4.9.04

Uma conspiração maçónica

- Eu gosto de os ouvir - disse o padre. - Falam assim, mas, em chegando a ocasião, vão todos votar nele como carneiros.

O Brasileiro encolheu os ombros e sorriu, como confirmando o dito..

- Pois havemos de ver o que será! - berrou o Sr. Joãozinho. - Isso é consoante cá umas coisas.

- A falar a verdade - disse o Pertunhas - não tem pago muito bem ao círculo o nomeá-lo há tantos anos seu deputado; só essa teima agora em querer obrigar o povo a enterrar-se no cemitério!

- Essa, a falar verdade! - disse um lavrador.

- Quero ver se lá me hão-de enterrar a mim! - disse ameaçadoramente o Sr. Joãozinho, como se esperasse, ainda depois da morte, impor as suas vontades à força de murros e de pragas.

- Deram-lhe para dizer que fazia mal enterrar nas igrejas. É moda e acabou-se. Dantes enterrava-se lá toda a gente, e não havia mais doenças do que agora - isto dizia o padre.

- Os Romanos tinham as suas catacumbas - ponderou o mestre da latinidade, forçando as suas reminiscências romanas.

- Vamos - ponderou o Brasileiro, como quem vira pretexto de fazer novo discurso e como homem que punha acima dos despeitos a verdade científica. - O enterrar nas igrejas é anti-higiénico; porque os químicos sabem que... o ar que não é puro... é mau para a saúde pública. Ora os cadáveres... em putrefacção produzem uns vapores que corrompem o ar... Há uns insectozinhos invisíveis que a gente respira... e vão para a massa do sangue e corrompem-na... e o resultado é a febre... porque a febre são os humores a ferver... como o vinho no lagar... e, se saem, muito bem; e, se não saem, ficam retidos e azedam o corpo todo.

A teoria fisiológico-patológica foi recebida com atenção igual à que merecera a económica.

- Tudo isso será assim - disse o padre - mas o conselheiro faz aquilo por instigações das lojas maçónicas e dos pedreiros livres.

(Júlio Dinis, «A Morgadinha dos Canaviais»)

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