar do que no superior, no qual os ganhos revertem proporcionalmente mais para o estudante do que para a comunidade.
Por esse motivo, são muito discutíveis as vantagens da presença directa do Estado no ensino superior.
Entende-se que o Estado deva desempenhar uma função reguladora, autorizando a abertura de universidades e de cursos e instituindo padrões de exigência mínimos que garantam a qualidade do ensino ministrado. Entende-se ainda mais que proporcione condições de acesso às universidades aos alunos que não têm recursos para suportar o seu custo. Entende-se também que fomente activamente a investigação científica universitária.
Mas nada isso exige que o Estado seja proprietário e gestor de universidades, sobretudo quando se limita a pagá-las sem dispor de poderes para controlar efectivamente o modo como o dinheiro é gasto. Ao contrário do que sucede nos escalões elementar e secundário do ensino, a lógica de subsidiar o estudante em vez de subsidiar o estabelecimento faz aqui todo o sentido.
É curioso que, sendo o argumento a favor da privatização das universidades muito mais convincente do que o argumento a favor da privatização das auto-estradas, dos hospitais ou das águas, haja tão escassa mobilização em seu favor. Se calhar, é porque as universidades não se afiguram um negócio suficientemente atraente para grandes grupos financeiros.
Falha de mercado
A proposta de aumento das tarifas eléctricas no próximo ano proposta por Jorge Vasconcelos, o Presidente cessante da ERSE, pode não ter parecido muito sensata. Mas é preciso recordar que não foi ele quem criou o problema que desse modo procurava resolver.
Por outro lado, é evidente que o Ministro Manuel Pinho não estará cá para ser penalizado pela opinião pública quando chegar a hora de pagarmos os juros acumulados que o diferimento do pagamento da dívida por ele decidido implicará.
Perante tão evidente falha do mercado político, exigir-se-ia que o primeiro-ministro intervisse no assunto. Até porque, previsivelmente, as consequências do que agora foi feito hão-de sobrar para ele.
Por outro lado, é evidente que o Ministro Manuel Pinho não estará cá para ser penalizado pela opinião pública quando chegar a hora de pagarmos os juros acumulados que o diferimento do pagamento da dívida por ele decidido implicará.
Perante tão evidente falha do mercado político, exigir-se-ia que o primeiro-ministro intervisse no assunto. Até porque, previsivelmente, as consequências do que agora foi feito hão-de sobrar para ele.
60s Crash Course - Jefferson Airplane: White Rabbit
Em "White Rabbit" os Jefferson Airplane misturaram a Alice de Lewis Carroll, acordes de flamenco, rock estridente e cogumelos alucinogénicos:
Em "White Rabbit" os Jefferson Airplane misturaram a Alice de Lewis Carroll, acordes de flamenco, rock estridente e cogumelos alucinogénicos:
One pill makes you largerNão admira que, muito anos depois, interrogada sobre as suas memórias de São Francisco em 1968, Grace Slick, a vocalista do grupo, tenha respondido: "Se alguém disser que se lembra do que se passou é porque não esteve lá."
And one pill makes you small
And the ones that mother gives you
Don't do anything at all
Go ask Alice
When she's ten feet tall
And if you go chasing rabbits
And you know you're going to fall
Tell 'em a hookah smoking caterpillar
Has given you the call
Call Alice
When she was just small
When men on the chessboard
Get up and tell you where to go
And you've just had some kind of mushroom
And your mind is moving low
Go ask Alice
I think she'll know
When logic and proportion
Have fallen sloppy dead
And the White Knight is talking backwards
And the Red Queen's "off with her head!"
Remember what the dormouse said:
"Feed your head
Feed your head
Feed your head"
18.12.06
60s Crash Course: Cream: Crossroads
Eric Clapton, Jack Bruce e Ginger Baker tiveram o grande descaramento de se auto-denominarem "a nata" do blues-rock. Crossroads, uma composição do bluesman Robert Johnson, resgatado do esquecimento por um punhado de devotos adolescentes britânicos, dentre os quais se destacaram o próprio Clapton, Keith Richards e Jeff Beck, é a mais notável performance ao vivo dos Cream registada em disco (Wheels of Fire, de 1969).
Eric Clapton, Jack Bruce e Ginger Baker tiveram o grande descaramento de se auto-denominarem "a nata" do blues-rock. Crossroads, uma composição do bluesman Robert Johnson, resgatado do esquecimento por um punhado de devotos adolescentes britânicos, dentre os quais se destacaram o próprio Clapton, Keith Richards e Jeff Beck, é a mais notável performance ao vivo dos Cream registada em disco (Wheels of Fire, de 1969).
Aos bloggers desprezados
A imprensa séria e maçadora, dita "de referência", adora blogues sérios e maçadores, pelo que é a esses, e só a esses, que rende as suas homenagens.
Mas essa côterie exclusiva não conta ao todo, bem vistas coisas, mais do que uns cinquenta blogues.
A grande maioria dos bloggers activos, pouco inclinada a perorar sobre os grandes mistérios do universo, dedica-se antes aos temas verdadeiramente importantes da vida, que é como quem diz: "gajas e futebol". Operam, porém, em regime de tolerada semi-clandestinidade, ignorados pela opinião pública bem pensante e, logo, sem direito a citações no Diário de Notícias ou no Público.
Ora aquilo que distingue a boa escrita não é o assunto sobre o qual se exerce, mas o modo como o trata.
De modo que é altura de alguém romper uma lança em favor desses bloggers desprezados, injustadamente arrumados numa prateleira cuja designação apenas sugere vulgaridade.
Venham daí visitar o Cafajeste para melhor entenderem do que estou a falar.
Mas essa côterie exclusiva não conta ao todo, bem vistas coisas, mais do que uns cinquenta blogues.
A grande maioria dos bloggers activos, pouco inclinada a perorar sobre os grandes mistérios do universo, dedica-se antes aos temas verdadeiramente importantes da vida, que é como quem diz: "gajas e futebol". Operam, porém, em regime de tolerada semi-clandestinidade, ignorados pela opinião pública bem pensante e, logo, sem direito a citações no Diário de Notícias ou no Público.
Ora aquilo que distingue a boa escrita não é o assunto sobre o qual se exerce, mas o modo como o trata.
De modo que é altura de alguém romper uma lança em favor desses bloggers desprezados, injustadamente arrumados numa prateleira cuja designação apenas sugere vulgaridade.
Venham daí visitar o Cafajeste para melhor entenderem do que estou a falar.
60s Crash Course: Johnny Cash: I Walk the Line
O que mais me surpreendeu neste video do início dos anos 60 foi constatar como Johnny Cash se esforçava aplicadamente na época por imitar Leonard Cohen que, todavia, só se revelaria uma meia dúzia de anos depois. Isso fez-me lembrar a pergunta colocada há algum templo pelo Ivan Nunes sobre como seria o mundo antes do cantor canadiano. Como se pode constatar, era mais ou menos assim.
O que mais me surpreendeu neste video do início dos anos 60 foi constatar como Johnny Cash se esforçava aplicadamente na época por imitar Leonard Cohen que, todavia, só se revelaria uma meia dúzia de anos depois. Isso fez-me lembrar a pergunta colocada há algum templo pelo Ivan Nunes sobre como seria o mundo antes do cantor canadiano. Como se pode constatar, era mais ou menos assim.
17.12.06
15.12.06
60s Crash Course - Lovin' Spoonful: Summer In the City
Os Lovin' Spoonful eram John Sebastian - compositor, cantor e músico de variados talentos - e mais três. Summer in the City é, para mim, o mais perfeito single jamais produzido, onde não há nada a mais nem a menos. O video-clip está bem apanhado, mas é preciso fazer notar que não respeita o espírito da canção.
Os Lovin' Spoonful eram John Sebastian - compositor, cantor e músico de variados talentos - e mais três. Summer in the City é, para mim, o mais perfeito single jamais produzido, onde não há nada a mais nem a menos. O video-clip está bem apanhado, mas é preciso fazer notar que não respeita o espírito da canção.
Perigos do tudo ou nada
O João Miranda acredita que a liberdade é primordial em relação à democracia. O Pedro Arroja acha o contrário.
Cá para o meu gosto, estão ambos enganados. Democracia sem liberdade é tirania, situação que o regime soviético exemplifica na perfeição. Liberdade sem democracia é injustiça, e abundam as ilustrações.
A inovação específica das sociedades contemporâneas é a democracia liberal, ideia que num passado não muito distante era unanimemente considerada pela gente sensata um rematado disparate.
A convivência entre liberdade e democracia é sempre difícil, instável e provisória. Por conseguinte, se quisermos que vingue, terá por força que ser periodicamente reinventada.
Para a democracia liberal funcionar, ambos os princípios que a regem cedem qualquer coisa. Ou seja, aceitam ser imperfeitamente concretizados, desistem do tudo ou nada doutrinário.
Se conseguissemos concordar nisto, metade das nossas querelas ficariam resolvidas.
Cá para o meu gosto, estão ambos enganados. Democracia sem liberdade é tirania, situação que o regime soviético exemplifica na perfeição. Liberdade sem democracia é injustiça, e abundam as ilustrações.
A inovação específica das sociedades contemporâneas é a democracia liberal, ideia que num passado não muito distante era unanimemente considerada pela gente sensata um rematado disparate.
A convivência entre liberdade e democracia é sempre difícil, instável e provisória. Por conseguinte, se quisermos que vingue, terá por força que ser periodicamente reinventada.
Para a democracia liberal funcionar, ambos os princípios que a regem cedem qualquer coisa. Ou seja, aceitam ser imperfeitamente concretizados, desistem do tudo ou nada doutrinário.
Se conseguissemos concordar nisto, metade das nossas querelas ficariam resolvidas.
60s Crash Course - Buffalo Springfield: For What It's Worth
A motivação imediata desta canção foi a morte de quatro estudantes no tiroteio que se seguiu à invasão da Universidade de Chicago pelo exército em 1967. A letra desvia-se da tradição da protest song na medida em que, embora condene a violência da repressão,
pede que não se responda na mesma moeda e que se pare para pensar. É, pois, uma canção subtilmente pacifista:
Os Buffalo Springfield tiveram vida curta. Neil Young saíu para se dedicar a uma carreira a solo que dura até hoje, embora durante algum tempo se tenha reencontrado com Steve Stills nos Crosby, Stills, Nash & Young.
