O esplendor de Portugal. Pergunta-se Paulo Varela Gomes porque é o património artístico português tão clara e abissalmente inferior ao espanhol, uma evidência que eu, como ele, dou por indiscutível.
Há uma explicação fundamental, a meu ver também inquestionável, mas que a forma como a história do nosso país é usualmente ensinada tende a obscurecer: o território hoje chamado Portugal sempre foi muito mais atrasado do que aqueles que compõem as Espanhas. Creio que isso já era flagrante no tempo do Império Romano e, mais tarde, durante a presença muçulmana. Se quisermos ir mais atrás, o Noroeste peninsular foi, a par das Ilhas Britânicas e da Escandinávia, o último local onde a agricultura chegou, ainda em plena pré-história.
Há razões geográficas para isso. A Europa mediterrânica foi durante milénios o centro da civilização por estas bandas do mundo. Ora a Espanha é no essencial um país mediterrânico, e Portugal não. Um indício importante: vários imperadores romanos foram nados e criados na Hispânia do lado de lá; nenhum na do lado de cá.
Com a Idade Média, o centro da Europa deslocou-se para o Norte à medida que as florestas foram sendo desbravadas e transformadas em terrenos de cultivo. Daí o crescimento demográfico e a crescente importância económica da actual Alemanha. Mas Portugal é uma região completamente excêntrica em relação às novas rotas comerciais que ligaram a Europa do Sul à do Norte e que fizeram a prosperidade da França.
Outro equívoco frequente consiste em supor que houve uma altura da sua história, a época dos Descobrimentos, em que Portugal esteve entre os países mais desenvolvidos. Creio que isto é falso: todos os relatos da época mostram que Portugal continuou a ser, em comparação com os restantes países europeus, uma região extremamente pobre. A verdade é que, a dada altura, choveu aqui dinheiro; mas, na ausência de diversas condições, o país não se desenvolveu muito. Isto consciente de que este ponto mereceria ser muito elaborado mas, para já, tenho que ficar por aqui.
Os portugueses da minha geração têm muito a ideia de que só nas últimas décadas é que a Espanha se destacou de Portugal porque, quando íam lá nos anos cinquenta, viam, sobretudo na Andaluzia e em Castela, uma extraordinária miséria ainda resultante do retrocesso provocado pela Guerra Civil. Tratava-se de uma ilusão de óptica. A Espanha sempre foi muito mais rica do que Portugal. E, embora seja chato dizer-se isto, a verdade é que a cultura normalmente vai atrás do dinheiro.
Outra coisa que se ignora é que, ao longo de toda a história, a época em que mais próximos estivemos da Espanha é, precisamente a actualidade. Mas, ainda assim, a grande distância, sobretudo no que respeita à riqueza acumulada.
Este progresso relativo ocorreu possivelmente porque nunca como agora nos integrámos tanto no movimento geral económico e cultural da Espanha e da Europa em geral, o que só nos pode fazer bem. Ainda assim, alguns factores estruturais continuam a puxar-nos para trás. O mais importante é a nossa baixíssima taxa de urbanização em comparação com a Espanha, de que resultam a estreiteza de vistas e a mesquinhez tipicamente portuguesas. Só este assunto daria para um post bem longo.
O atraso nacional em tudo o resto (cultura, ciência, artes, enfim, civilização no seu verdadeiro sentido) deriva daqui. Esta explicação tem, a meu ver, duas vantagens: por um lado, não induz desespero; por outro, não recomenda resignação.
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