17.9.04

Acerca do nacional-achadismo

Há uns bons vinte anos que António Barreto debita nos jornais a sua interminável lenga-lenga. É um bocado como as telenovelas: a gente passa três meses sem assistir a nenhum episódio, mas depois, quando retoma o contacto, verifica que não perdeu nada, porque a história continua a marcar passo.

Agora, deu em moer-nos o juízo há uma semana no público com uma catilinária cujo propósito não se vislumbra. Mas eis que hoje, de repente, sai-se com esta a propósito dos problemas do ensino da Matemática: «Eu não sei qual é a resposta. Só sei que está mal e que está errado.» Ora, boa noite. Se não sabe a resposta, nem tem nada para dizer, porque é que insiste em dizê-lo? Se ao menos o cantasse...

Um dos grandes problemas nacionais é o achadismo. Toda a gente se sente no direito de achar qualquer coisa e de maçar os compatriotas com as suas opiniões. Uma das características distintivas dos nossos media é que os comentaristas raramente se atêm aos domínios em que desfrutam de alguma competência (se é que a têm), coisa impensável nos países civilizados. É assim que temos que suportar Prado Coelho a discutir a globalização, Sousa Tavares a criticar a regionalização, Marcello a analisar a selecção nacional de futebol, Pulido Valente a debitar sobre política económica, e por aí fora. E estes, note-se bem, ainda são os melhores...

Entre nós, empresa cujo negócio não assenta nalguma espécie de renda de situação resultante do acesso privilegiado a algum activo escasso, nunca passa da cepa torta. Nos jornais esse bem escasso é o centímetro quadrado, na rádio ou na tv é o segundo, que são disputados com ferocidade canina, porque os achadores (ou serão achadiços?) adoptam a táctica de não deixar jogar o adversário, mantendo-o afastado da bola.

O importante é que todos os espaços disponíveis sejam ocupados por malta amiga - entenda-se: pessoal da mesma seita -, de forma a impedir que opiniões diversas possam exprimir-se. Não sei se já repararam que só em Agosto, quando os achadores profissionais se deslocam para outras pastagens, sobra algum espaço nos jornais para termos acesso às opiniões de gente que de facto entende o que de facto está em causa nos incêndios, na interrupção voluntária da gravidez ou na descentralização administrativa do país.

Silly season? Pelo contrário, é a única estação em que tomamos conhecimento de que há vida para além do cinzento país oficial.

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