A motivação imediata desta canção foi a morte de quatro estudantes no tiroteio que se seguiu à invasão da Universidade de Chicago pelo exército em 1967. A letra desvia-se da tradição da protest song na medida em que, embora condene a violência da repressão,
Paranoia strikes deep
Into your life it will creep
It starts when you're always afraid
You step out of line, the man come and take you away
pede que não se responda na mesma moeda e que se pare para pensar. É, pois, uma canção subtilmente pacifista:
I think it's time we stop, hey, what's that sound
Everybody look what's going down
Os Buffalo Springfield tiveram vida curta. Neil Young saíu para se dedicar a uma carreira a solo que dura até hoje, embora durante algum tempo se tenha reencontrado com Steve Stills nos Crosby, Stills, Nash & Young.
Colarinhos sebentos
A Maria José Morgado tornou-se conhecida do grande público por denunciar o escasso entusiasmo que entre nós é colocado na repressão do crime de colarinho branco.
De então para cá, ela foi afastada dos cargos que ocupava, o país andou entretido com o affaire Casa Pia e o colarinho branco só teve que se preocupar em apresentar-se bem engomado.
Renasce agora a preocupação, não propriamente com o colarinho branco, mas com o colarinho sebento dos dirigentes desportivos. É melhor que nada, mas, ainda assim, uma distracção em relação ao essencial.
É de esperar que, com o seu apurado sentido do serviço público, a Maria José Morgado faça um trabalho sério e competente. Apenas necessita de ter cuidado para não se deixar envolver nos julgamentos na praça pública que tanto gáudio provocam nos media - mas, também aí, suponho que ela terá aprendido bastante nos últimos anos.
De então para cá, ela foi afastada dos cargos que ocupava, o país andou entretido com o affaire Casa Pia e o colarinho branco só teve que se preocupar em apresentar-se bem engomado.
Renasce agora a preocupação, não propriamente com o colarinho branco, mas com o colarinho sebento dos dirigentes desportivos. É melhor que nada, mas, ainda assim, uma distracção em relação ao essencial.
É de esperar que, com o seu apurado sentido do serviço público, a Maria José Morgado faça um trabalho sério e competente. Apenas necessita de ter cuidado para não se deixar envolver nos julgamentos na praça pública que tanto gáudio provocam nos media - mas, também aí, suponho que ela terá aprendido bastante nos últimos anos.
Assuntos internos
Se está preocupado com "a situação do futebol", o PSD não precisa de pedir novas leis. Basta-lhe emitir uma circular interna ou, quando muito, convocar um Congresso Extraordinário para tratar do assunto.
Para quê promover a ingerência da Polícia Judiciária nos assuntos internos do partido? Só se for para ajudar a direcção a ver-se livre de opositores indesejáveis...
Para quê promover a ingerência da Polícia Judiciária nos assuntos internos do partido? Só se for para ajudar a direcção a ver-se livre de opositores indesejáveis...
14.12.06
60s Crash Course - The Animals: House Of The Rising Sun
Mais outro grupo que contribuíu decisivamente para a fama de Dylan, apesar de "The House of the Rising" ser um tema tradicional e de a versão que gravou não ser da sua autoria. A voz de Eric Burdon não era inferior em nada às de Mick Jagger ou Van Morrison. A dependência do álcool, porém, liquidou-lhe cedo a carreira. Os New Animals tiveram vida curta e pouco relevante. Entretanto, o teclista Alan Price saira para formar o Alan Price Set de boa memória e Chas Chandler dedicara-se em exclusivo à produção discográfica.
Mais outro grupo que contribuíu decisivamente para a fama de Dylan, apesar de "The House of the Rising" ser um tema tradicional e de a versão que gravou não ser da sua autoria. A voz de Eric Burdon não era inferior em nada às de Mick Jagger ou Van Morrison. A dependência do álcool, porém, liquidou-lhe cedo a carreira. Os New Animals tiveram vida curta e pouco relevante. Entretanto, o teclista Alan Price saira para formar o Alan Price Set de boa memória e Chas Chandler dedicara-se em exclusivo à produção discográfica.
60s Crash Course - Byrds: Eight Miles High
Os Byrds começaram por ser a resposta americana à invasão do rock britânico. Partindo de um folk electrificado evoluiram progressivamente para uma música de crescente complexidade. Foram os primeiros responsáveis pela divulgação de Dylan ao transformarem várias das suas canções, a começar por Mr. Tambourine Man, em grandes sucessos populares. Depois de Fifth Dimension a banda foi-se desagregando com a saída progressiva dos membros originais. Quando, por fim, se transformou nos Flying Burrito Brothers quase nada restava do brilhantismo original. Dave Crosby, o músico mais interessante do grupo, continuou a sua carreira nos Crosby, Stills, Nash & Young.
Os Byrds começaram por ser a resposta americana à invasão do rock britânico. Partindo de um folk electrificado evoluiram progressivamente para uma música de crescente complexidade. Foram os primeiros responsáveis pela divulgação de Dylan ao transformarem várias das suas canções, a começar por Mr. Tambourine Man, em grandes sucessos populares. Depois de Fifth Dimension a banda foi-se desagregando com a saída progressiva dos membros originais. Quando, por fim, se transformou nos Flying Burrito Brothers quase nada restava do brilhantismo original. Dave Crosby, o músico mais interessante do grupo, continuou a sua carreira nos Crosby, Stills, Nash & Young.
13.12.06
O estado do ensino superior
Na opinião de Manuel Castells, expressa aquando da sua última passagem por Portugal, o único factor comum a todos os surtos de desenvolvimento que estudou foi o papel central desempenhado pelas universidades.
Se ele estiver certo, é caso para dizer que estamos bem lixados, visto que as universidades são, em termos relativos, aquilo que pior funciona em Portugal. E o mais grave é que, ao contrário do que se passa em áreas como a saúde ou a justiça, nesta não foi ainda traçada qualquer linha de rumo estruturada e coerente tendo em vista a transformação do actual estado de coisas.
Os problemas do ensino superior público têm semelhanças com os dos tribunais e dos hospitais, mas fala-se pouco deles. Será porque a grande maioria dos comentadores com assento nos media são professores universitários?
Em Portugal temos muitos casos de professores catedráticos não doutorados. Muitos professores do quadro quase não dão aulas nem fazem investigação. As aulas são dadas por professores jovens, muitas vezes mal preparados e sem vínculo. Faz-se muito trabalho de consultoria a coberto das universidades, usando as suas instalações, os seus equipamentos e os seus funcionários, mas as universidades quase não ganham nada com isso. Resumindo:
1. As universidades ensinam pouco e mal
2. As universidades investigam pouco e mal
3. As universidades são um óptimo negócio para muita gente, mas não para elas próprias
Suponho que o ministro conhecerá este estado de coisas. Aparentemente, o seu plano é obrigar as universidades a emendarem-se restringindo o financiamento público. Creio que pensa mal: quem dirige as universidades públicas tenderá a cortar no essencial e a conservar o supérfluo, porque é isso que corresponde aos seus interesses e porque sabe que não terá que prestar contas a ninguém. Por este caminho, o mais natural é que boa parte das nossas instituições universitárias entre em processo de decadência progressiva e acabe por extinguir-se.
Outra ideia do ministro é que as universidades poderão ir buscar o dinheiro de que necessitam candidatando-se ao financiamento de programas de investigação científica. É certo que não há boas universidades sem investigação, mas não o é menos que, pelo menos a curto prazo, pode haver investigação sem universidades. Por este caminho, triunfará a segunda alternativa.
Se ele estiver certo, é caso para dizer que estamos bem lixados, visto que as universidades são, em termos relativos, aquilo que pior funciona em Portugal. E o mais grave é que, ao contrário do que se passa em áreas como a saúde ou a justiça, nesta não foi ainda traçada qualquer linha de rumo estruturada e coerente tendo em vista a transformação do actual estado de coisas.
Os problemas do ensino superior público têm semelhanças com os dos tribunais e dos hospitais, mas fala-se pouco deles. Será porque a grande maioria dos comentadores com assento nos media são professores universitários?
Em Portugal temos muitos casos de professores catedráticos não doutorados. Muitos professores do quadro quase não dão aulas nem fazem investigação. As aulas são dadas por professores jovens, muitas vezes mal preparados e sem vínculo. Faz-se muito trabalho de consultoria a coberto das universidades, usando as suas instalações, os seus equipamentos e os seus funcionários, mas as universidades quase não ganham nada com isso. Resumindo:
1. As universidades ensinam pouco e mal
2. As universidades investigam pouco e mal
3. As universidades são um óptimo negócio para muita gente, mas não para elas próprias
Suponho que o ministro conhecerá este estado de coisas. Aparentemente, o seu plano é obrigar as universidades a emendarem-se restringindo o financiamento público. Creio que pensa mal: quem dirige as universidades públicas tenderá a cortar no essencial e a conservar o supérfluo, porque é isso que corresponde aos seus interesses e porque sabe que não terá que prestar contas a ninguém. Por este caminho, o mais natural é que boa parte das nossas instituições universitárias entre em processo de decadência progressiva e acabe por extinguir-se.
Outra ideia do ministro é que as universidades poderão ir buscar o dinheiro de que necessitam candidatando-se ao financiamento de programas de investigação científica. É certo que não há boas universidades sem investigação, mas não o é menos que, pelo menos a curto prazo, pode haver investigação sem universidades. Por este caminho, triunfará a segunda alternativa.
O affaire Carolina explicado às crianças
Tudo o que é necessário entender sobre o affaire Carolina está explicado aqui no Mãos ao Ar, um blogue onde, desde há algumas semanas, me abasteço de humor e inteligência.
11.12.06
Ficou lá perto
Amadeu Souza-Cardoso: Cavaleiros, 1913.
O percurso mágico de Amadeu Souza-Cardoso nos anos que antecederam a Grande Guerra não pode ser interpretado como um mero processo de absorção de "influências" externas - como erradamente poderá tender a inferir-se da exposição que a Gulbenkian por estes dias nos oferece.
Na medida em que encerra e torna manifesta uma coerência própria, cada um dos vários estilos de Amadeu é tão genuinamente seu como os restantes.
Como Pessoa, também Souza-Cardoso tinha, entre 1910 e 1013, várias vozes dentro de si. Ao contrário dele, porém, recusou-se a assumir essa pluralidade.
Resolveu optar por uma delas, e optou mal.
Em 1913, Amadeu encontrava-se no limiar da abstracção. Chegado aí, não ousou dar o passo seguinte, recuando nos seus últimos anos para um cubismo algo tardio, que, embora competente, não se destaca pela originalidade.
Nunca saberemos o que poderia ter vindo depois.
7.12.06
Um filme frívolo
Com notável espírito de observação, Daniel Mendelssohn sugere que em "Maria Antoinette" Sofia Coppola volta a contar a mesma história que já nos propusera em "Lost in Translation", ou seja, a de uma mulher jovem confrontada com um mundo regido por absurdas convenções sociais que não entende, incapaz de comunicar com as pessoas que a rodeiam e tolhida por problemas amorosos que não sabe como resolver.
Só que, desta vez, a realizadora saíu-se mal. Na raíz do fracasso está o facto de Maria Antonieta não ter sido uma rapariga qualquer, mas antes alguém cuja personalidade e comportamento foram em grande parte determinados pelos acontecimentos históricos em que inevitavelmente se viu envolvida.
Como essa parte de Maria Antonieta não interessa a Sofia Coppola, o filme ignora-a:
Aparentemente, a cineasta não conseguiu erguer-se acima da perspectiva limitada da própria rainha, e isso apesar de, ao contrário dela, ter sabido antecipadamente como viria a acabar a história:
E conclui Mendelssohn:
Nem mais. E talvez essa "chocante ingenuidade", cada vez mais comum, nos diga algo sobre a dificuldade que, em geral, a época que vivemos, tão apaixonada por si mesma, tão impregnada da ilusão do eterno presente, tão incapaz de conceber formas diferentes de viver e sentir, tem em relacionar-se com o passado histórico.
Só que, desta vez, a realizadora saíu-se mal. Na raíz do fracasso está o facto de Maria Antonieta não ter sido uma rapariga qualquer, mas antes alguém cuja personalidade e comportamento foram em grande parte determinados pelos acontecimentos históricos em que inevitavelmente se viu envolvida.
Como essa parte de Maria Antonieta não interessa a Sofia Coppola, o filme ignora-a:
"Coppola's apparent lack of interest in anything outside of the cocooned and photogenic private world of the doomed Queen is evident in the desultory quality of the many stilted moments designed to convey what's going on in the world beyond Versailles—the kind of clanking scene in which someone says to the King at a meeting of his council, «The Americans are asking for help with their revolution,» or, worse, when we see someone rush up to the King and announce, «The Bastille has been stormed!»"
Aparentemente, a cineasta não conseguiu erguer-se acima da perspectiva limitada da própria rainha, e isso apesar de, ao contrário dela, ter sabido antecipadamente como viria a acabar a história:
"There is something Marie Antoinette-ish about the director's impatient disdain for the outside world, for the history that was going on all around her sensitive and troubled heroine."
E conclui Mendelssohn:
"To be so unreflective, to want to make a film about Marie Antoinette that ignores who she was in history, seems shockingly naive, intellectually. It's like wanting to make a film about what it's like to be a starving artist and deciding to have your hero be the young Adolf Hitler."
Nem mais. E talvez essa "chocante ingenuidade", cada vez mais comum, nos diga algo sobre a dificuldade que, em geral, a época que vivemos, tão apaixonada por si mesma, tão impregnada da ilusão do eterno presente, tão incapaz de conceber formas diferentes de viver e sentir, tem em relacionar-se com o passado histórico.
6.12.06
Perguntar não ofende
O Perguntar Não Ofende é um dos meus blogues preferidos. Sinto-me sempre mais inteligente depois de o ter lido, mas deve ser só impressão.
Eis uma selecção de perguntas intrigantes que recentemente lá encontrei:
Eis uma selecção de perguntas intrigantes que recentemente lá encontrei:
Não há homens com anorexia?
Quanto mais gente no elevador, maior o silêncio?
É apenas uma questão de tempo até que todas as bebés em Portugal se chamem Beatriz e Mariana ?
Porque é que as consultas são por ordem de marcação quando sou dos primeiros a chegar, mas quando me atraso são por ordem de chegada?
Um blog cheio de "sexo", "orgasmos", "prazer" "tesão", "três seguidas", "queca" e "ejacular" é invariavelmente escrito por uma mulher?
Em caso de ameaça de bomba no Jardim Zoológico, para onde são evacuados os animais?
Um mundo sem armas nucleares e umas escadas rolantes sem ninguém do lado esquerdo a impedir o caminho são sonhos impossíveis?
"Queres que eu estacione?" é um insulto disfarçado de ajuda?
O capachinho penteia-se antes ou depois de colocado?
4.12.06
A grande mistificação
Extracto do editorial do Economist desta semana, confirmando ideias que aqui tenho repetidamente exposto de há algum tempo a esta parte:
Ainda assim, alguns parágrafos adiante escreve-se no mesmo editorial:
The main reason for the dollar’s strength has been the widespread belief that the American economy vastly outperforms the world’s other rich country economies in recent years. But the figures do not support the hype. Sure, America’s GDP growth has been faster than Europe’s, but that is mostly because its population has grown more quickly too. Dig deeper, and the difference shrinks. Official figures of productivity growth, which should in theory be an important factor driving currency movements, exaggerate America’s lead. If the two are measured on a comparable basis, productivity growth over the past decade has been almost the same in the euro area as it has been in America. Even more important, the latest figures suggest that whereas productivity is now slowing in America, it is accelerating in the euro zone.Tendo em conta que o próprio Economist se empenhou durante anos em alimentar as confusões que agora denuncia, o que isto parece sugerir é que não é possível continuar a alimentar-se por mais tempo a ilusão da superioridade da economia americana em relação à europeia.
Ainda assim, alguns parágrafos adiante escreve-se no mesmo editorial:
As for Europe, the old continent is hobbled by inflexible product and labour markets. But that, paradoxically, is an advantage: it means that the place has a lot of scope for a lot of improvement.Como se explica isto? Se o produto per capita europeu tem crescido a um ritmo similar ao americano, se a produtividade cresce mais depressa, se a zona ainda por cima tem uma balança de transacções correntes equilibrada e as finanças em ordem, para que necessitamos então dessas "reformas" que visam tornar a Europa "tão competitiva" como os EUA?
30.11.06
Perguntar não ofende
Um dia destes haveremos de tentar perceber como pode considerar-se competitiva uma economia que, depois de ter desvalorizado a sua moeda cerca de 40% de há cinco anos para cá, continua a apresentar um défice das transacções correntes equivalente a 9% do seu produto.
Estou a falar dos EUA, evidentemente.
Estou a falar dos EUA, evidentemente.
Há coisas fantásticas, não há?
O Mãos ao ar é um blogue de dois sportinguistas que não só escrevem maravilhosamente como ainda por cima percebem mesmo de futebol.
Sportinguistas que percebem de futebol? Mas isso não é uma contradição nos termos? Eu estaria inclinado a dizer que sim, mas, depois de conhecê-los, terei provavelmente que rever a minha opinião.
Não percam, em especial a estupenda série "Os Merdinhas". Ainda vai na Parte 3.
Sportinguistas que percebem de futebol? Mas isso não é uma contradição nos termos? Eu estaria inclinado a dizer que sim, mas, depois de conhecê-los, terei provavelmente que rever a minha opinião.
Não percam, em especial a estupenda série "Os Merdinhas". Ainda vai na Parte 3.
Confirma-se a retoma
Após três meses consecutivos de crescimento acelerado, espera-se que também a OCDE e o FMI revejam em alta as suas previsões para o próximo ano.
Lá que há, há
Enquanto Ratzinger, ele era contra a entrada da Turquia na União Europeia. Enquanto Papa, a acreditar nos jornais de ontem, ele é a favor.
Obviamente, há aqui mãozinha do Espirito Santo.
Obviamente, há aqui mãozinha do Espirito Santo.
27.11.06
Ilhas de prosperidade
Querem mesmo imitar Singapura? A sério? Então vamos fazer o seguinte.
No nosso país, quase 50% da riqueza concentra-se nuns 10 concelhos. Se esses 10 concelhos se independentizassem, criar-se-ia um país altamente.
Mas isso seria um tanto complicado porque não há continuidade territorial entre todos eles. De modo que o plano poderia ser um bocadinho diferente.
Lisboa declararia a independência. Na margem Norte, ficaria com os concelhos de Lisboa, Oeiras, Sintra e Cascais. Na margem Norte, agregaria apenas Almada. Tudo o resto ficaria para Portugal.
O novo país - chamemos-lhe Nova Lisboa, visto que a cidade angolana do mesmo nome adoptou outra designação - guardaria para si os bancos, as seguradoras, as telecomunicações e as sedes de todas as grandes empresas industriais e de serviços. Reteria, no máximo, uns 20% dos funcionários públicos existentes. Acabaria com o exército e, em contrapartida, criaria uma imponente força policial para patrulhar as suas fronteiras. Os portugueses de Loures, Amadora, Barreiro e por aí fora, necessitariam de passaporte para virem trabalhar em Nova Lisboa. Evidentemente, seriam proibidos de ter acesso às praias da Caparica e da Linha. De vez em quando, o Benfica faria uma digressão por Portugal para gáudio dos indígenas.
Nova Lisboa tornar-se-ia numa sociedade próspera e competitiva, ao nível dos países mais evoluídos da Europa. Não teria de preocupar-se com o desenvolvimento do interior e das Ilhas. Não teria que financiar a construção de auto-estradas para Trás-os Montes. Não teria que subsidiar o ensino das crianças de aldeias longínquas. Não teria que tratar das doenças dos alentejanos. Essa inenarrável perda de tempo e de recursos que dá pelo nome de agricultura seria lançada às urtigas. A floresta poderia arder à vontade.
Em suma, esse país modelar povoado quase em exclusivo pela classe alta servida por criadagem portuguesa da província poderia dedicar-se inteiramente e sem estorvos à criação de riqueza.
Só haveria um problema: tenho a impressão de que os "doutores do Porto", como lhes chama o Franco Atirador, não iriam gostar.
No nosso país, quase 50% da riqueza concentra-se nuns 10 concelhos. Se esses 10 concelhos se independentizassem, criar-se-ia um país altamente.
Mas isso seria um tanto complicado porque não há continuidade territorial entre todos eles. De modo que o plano poderia ser um bocadinho diferente.
Lisboa declararia a independência. Na margem Norte, ficaria com os concelhos de Lisboa, Oeiras, Sintra e Cascais. Na margem Norte, agregaria apenas Almada. Tudo o resto ficaria para Portugal.
O novo país - chamemos-lhe Nova Lisboa, visto que a cidade angolana do mesmo nome adoptou outra designação - guardaria para si os bancos, as seguradoras, as telecomunicações e as sedes de todas as grandes empresas industriais e de serviços. Reteria, no máximo, uns 20% dos funcionários públicos existentes. Acabaria com o exército e, em contrapartida, criaria uma imponente força policial para patrulhar as suas fronteiras. Os portugueses de Loures, Amadora, Barreiro e por aí fora, necessitariam de passaporte para virem trabalhar em Nova Lisboa. Evidentemente, seriam proibidos de ter acesso às praias da Caparica e da Linha. De vez em quando, o Benfica faria uma digressão por Portugal para gáudio dos indígenas.
Nova Lisboa tornar-se-ia numa sociedade próspera e competitiva, ao nível dos países mais evoluídos da Europa. Não teria de preocupar-se com o desenvolvimento do interior e das Ilhas. Não teria que financiar a construção de auto-estradas para Trás-os Montes. Não teria que subsidiar o ensino das crianças de aldeias longínquas. Não teria que tratar das doenças dos alentejanos. Essa inenarrável perda de tempo e de recursos que dá pelo nome de agricultura seria lançada às urtigas. A floresta poderia arder à vontade.
Em suma, esse país modelar povoado quase em exclusivo pela classe alta servida por criadagem portuguesa da província poderia dedicar-se inteiramente e sem estorvos à criação de riqueza.
Só haveria um problema: tenho a impressão de que os "doutores do Porto", como lhes chama o Franco Atirador, não iriam gostar.
Alhos e bogalhos
Fiquei logo a tremer de medo quando um dos blasfemos ameaçou que iria responder à minha sequência de posts sobre Milton Friedman no Chile.
Estes tipos fazem-me lembrar o cão de Pavlov: toca-se-lhes no santinho, e põem-se logo a rosnar. Altamente previsíveis.
Enfim, lá pensaram (ai! ai!) um bocadinho, e o que é que saíu? Isto, ou seja, uma típica mistura de alhos com bogalhos.
Como seria de esperar, a habitual preguiça não lhes permitiu sequer darem-se ao trabalho de lerem o que escrevi. Para quê? Eles já viram tudo, já pensaram em tudo e já sabem tudo.
Eu digo que Friedman teve um comportamenmto vergonhoso no caso do Chile. Que respondem eles? Que o Chile é o país mais desenvolvido da América Latina. Que não faz sentido acabar com o embargo a Cuba. Que o investimento estrangeiro na China é uma coisa boa. Que a Nike faz bem em abrir fábricas no Vietname.
Digam-me vocês se estes tipos são bons da cabeça!
Não sei se vale a pena tentar impor o debate racional num manicómio, mas sempre vos direi duas ou três coisas:
1. O PNB foi inventado para se tentar quantificar a felicidade, pelo menos aquela parte que pode ser atribuida ao desfrute de bens materiais. Julgar que ele a esgota, porém, é asneira da grossa. Para usar um exemplo em que é mais provável que estejamos de acordo: imaginem que, sendo a Arábia Saudita criticada por as mulheres adúlteras serem apedrejadas até à morte, alguém contra-argumentava que, afinal, não podemos esquecer que o produto per capita do país impõe respeito. Topam?
2. Por muito estranho que vos pareça, o Chile já era o país mais rico da América Latina bem antes de vocês terem nascido. Embora não as conheça em detalhe (mas vocês também não), fico muito contente por saber que as políticas económicas aplicadas no país terão tido bons resultados. As mesmas orientações, porém, deram péssimos resultados noutros locais. Querem falar um dia do caso da Nova Zelândia? Estou certo que, com a vossa prosápia, não custa nada.
3. Como não sou fanático, reconheço muitos méritos (e também alguns deméritos) como economista ao Milton Friedman. Pura e simplesmente, não foi disso que falei. Em parte porque o essencial já foi dito por muita gente, em parte porque ainda não tive tempo para alinhavar um comentário a um tempo crítico e justo, ou seja, equilibrado. Esta palavra consta do vosso dicionário?
Estes tipos fazem-me lembrar o cão de Pavlov: toca-se-lhes no santinho, e põem-se logo a rosnar. Altamente previsíveis.
Enfim, lá pensaram (ai! ai!) um bocadinho, e o que é que saíu? Isto, ou seja, uma típica mistura de alhos com bogalhos.
Como seria de esperar, a habitual preguiça não lhes permitiu sequer darem-se ao trabalho de lerem o que escrevi. Para quê? Eles já viram tudo, já pensaram em tudo e já sabem tudo.
Eu digo que Friedman teve um comportamenmto vergonhoso no caso do Chile. Que respondem eles? Que o Chile é o país mais desenvolvido da América Latina. Que não faz sentido acabar com o embargo a Cuba. Que o investimento estrangeiro na China é uma coisa boa. Que a Nike faz bem em abrir fábricas no Vietname.
Digam-me vocês se estes tipos são bons da cabeça!
Não sei se vale a pena tentar impor o debate racional num manicómio, mas sempre vos direi duas ou três coisas:
1. O PNB foi inventado para se tentar quantificar a felicidade, pelo menos aquela parte que pode ser atribuida ao desfrute de bens materiais. Julgar que ele a esgota, porém, é asneira da grossa. Para usar um exemplo em que é mais provável que estejamos de acordo: imaginem que, sendo a Arábia Saudita criticada por as mulheres adúlteras serem apedrejadas até à morte, alguém contra-argumentava que, afinal, não podemos esquecer que o produto per capita do país impõe respeito. Topam?
2. Por muito estranho que vos pareça, o Chile já era o país mais rico da América Latina bem antes de vocês terem nascido. Embora não as conheça em detalhe (mas vocês também não), fico muito contente por saber que as políticas económicas aplicadas no país terão tido bons resultados. As mesmas orientações, porém, deram péssimos resultados noutros locais. Querem falar um dia do caso da Nova Zelândia? Estou certo que, com a vossa prosápia, não custa nada.
3. Como não sou fanático, reconheço muitos méritos (e também alguns deméritos) como economista ao Milton Friedman. Pura e simplesmente, não foi disso que falei. Em parte porque o essencial já foi dito por muita gente, em parte porque ainda não tive tempo para alinhavar um comentário a um tempo crítico e justo, ou seja, equilibrado. Esta palavra consta do vosso dicionário?
E se a escravatura se revelasse o regime economicamente mais eficiente?
Robert W. Fogel, vencedor do Prémio Nobel da Economia em 1993.
Há três anos já escrevi um post sobre o problema muito apropriadamente levantado pelo Lutz.
Pode ser relido aqui. Basicamente, fiz então notar que, segundo Robert W. Fogel, laureado com o Prémio Nobel da Economia em 1993, a escravatura era um regime de trabalho eficiente e rentável.
Assim, segundo este autor, está demonstrado que o crescimento económico e tecnológico é perfeitamente possível, mesmo no interior de uma ordem sócio-económica profundamente imoral.
Era costume ensinar-se nas faculdades de economia que a escravatura terminara porque constituía um entrave ao progresso. Mas isso, pura e simplesmente, não é verdade: a abolição da escravatura resultou da determinação política de muita gente, impulsionada por factores de ordem diversíssima, entre os quais os éticos, para pôr termo à escravatura.
25.11.06
Liberais à antiga (7)
O comportamento de Milton Friedman em relação ao Chile de Pinochet foi vergonhoso. Como explicá-lo?
Algumas pessoas acreditam que se tratou apenas de mais uma manifestação do síndroma de Siracusa, o mesmo que levou Platão a colocar-se ao serviço do tirano que governava aquela cidade para aí instaurar a República perfeita. Muitos intelectuais orgulhosos, incluindo Heidegger, d’Anunzio e Gorki, sucumbiram ao longo dos anos a essa tentação.
Quando se envolveu na política chilena, em meados dos anos 70, Friedman ainda não gozava dos favores de governos de países importantes, como um pouco mais tarde veio a suceder com Margaret Thatcher no Reino Unido e Ronald Reagan nos EUA. A vaidade ter-se-ia, portanto, sobreposto ao mais elementar bom senso.
Pode ser que sim, mas as próprias declarações de Friedman sugerem que não terá sido apenas isso. Em muitos dos seus escritos encontramos insinuada a ideia de que, para ele, a liberdade económica é primordial, a liberdade política secundária, e a democracia um estorvo no caminho da primeira. Quando aos direitos humanos, pura e simplesmente não figuram na sua cartilha.
O que torna evidente que Friedman não era, de facto, um liberal à moda antiga, na linha de Hume, Humboldt ou Stuart Mill. Bem pelo contrário, a sua crença dogmática constitui uma usurpação inaceitável dos conceitos centrais do liberalismo, algo a que infelizmente nos habituámos ao longo das últimas décadas.
Por conseguinte, o título "Liberais à moda antiga" que utilizei na série de posts sobre a intervenção político-económica de Hayek e Friedman no Chile de Pinochet tinha uma intenção irónica que não terá passado desapercebida aos mais assíduos frequentadores deste blogue.
Algumas pessoas acreditam que se tratou apenas de mais uma manifestação do síndroma de Siracusa, o mesmo que levou Platão a colocar-se ao serviço do tirano que governava aquela cidade para aí instaurar a República perfeita. Muitos intelectuais orgulhosos, incluindo Heidegger, d’Anunzio e Gorki, sucumbiram ao longo dos anos a essa tentação.
Quando se envolveu na política chilena, em meados dos anos 70, Friedman ainda não gozava dos favores de governos de países importantes, como um pouco mais tarde veio a suceder com Margaret Thatcher no Reino Unido e Ronald Reagan nos EUA. A vaidade ter-se-ia, portanto, sobreposto ao mais elementar bom senso.
Pode ser que sim, mas as próprias declarações de Friedman sugerem que não terá sido apenas isso. Em muitos dos seus escritos encontramos insinuada a ideia de que, para ele, a liberdade económica é primordial, a liberdade política secundária, e a democracia um estorvo no caminho da primeira. Quando aos direitos humanos, pura e simplesmente não figuram na sua cartilha.
O que torna evidente que Friedman não era, de facto, um liberal à moda antiga, na linha de Hume, Humboldt ou Stuart Mill. Bem pelo contrário, a sua crença dogmática constitui uma usurpação inaceitável dos conceitos centrais do liberalismo, algo a que infelizmente nos habituámos ao longo das últimas décadas.
Por conseguinte, o título "Liberais à moda antiga" que utilizei na série de posts sobre a intervenção político-económica de Hayek e Friedman no Chile de Pinochet tinha uma intenção irónica que não terá passado desapercebida aos mais assíduos frequentadores deste blogue.
Liberais à moda antiga (6)
(Continuação)
Fiquemos por aqui, sim?
Friedman too saw himself in the vanguard. "In every generation," he is quoted in his flattering New York Times obituary, which spares just a sentence on his role in Chile, "there's got to be somebody who goes the whole way, and that's why I believe as I do."
And trailblazer both men were, harbinger of a brave and merciless new world. But if Pinochet's revolution was to spread throughout Latin America and elsewhere, it first had to take hold in the United States. And even as the dictator was "torturing people so prices could be free," as Uruguayan writer Eduardo Galeano once mordantly observed, the insurgency that would come to unite behind Ronald Reagan was gathering steam.
Today, Pinochet is under house arrest for his brand of "shock therapy," and Friedman is dead. But the world they helped usher in survives, in increasingly grotesque form. What was considered extreme in Chile in 1975 has now become the norm in the US today: a society where the market defines the totality of human fulfillment, and a government that tortures in the name of freedom.
Fiquemos por aqui, sim?
Liberais à moda antiga (5)
(Continuação)
(Continua)
Where Friedman made allusions to the superiority of economic freedom over political freedom in his defense of Pinochet, the Chicago group institutionalized such a hierarchy in a 1980 constitution named after Hayek's 1960 treatise The Constitution of Liberty. The new charter enshrined economic liberty and political authoritarianism as complementary qualities. They justified the need of a strong executive such as Pinochet not only to bring about a profound transformation of society but to maintain it until there was a "change in Chilean mentality." Chileans had long been "educated in weakness," said the president of the Central Bank, and a strong hand was needed in order to "educate them in strength." The market itself would provide tutoring: When asked about the social consequences of the high bankruptcy rate that resulted from the shock therapy, Admiral José Toribio Merino replied that "such is the jungle of . . . economic life. A jungle of savage beasts, where he who can kill the one next to him, kills him. That is reality."
But before such a savage nirvana of pure competition and risk could be attained, a dictatorship was needed to force Chileans to accept the values of consumerism, individualism, and passive rather than participatory democracy. "Democracy is not an end in itself," said Pinochet in a 1979 speech written by two of Friedman's disciples, but a conduit to a truly "free society" that protected absolute economic freedom. Friedman hedged on the relationship between capitalism and dictatorship, but his former students were consistent: "A person's actual freedom," said Finance Minister de Castro, "can only be ensured through an authoritarian regime that exercises power by implementing equal rules for everyone." "Public opinion," he admitted, "was very much against [us], so we needed a strong personality to maintain the policy."
(Continua)
24.11.06
Liberais à moda antiga (4)
(Continuação)
(Continua)
Hayek's University of Chicago colleague Milton Friedman got the grief, but it was Hayek who served as the true inspiration for Chile's capitalist crusaders. It was Hayek who depicted Allende's regime as a way station between Chile's postwar welfare state and a hypothetical totalitarian future. Accordingly, the Junta justified its terror as needed not only to prevent Chile from turning into a Stalinist gulag but to sweep away fifty years of tariffs, subsidies, capital controls, labor legislation, and social welfare provisions -- a "half century of errors," according to finance minister Sergio De Castro, that was leading Chile down its own road to serfdom.
"To us, it was a revolution," said government economist Miguel Kast, an Opus Dei member and follower of both Hayek and American Enterprise Institute theologian Michael Novak. The Chicago economists had set out to affect, radically and immediately, a "foundational" conversion of Chilean society, to obliterate its "pseudo-democracy" (prior to 1973, Chile enjoyed one of the most durable constitutional democracies in the Americas).
(Continua)
Liberais à moda antiga (3)
(Continuação)
(Continua)
Friedrich von Hayek, the Austrian émigré and University of Chicago professor whose 1944 Road to Serfdom dared to suggest that state planning would produce not "freedom and prosperity" but "bondage and misery," visited Pinochet's Chile a number of times. He was so impressed that he held a meeting of his famed Société Mont Pélérin there. He even recommended Chile to Thatcher as a model to complete her free-market revolution. The Prime Minister, at the nadir of Chile's 1982 financial collapse, agreed that Chile represented a "remarkable success" but believed that Britain's "democratic institutions and the need for a high degree of consent" make "some of the measures" taken by Pinochet "quite unacceptable."
Like Friedman, Hayek glimpsed in Pinochet the avatar of true freedom, who would rule as a dictator only for a "transitional period," only as long as needed to reverse decades of state regulation. "My personal preference," he told a Chilean interviewer, "leans toward a liberal dictatorship rather than toward a democratic government devoid of liberalism." In a letter to the London Times he defended the junta, reporting that he had "not been able to find a single person even in much maligned Chile who did not agree that personal freedom was much greater under Pinochet than it had been under Allende." Of course, the thousands executed and tens of thousands tortured by Pinochet's regime weren't talking.
(Continua)
Liberais à moda antiga (2)
(Continuação)
(Continua)
While he was in Chile Friedman gave a speech titled "The Fragility of Freedom" where he described the "role in the destruction of a free society that was played by the emergence of the welfare state." Chile's present difficulties, he argued, "were due almost entirely to the forty-year trend toward collectivism, socialism and the welfare state . . . a course that would lead to coercion rather than freedom." The Pinochet regime, he argued, represented a turning point in a protracted campaign, a tearing off of democracy's false husks to reach true freedom's inner core. "The problem is not of recent origin," Friedman wrote in a follow-up letter to Pinochet, but "arises from trends toward socialism that started forty years ago, and reached their logical and terrible climax in the Allende regime." He praised the general for putting Chile back on the "right track" with the "many measures you have already taken to reverse this trend."
(Continua)
23.11.06
Liberais à moda antiga (1)
Através de Brad de Long cheguei a este artigo de Greg Grandin sobre as aventuras de Friedman e Hayek no reino de Pinochet. Muito instrutivo. Ora leiam:
(Continua)
Friedman defended his relationship with Pinochet by saying that if Allende had been allowed to remain in office Chileans would have suffered "the elimination of thousands and perhaps mass starvation . . . torture and unjust imprisonment." But the elimination of thousands, mass hunger, torture and unjust imprisonment were what was taking place in Chile exactly at the moment the Chicago economist was defending his protégé. Allende's downfall came because he refused to betray Chile's long democratic tradition and invoke martial law, yet Friedman nevertheless insisted that the military junta offered "more room for individual initiative and for a private sphere of life" and thus a greater "chance of a return to a democratic society." It was pure boilerplate, but it did give Friedman a chance to rehearse his understanding of the relationship between capitalism and freedom.
(Continua)
Uma semana depois
Uma semana depois, os comentadores continuam a perguntar-se por que se decidiu Cavaco a conceder aquela entrevista naquelas circunstâncias àquele canal e àquela entrevistadora, se não tinha nada para dizer.
Cavaco Silva ainda não descobriu o que deve fazer um Presidente da República. Irá descobri-lo algum dia? A irrelevância e a inconsequência das suas iniciativas desde que tomou posse permitem que se duvide.
A pouco e pouco instala-se no país a sensação de que actualmente não há Presidente.
Ao aparecer, Cavaco quis apenas e só demonstrar que há.
Tê-lo-á conseguido? O tom desajustado da sua intervenção, justamente notado, entre outros, por Pacheco Pereira, confirma que se trata de um homem sem perfil para um cargo não executivo.
Esta necessidade de afirmação não augura nada de bom.
Neste momento, resolveu o problema apoiando o Governo sem qualquer distanciamento, o que, francamente, não é bom.
Algures no futuro afirmar-se-á opondo-se-lhe, o que poderá ser ainda pior.
Não se iludam: como o futuro se encarregará de comprovar, a instabilidade mora em Belém. A insegurança é sempre um perigo, ainda mais no titular do supremo cargo público da República.
Cavaco Silva ainda não descobriu o que deve fazer um Presidente da República. Irá descobri-lo algum dia? A irrelevância e a inconsequência das suas iniciativas desde que tomou posse permitem que se duvide.
A pouco e pouco instala-se no país a sensação de que actualmente não há Presidente.
Ao aparecer, Cavaco quis apenas e só demonstrar que há.
Tê-lo-á conseguido? O tom desajustado da sua intervenção, justamente notado, entre outros, por Pacheco Pereira, confirma que se trata de um homem sem perfil para um cargo não executivo.
Esta necessidade de afirmação não augura nada de bom.
Neste momento, resolveu o problema apoiando o Governo sem qualquer distanciamento, o que, francamente, não é bom.
Algures no futuro afirmar-se-á opondo-se-lhe, o que poderá ser ainda pior.
Não se iludam: como o futuro se encarregará de comprovar, a instabilidade mora em Belém. A insegurança é sempre um perigo, ainda mais no titular do supremo cargo público da República.
Vendam-no depressa
O jogo de ontem em Milão serviu para provar mais uma vez, a quem ainda tivesse dúvidas, que o Sporting não é bem um clube de futebol, embora também não se perceba exactamente o que deseja ser.
Como foi possível perder daquela forma perante um team que exibe a mais patética relação do planeta entre performance desportiva e euros gastos?
A explicação chama-se Nani.
Nani é o símbolo do que está mal no Sporting, mas os adeptos e os comentadores desportivos, em vez de o assobiarem, aplaudem-no. Para agravar as coisas, o Scolari veio agora compará-lo ao Figo.
Está a gozar, evidentemente. Há à face da Terra inúmeros futebolistas tanto ou mais habilidosos do que o Figo - o Nani, por exemplo - mas, de momento, não deve haver nenhum com aquele carácter e aquela personalidade. Como afirmava o Cruyff, não há nenhum que com tanto gosto aceite assumir responsabilidades.
O contrário disto é precisamente o Nani. O Nani gastou o jogo a fintar e a humilhar adversários, para gáudio dos amadores de espectáculos circenses. Apesar disso, nunca criou perigo para a baliza adversária, porque se limitou a fazer centros sem sentido ou a rematar para a bancada.
O que ele quis foi exibir-se para os olheiros, e cumpriu o seu propósito. Só o Sporting não conseguiu o que queria. Mas o que interessa isso, se os adeptos estão orgulhosos por a equipa ter dado show e por poderem atribuir a derrota à infelicidade?
Querem um conselho amigo? Vendam depressa o Nani, enquanto ele não se transforma definitivamente num novo Dominguez. Ao Inter, por exemplo...
Posner sobre Friedman
Eis algumas palavras sábias de Richard Posner acerca do legado intelectual de Milton Friedman:
(...) I find slightly off-putting what I sensed to be a dogmatic streak in Milton Friedman. I think his belief in the superior efficiency of free markets to government as a means of resource allocation, though fruitful and largely correct, was embraced by him as an article of faith and not merely as a hypothesis. I think he considered it almost a personal affront that the Scandinavian nations, particularly Sweden, could achieve and maintain very high levels of economic output despite very high rates of taxation, an enormous public sector, and extensive wealth redistribution resulting in much greater economic equality than in the United States. I don't think his analytic apparatus could explain such an anomaly.
I also think that Friedman, again more as a matter of faith than of science, exaggerated the correlation between economic and political freedom. A country can be highly productive though it has an authoritarian political system, as in China, or democratic and impoverished, as was true for the first half century or so of India's democracy and remains true to a considerable extent, since India remains extremely poor though it has a large and thriving middle class--an expanding island in the sea of misery. What is true is that commercial values are in tension with aristocratic and militaristic values that support authoritarian government, and also that as people become economically independent they are less subservient, and so less willing to submit to control by politicians; and also that they become more concerned with the protection of property rights, which authoritarian government threatens. But Friedman seemed to share Friedrich Hayek's extreme and inaccurate view that socialism of the sort that Britain embraced under the old Labour Party was incompatible with democracy, and I don't think that there is a good theoretical or empirical basis for that view. The Road to Serfdom flunks the test of accuracy of prediction!
I imagine that without the element of faith that I have been stressing, Friedman might have lacked the moral courage to propound his libertarian views in the chilly intellectual and political climate in which he first advanced them. So it should probably be reckoned on balance a good thing, though not to my personal taste. His advocacy of school vouchers, the volunteer army (in the era in which he advocated it--which we are still in), and the negative income tax demonstrates the fruitfulness of his master micreconomic insight that, in general, people know better than government how to manage their lives. But perhaps not always...
19.11.06
18.11.06
17.11.06
Onde estavas no 25 de Novembro?
Uma ou duas semanas antes do 25 de Novembro de 1975 teve lugar um debate no grande anfiteatro da Faculdade de Letras. Na mesa estavam Sottomayor Cardia, o Padre Manuel Antunes, Joana de Barros e este vosso amigo.
Não sei bem qual era o tema. Fosse ele qual fosse, discutiu-se, como por esses dias sempre se discutia, a eminente revolução socialista. Na plateia predominavam simpatizantes comunistas e (como se dizia na altura) seus satélites.
O debate foi muito civlizado, sobretudo tendo em conta a situação política explosiva que se vivia. Nas associações recreativas da Margem Sul e nas assembleias sindicais não era assim.
A dada altura, alguém acusou o PS de desempenhar o papel de Kerensky na Rússia de 1917 - um dos qualificativos mais achincalhantes que naquele momento se podia atribuir a alguém.
Foi então que Sottomayor Cardia se levantou lentamente e respondeu, muito calmo, que teria o maior orgulho em ficar na história como o Kerensky português.
Recordemo-lo pois assim no dia em que faleceu.
Os mistérios da produtividade
Para variar, uma excelente entrevista no Dia D de Luis Cabral, autor de um dos melhores manuais de "Organização Industrial" e investigador de créditos firmados na Stern School of Business de Nova Iorque.
É especialmente interessante o que ele tem para dizer sobre os problemas de produtividade das empresas portuguesas: "A melhor forma de aumentar a produtividade média é melhorar o mecanismo de selecção. O simples facto de retirar de circulação os menos produtivos já vai aumentar muitíssimo a produtividade média." E reforça o seu parecer com alguns exemplos.
Infelizmente, porém, a entrevistadora não explorou suficientemente o assunto, o que me faz mais uma vez pensar que continua a não lhe ser atribuída a importância que merece.
É especialmente interessante o que ele tem para dizer sobre os problemas de produtividade das empresas portuguesas: "A melhor forma de aumentar a produtividade média é melhorar o mecanismo de selecção. O simples facto de retirar de circulação os menos produtivos já vai aumentar muitíssimo a produtividade média." E reforça o seu parecer com alguns exemplos.
Infelizmente, porém, a entrevistadora não explorou suficientemente o assunto, o que me faz mais uma vez pensar que continua a não lhe ser atribuída a importância que merece.
16.11.06
Mensagem
A cordialidade sugerida pela foto é enganadora. Toda a verdade, nesta nova versão do Monstrengo de Fernando Pessoa.
Notícia sem ponta de interesse: Indústria do calçado admite aumentar nível de emprego
Lido na página 24 do Suplemento de Economia do Diário de Notícias de hoje:
"O número de empresas que consideram que o estado de negócios é bom ultrapassou, pela primeira vez desde 2001, o das que pensam que é mau, refere a Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes e Artigos de Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS). Reflectindo o bom momento da indústria, as empresas que admitem aumentar o seu nível de emprego excedem, pela primeira vez em oito anos, as que prevêm a sua redução."
15.11.06
Estou pouco confiante no fim da crise do Público
Quem lê a primeira página de hoje do Público fica com a impressão de que o Banco de Portugal reviu em baixa as suas previsões para o comportamento da economia portuguesa em 2006.
Nada mais falso:
1. O BP mantém a previsão de crescimento de 1,2% do PIB adiantada em Agosto;
2. Sobe de 8,4% para 9% a estimativa de crescimento das exportações;
3. Reduz de 5,7% para 4% a do crescimento das importações;
4. Em resultado de (2) e (3), o défice da balança de transacções correntes desce de 9,4% para 7,6% do PIB;
5. A estimativa de crescimento do consumo privado desce de 1,3% para 1,1%;
6. A do consumo público, de 0,7% para -0,2%;
7. Finalmente, prevê agora uma maior queda do investimento (-3,2%) do que em Agosto (-1,2%).
É preciso ser-se muito tendencioso para não se vislumbrarem as boas notícias. Assim:
1. Não só o crescimento continua a basear-se na exportação, como se consolida a contribuição desse factor para a retoma;
2. Reduz-se claramente o défice da balança de transacções correntes, o indicador sintético mais importante no actual momento da economia portuguesa;
3. Diminui em termos reais o consumo público.
Contra isto, que argumenta o Público? Fundamentalmente, três coisas:
1. O crescimento baseado nas exportações é frágil e incerto, porque depende da evolução da economia europeia. Seria melhor que dependesse de quê? Bem espremido, isto equivale a dizer: as coisas estão bem, mas pode ser que venham a piorar um dia. Muito obrigado pelo esclarecimento!
2. O investimento continua em quebra. E por que haveria ele de aumentar? Após um período de estagnação prolongada, o normal é que as empresas disponham de abundante capacidade excedentária. Quando a procura começa a recuperar é natural que necessitem de mais trabalhadores, mas não de mais equipamentos. Logo, só mais tarde o investimento deverá começar a crescer.
3. A previsão de crescimento do PIB do Banco de Portugal é inferior à do Governo. Há alguma novidade nisso? Pela própria natureza das suas funções, o Banco de Portugal é muito mais prudente nas suas previsões. Nessas condições, se ele prevê que o PIB cresça 1,2% é porque dispõe de dados que lhe asseguram que nunca ficará abaixo desse patamar. Por outras palavras, é praticamente certo que acabará por ser superior.
A interpretação tendenciosa dos resultados económicos é infelizmente a regra na nossa imprensa. Daí até se inventar um título alarmista de primeira página - "Banco de Portugal ainda está pouco confiante no fim da crise" - que engana completamente os leitores quanto ao que se está a passar, vai uma grande distância.
Nada mais falso:
1. O BP mantém a previsão de crescimento de 1,2% do PIB adiantada em Agosto;
2. Sobe de 8,4% para 9% a estimativa de crescimento das exportações;
3. Reduz de 5,7% para 4% a do crescimento das importações;
4. Em resultado de (2) e (3), o défice da balança de transacções correntes desce de 9,4% para 7,6% do PIB;
5. A estimativa de crescimento do consumo privado desce de 1,3% para 1,1%;
6. A do consumo público, de 0,7% para -0,2%;
7. Finalmente, prevê agora uma maior queda do investimento (-3,2%) do que em Agosto (-1,2%).
É preciso ser-se muito tendencioso para não se vislumbrarem as boas notícias. Assim:
1. Não só o crescimento continua a basear-se na exportação, como se consolida a contribuição desse factor para a retoma;
2. Reduz-se claramente o défice da balança de transacções correntes, o indicador sintético mais importante no actual momento da economia portuguesa;
3. Diminui em termos reais o consumo público.
Contra isto, que argumenta o Público? Fundamentalmente, três coisas:
1. O crescimento baseado nas exportações é frágil e incerto, porque depende da evolução da economia europeia. Seria melhor que dependesse de quê? Bem espremido, isto equivale a dizer: as coisas estão bem, mas pode ser que venham a piorar um dia. Muito obrigado pelo esclarecimento!
2. O investimento continua em quebra. E por que haveria ele de aumentar? Após um período de estagnação prolongada, o normal é que as empresas disponham de abundante capacidade excedentária. Quando a procura começa a recuperar é natural que necessitem de mais trabalhadores, mas não de mais equipamentos. Logo, só mais tarde o investimento deverá começar a crescer.
3. A previsão de crescimento do PIB do Banco de Portugal é inferior à do Governo. Há alguma novidade nisso? Pela própria natureza das suas funções, o Banco de Portugal é muito mais prudente nas suas previsões. Nessas condições, se ele prevê que o PIB cresça 1,2% é porque dispõe de dados que lhe asseguram que nunca ficará abaixo desse patamar. Por outras palavras, é praticamente certo que acabará por ser superior.
A interpretação tendenciosa dos resultados económicos é infelizmente a regra na nossa imprensa. Daí até se inventar um título alarmista de primeira página - "Banco de Portugal ainda está pouco confiante no fim da crise" - que engana completamente os leitores quanto ao que se está a passar, vai uma grande distância.
14.11.06
Acto de contrição
Extracto de "Has neo-liberalism failed Mexico?", por Brad de Long:
"We neo-liberals point out that NAFTA did not cause poor infrastructure, high crime, and official corruption. We thus implicitly suggest that Mexicans would be far worse off today without NAFTA and its effects weighing in on the positive side of the scale.
"That neo-liberal story may be true. But it is an excuse. It may not be true. Having witnessed Mexico’s slow growth over the past 15 years, we can no longer repeat the old mantra that the neo-liberal road of NAFTA and associated reforms is clearly and obviously the right one."
Vasco Pulido Valente e a modernização
A época moderna é aquela que continuamente se questiona a si mesma e se propõe como supremo propósito a auto-superação.
A modernização é o movimento que, assentando numa atitude de descontentamento metódico, põe em causa o presente em nome de algo que não existe nem se sabe ainda ao certo o que poderá vir a ser.
A modernidade idolatra o novo como critério valorativo supremo. Não tem outro conteúdo para além desse.
Pode-se achar (ou não) o moderno uma boa ideia. Pode-se achar (ou não) a modernidade um estado de coisas recomendável. Pode-se achar (ou não) o esforço de modernização uma orientação recomendável para os indivíduos e a sociedade.
Mas convém pelo menos que se saiba do que se fala quando se fala de modernização.
Quando, na sua crónica do passado sábado, Vasco Pulido Valente declara que o mero facto de se falar tanto em Portugal de modernização desde o século XVIII prova que o país continua a não ser moderno, ele comete dois erros:
1. No século XVIII ninguém falava de modernização, nem cá nem em parte nenhuma. O conceito de modernização é, digamos assim, moderno: só apareceu no final do século XIX, e ainda assim com um significado algo distinto daquele que hoje lhe damos. Antes disso falava-se de progresso, não de modernização.
2. Como a modernização é uma coisa que, por definição, não tem fim, o facto de se insistir na ideia não pode ser interpretado como sinónimo de fracasso, bem pelo contrário.
Todavia, temos que reconhecer que o prolongado sucesso do cronista Vasco Pulido Valente, conseguido pela repetição década após década da mesma homilia, parece efectivamente confirmar que o país resiste a modernizar-se.
A modernização é o movimento que, assentando numa atitude de descontentamento metódico, põe em causa o presente em nome de algo que não existe nem se sabe ainda ao certo o que poderá vir a ser.
A modernidade idolatra o novo como critério valorativo supremo. Não tem outro conteúdo para além desse.
Pode-se achar (ou não) o moderno uma boa ideia. Pode-se achar (ou não) a modernidade um estado de coisas recomendável. Pode-se achar (ou não) o esforço de modernização uma orientação recomendável para os indivíduos e a sociedade.
Mas convém pelo menos que se saiba do que se fala quando se fala de modernização.
Quando, na sua crónica do passado sábado, Vasco Pulido Valente declara que o mero facto de se falar tanto em Portugal de modernização desde o século XVIII prova que o país continua a não ser moderno, ele comete dois erros:
1. No século XVIII ninguém falava de modernização, nem cá nem em parte nenhuma. O conceito de modernização é, digamos assim, moderno: só apareceu no final do século XIX, e ainda assim com um significado algo distinto daquele que hoje lhe damos. Antes disso falava-se de progresso, não de modernização.
2. Como a modernização é uma coisa que, por definição, não tem fim, o facto de se insistir na ideia não pode ser interpretado como sinónimo de fracasso, bem pelo contrário.
Todavia, temos que reconhecer que o prolongado sucesso do cronista Vasco Pulido Valente, conseguido pela repetição década após década da mesma homilia, parece efectivamente confirmar que o país resiste a modernizar-se.
Revelação
Escreve Santana Lopes nas suas memórias do período em que esteve internado em São Bento:
Ora vejamos. Admitindo como altamente provável que Sá Carneiro, Emídio Guerreiro e Mota Pinto também não terão respondido, e que não fazia sentido telefonar a Durão Barroso, Santana poderia antes dizer que apenas Balsemão e Nogueira lhe deram troco.
"Quando fui eleito Presidente do PSD telefonei aos meus antecessores. Apenas Cavaco e Marcelo não responderam."
Ora vejamos. Admitindo como altamente provável que Sá Carneiro, Emídio Guerreiro e Mota Pinto também não terão respondido, e que não fazia sentido telefonar a Durão Barroso, Santana poderia antes dizer que apenas Balsemão e Nogueira lhe deram troco.
Notícia sem ponta de interesse: o autocarro fantasma
Lido na página 30 do Diário de Notícias de hoje:
"A autarquia de Torres Vedras irá manter o sistema de transportes iniciado há sete meses, apesar de admitir o fracasso da medida. O autocarro que liga o parque periférico ao centro da cidade tem tido uma média de apenas 20 utilizadores por dia."Agora vem a pergunta verdadeiramente difícil: acabar com este autocarro é de esquerda ou é de direita?
11.11.06
Notícias sem ponta de interesse
Lido na página 36 do Público de hoje:
"O saldo [positivo, entenda-se] da Segurança Social mais do que duplicou no primeiro semestre do ano, face ao mesmo período do ano passado, para 893,6 milhões de euros (...) o que traduz um crescimento de 125,4 por cento."Claro que isto não tem significado nenhum, porque daqui a 50 anos a Segurança Social poderá vir a apresentar um saldo negativo.
10.11.06
Do miguelismo texano
"Filhos de uma velha e relha direita que, por cá, tem medo (e ainda algum bom senso) de se assumir, acolheram-se ("liberais", mas à moda europeia da palavra) à sombra do império pentagonal, bizarramente seduzidos por uma espécie de miguelismo texano, visionário de um mundo a preto-e-branco soprado lá do alto a alguns eleitos (sabe-se lá como...), a quem o seu próprio país acaba de dar, embora tardiamente, a resposta apropriada."
E ainda:
"E por aí continuam a dar aulas de direita modernaça em escolecas universitárias para filhos-família dos "tios", com um proselitismo digno dos cursos para comandantes-de-castelo da antiga Mocidade (agora, sim, já podem ler Saramago)."
A imagem é perfeita: eu sempre imaginei que o Paulo Portas haveria de ficar um assombro com a farda da Mocidade Portuguesa.
O resto deste post definitivo e insuperável sobre os bushistas lusos pode ser lido no Espírito de Xabregas. Sob o título "Parochial Cons".
E ainda:
"E por aí continuam a dar aulas de direita modernaça em escolecas universitárias para filhos-família dos "tios", com um proselitismo digno dos cursos para comandantes-de-castelo da antiga Mocidade (agora, sim, já podem ler Saramago)."
A imagem é perfeita: eu sempre imaginei que o Paulo Portas haveria de ficar um assombro com a farda da Mocidade Portuguesa.
O resto deste post definitivo e insuperável sobre os bushistas lusos pode ser lido no Espírito de Xabregas. Sob o título "Parochial Cons".
Por outro lado...
Percebo. Mas também poderia ser assim: É por a América ser mais democrática que a Europa, mas também muito mais dada ao autoritarismo, que a sua política é infinitamente mais interessante que a europeia.
Cá vamos indo
Não só sou de raciocínio lento, como ainda por cima orgulho-me disso. Ainda irei a tempo de dizer qualquer coisa sobre as eleições nos EUA?
Muita gente continua a teimar em não perceber que George W. Bush não é um republicano como os outros.
O caso não é apenas que ele tenha governado a economia no exclusivo interesse dos ricos, tornado a Casa Branca num sítio onde principalmente se congeminam negócios e cometido erros graves de política internacional - o que já seria suficientemente mau.
Trata-se de alguém a quem não repugna roer nos direitos e garantias fundamentais, que não revela a mínima consideração pela vida humana e que fala directamente com Deus.
É possível que a derrota republicana não provoque automaticamente alterações de fundo na política externa norte-americana.
Mas - e isto é o mais importante - quebrou-se uma dinâmica extremista que nos levava a todos não se sabe bem para onde, e abriu-se de novo espaço à moderação, esse bem precioso que só valorizamos plenamente quando desaparece da vida política.
E isso é muito.
8.11.06
Tudo bem?
O meu amigo Jayme Kopke surpreendeu-se muito quando, ao chegar a Portugal vindo do Brasil , recebia as mais das vezes como resposta à trivial saudação: "Como vai?" desabafos do género: "Menos mal" ou "Nunca pior". Uma vez por outra, notava ele, lá aparecia algum optimista fanático capaz de reagir com um: "Cá vamos andando".
É claro que ele reconheceu imediatamente como absolutamente desadequada - por susceptível de ser considerada provocatória - a mais usual saudação brasileira: "Tudo bem?"
"Tudo bem? Tudo bem o quê? Aonde quer chegar com essa insinuação? Como é possível alguém assegurar que está tudo bem? Só um tolo pode pensar assim. Às vezes parece que está tudo bem, mas depois, num instante, fica tudo estragado. Não podemos esquecermo-nos de que a vida é uma história que acaba sempre mal."
Esta pérola da sabedoria popular é expressa de forma lapidar na conhecida frase: "Ninguém diga que está bem."
A felicidade só pode resultar de inconsciência ou má-fé. Qualquer pessoa sensata sabe que as coisas estão mal e tendem naturalmente a piorar. Para quê iludirmo-nos?
É claro que ele reconheceu imediatamente como absolutamente desadequada - por susceptível de ser considerada provocatória - a mais usual saudação brasileira: "Tudo bem?"
"Tudo bem? Tudo bem o quê? Aonde quer chegar com essa insinuação? Como é possível alguém assegurar que está tudo bem? Só um tolo pode pensar assim. Às vezes parece que está tudo bem, mas depois, num instante, fica tudo estragado. Não podemos esquecermo-nos de que a vida é uma história que acaba sempre mal."
Esta pérola da sabedoria popular é expressa de forma lapidar na conhecida frase: "Ninguém diga que está bem."
A felicidade só pode resultar de inconsciência ou má-fé. Qualquer pessoa sensata sabe que as coisas estão mal e tendem naturalmente a piorar. Para quê iludirmo-nos?
7.11.06
Notícia sem ponta de interesse: a piscina está meio cheia
Paulo Gorjão sugere que, tendo em conta as previsões da UE hoje conhecidas, eu terei embandeirado em arco antes de tempo com alguns indicadores conjunturais favoráveis.
Não creio que tenha razão. Em primeiro lugar, porque eu jamais embandeirei em arco. Limitei-me a sublinhar os factos. Em segundo lugar, porque as previsões da UE não contrariam em nada a expectativa de continuação da retoma económica.
Eu explico-me:
1. Fala-se usualmente de crise quando o crescimento do produto se reduz fortemente e o desemprego aumenta. (Quando o produto cai durante dois trimestres consecutivos fala-se de recessão.) É evidente que, com o crescimento do produto a consolidar-se e o desemprego a diminuir ao longo do ano, a crise económica acabou, a menos que se queira adoptar uma definição muito peculiar de crise económica.
2. Faço desde já notar que essa evolução não é mérito do governo, mas sim das empresas, pois são elas os principais agentes do desenvolvimento. Aquilo que os governos podem fazer para estimular o crescimento de um país só tem efeitos significativos a muito longo prazo.
3. Dizer isto não implica negar que permanecem problemas muito graves, designadamente dois: a) o enorme desequilíbrio da balança de transacções correntes, não compensado por um afluxo de investimento directo estrangeiro; b) o défice das contas públicas. Um e outro implicam o aumento descontrolado da dívida externa.
4. É por isso que o termo da crise económica não deverá traduzir-se tão cedo em políticas orçamentais expansionistas. Sei que isto não é fácil de explicar ao comum dos cidadãos, mas não creio que se deva mentir-lhes para tornar a política económica do governo mais aceitável.
5. O ministro Manuel Pinho pode ser criticado por a sua vistosa declaração se prestar a mal-entendidos e, designadamente, por criar dificuldades ao governo no momento ele procura justificar a necessidade de persistir numa política de austeridade. Mas não por ser falsa, porque não o é.
6. Alguns pretendem que é absurdo falar-se de fim da crise enquanto houver fábricas a fechar. É difícil encontrar palavras para qualificar uma tal afirmação. Segundo esse critério estaremos sempre em crise desde que algo corra mal ou, pelo menos, não corra inteiramente bem. Ora isso não é sério.
7. Relativamente às previsões da União Europeia, é preciso recordar três coisas. Em primeiro lugar, tendo elas subavaliado sistematicamente o desempenho da economia portuguesa nos últimos anos, a verdadeira notícia é que acabam de revê-las em alta. Em segundo lugar, as previsões hoje divulgadas não põem em dúvida a melhoria continuada da situação económica portuguesa em 2007. Em terceiro lugar, e isto é o mais importante, não há nenhuma forma científica de fazer previsões económicas, pelo que se trata apenas de mais uma opinião - certamente respeitável, mas apenas uma opinião.
8. O que me parece altamente criticável é a forma tendenciosa - ou será apenas estúpida? - como os nossos media sistematicamente destacam qualquer má notícia (mesmo que só na aparência) e desvalorizam ou ocultam (como nos casos que referi) qualquer boa nova. Se algum indicador piora, trata-se decerto de uma tendência de fundo destinada a perdurar nas próximas décadas. Se alguma coisa parece arribar, há-de haver qualquer situação particular que autorize a desvalorização do facto.
9. Qualquer pessoa, mesmo que não versada em teoria económica, entende que a criação de um ambiente de injustificada descrença só contribui para piorar as coisas, designadamente na medida em que trava as iniciativas empresariais e inibe o investimento.
10. Sobre a magnitude da tarefa que recai sobre o governo em 2007 não cabe a mínima dúvida. Mas não vejo nenhuma razão séria para apostar que ele vai falhar. Pelo contrário, a avaliar pelo que fez até agora.
Não creio que tenha razão. Em primeiro lugar, porque eu jamais embandeirei em arco. Limitei-me a sublinhar os factos. Em segundo lugar, porque as previsões da UE não contrariam em nada a expectativa de continuação da retoma económica.
Eu explico-me:
1. Fala-se usualmente de crise quando o crescimento do produto se reduz fortemente e o desemprego aumenta. (Quando o produto cai durante dois trimestres consecutivos fala-se de recessão.) É evidente que, com o crescimento do produto a consolidar-se e o desemprego a diminuir ao longo do ano, a crise económica acabou, a menos que se queira adoptar uma definição muito peculiar de crise económica.
2. Faço desde já notar que essa evolução não é mérito do governo, mas sim das empresas, pois são elas os principais agentes do desenvolvimento. Aquilo que os governos podem fazer para estimular o crescimento de um país só tem efeitos significativos a muito longo prazo.
3. Dizer isto não implica negar que permanecem problemas muito graves, designadamente dois: a) o enorme desequilíbrio da balança de transacções correntes, não compensado por um afluxo de investimento directo estrangeiro; b) o défice das contas públicas. Um e outro implicam o aumento descontrolado da dívida externa.
4. É por isso que o termo da crise económica não deverá traduzir-se tão cedo em políticas orçamentais expansionistas. Sei que isto não é fácil de explicar ao comum dos cidadãos, mas não creio que se deva mentir-lhes para tornar a política económica do governo mais aceitável.
5. O ministro Manuel Pinho pode ser criticado por a sua vistosa declaração se prestar a mal-entendidos e, designadamente, por criar dificuldades ao governo no momento ele procura justificar a necessidade de persistir numa política de austeridade. Mas não por ser falsa, porque não o é.
6. Alguns pretendem que é absurdo falar-se de fim da crise enquanto houver fábricas a fechar. É difícil encontrar palavras para qualificar uma tal afirmação. Segundo esse critério estaremos sempre em crise desde que algo corra mal ou, pelo menos, não corra inteiramente bem. Ora isso não é sério.
7. Relativamente às previsões da União Europeia, é preciso recordar três coisas. Em primeiro lugar, tendo elas subavaliado sistematicamente o desempenho da economia portuguesa nos últimos anos, a verdadeira notícia é que acabam de revê-las em alta. Em segundo lugar, as previsões hoje divulgadas não põem em dúvida a melhoria continuada da situação económica portuguesa em 2007. Em terceiro lugar, e isto é o mais importante, não há nenhuma forma científica de fazer previsões económicas, pelo que se trata apenas de mais uma opinião - certamente respeitável, mas apenas uma opinião.
8. O que me parece altamente criticável é a forma tendenciosa - ou será apenas estúpida? - como os nossos media sistematicamente destacam qualquer má notícia (mesmo que só na aparência) e desvalorizam ou ocultam (como nos casos que referi) qualquer boa nova. Se algum indicador piora, trata-se decerto de uma tendência de fundo destinada a perdurar nas próximas décadas. Se alguma coisa parece arribar, há-de haver qualquer situação particular que autorize a desvalorização do facto.
9. Qualquer pessoa, mesmo que não versada em teoria económica, entende que a criação de um ambiente de injustificada descrença só contribui para piorar as coisas, designadamente na medida em que trava as iniciativas empresariais e inibe o investimento.
10. Sobre a magnitude da tarefa que recai sobre o governo em 2007 não cabe a mínima dúvida. Mas não vejo nenhuma razão séria para apostar que ele vai falhar. Pelo contrário, a avaliar pelo que fez até agora.
5.11.06
Ámen (2)
"Todas as justuificações anteriores, ao longo da História, pressupunham uma verdade última na democracia - a nação, Deus, a História, o princípio de utilidade. Hoje, a minha ideia é que o ideal de democracia contém muita arrogância e é preciso torná-lo mais humilde. Se pudermos democratizar o ideal da democracia, veremos que a democracia é superior, é universal, porque é um modo de vida que permite a monitorização permanente do exercício do poder, a interrogação permanente de quem somos, a permanente possibilidade de encontrarmos um sentido para nós próprios neste mundo."
(John Keane, Público, 5.11.06)
(John Keane, Público, 5.11.06)
Ámen (1)
«[João Cravinho] mostrou-se convicto que o fenómeno [da corrupção] não é hoje um problema restrito a "um pequeno grupo de pessoas que vão cometendo alguns desvios nesta matéria", mas um "problema de sistema" que foi crescendo com a passagem para a democracia, num processo que "favoreceu o tráfico de influências, a colocação de pessoas em pontos-chave do sistema e a fidelização de clientelas a vários partidos". O resultado é a "captura do Estado", primeiro por grupos isolados, mas com o tempo através mesmo da "partilha de influência, entre grupos, de certos sectores" da administração. (...) Existe hoje "uma corrosão da democracia que, se nada for feito, vai desenvolver-se e profundar-se", até chegarmos a uma "italianização da vida pública portuguesa".»
(João Cravinho, Público, 5.11.06)
(João Cravinho, Público, 5.11.06)
Subscrever:
Mensagens (Atom)