Na viragem do século o tradicional padrão de especialização da economia portuguesa sofreu um abalo final com o início da recuperação das economias do Leste após uma década de colapso e a penetração dos produtos chineses no mercado europeu.
Não houve nisso nada de imprevisível, mas, como o Estado português optara por tentar adiar a agonia de sectores de actividade sem futuro, a reacção foi tardia e demorada.
De modo que estamos todos em Portugal há uns oito anos a assistir pacientemente à morte de uma economia e à afirmação de outra.
Não por mérito dos governos - como se prova pelo facto de tudo ter sucedido numa situação de quase total paralisia do Ministério da Economia - mas em resultado das iniciativas de inúmeras empresas, o essencial da transformação está agora completado, de tal modo que as indústrias de têxteis e calçados foram já substituídas pelas de máquinas e equipamentos no primeiro lugar das actividades exportadoras.
Isso permite-nos afirmar que, mau-grado as aparências, e independentemente das incidências conjunturais, a economia portuguesa está hoje mais forte do que nunca. Para terem uma ideia mais adequada do que está a suceder recomendo o dossier de hoje do DN dedicado ao surto de empreendedorismo nas indústrias de base biotecnológica.
31.12.07
Quem irão eles financiar?
Resumindo a coisa ao essencial, o que se passou na última década na economia mundial foi o seguinte:
1. Alguns países do Terceiro Mundo (com a China e os produtores de petróleo à cabeça) estavam ansiosos por emprestar os excedentes financeiros gerados pelas suas economias.
2. Os EUA estavam ansiosos por endividarem-se.
Juntando-se a fome com a vontade de comer tivemos assim na América uma bolha económica prolongada que os especuladores se empenharam em fazer crer eterna. Aos financiadores convinha-lhes também acreditar nisso na ilusão de que as suas exportações beneficiariam de uma procura em perpétua expansão.
A crise do sub-prime foi o sinal de que, tendo o último tolo pedido emprestado o último dólar, a capacidade de endividamento da América se esgotara.
De modo que, agora, as coisas põem-se nestes termos:
1. Os países excedentários hesitaram por muito tempo em deixar cair o dólar, porque isso implicaria a desvalorização dos seus activos naquela moeda. Mas renderam-se por fim ao inevitável, e procuram agora aplicações alternativas para o seu dinheiro.
2. Porém, a menos que o crescimento europeu acelere, não haverá mercado nem para a indústria chinesa nem para o petróleo russo, iraniano e venezuelano. A prazo, os excedentes financeiros no passado gerados por esses países secarão.
Logo, a questão é esta: para onde irão agora os imensos capitais que durante anos fluiram para os EUA?
Convém notar que os movimentos de capitais das últimas duas décadas foram uma aberração em termos históricos. Usualmente - era a isso que se chamava imperialismo - o capital deslocava-se dos países ricos para os países pobres; no passado recente passou-se o contrário, com as multidões miseráveis a financiarem o consumo da maior potência económica do mundo.
Os movimentos de capitais sempre tiveram consequências políticas. Agora terão também motivações políticas directas, dadas as ambições de afirmação internacional da China, da Rússia, do Irão e da Venezuela e dados os sistemas de poder político-económico vigentes nesses países.
Poucas vezes o futuro da economia mundial esteve tão dependente de decisões directamente inspiradas em considerações de política internacional e em alianças geo-estratégicas à escala mundial.
1. Alguns países do Terceiro Mundo (com a China e os produtores de petróleo à cabeça) estavam ansiosos por emprestar os excedentes financeiros gerados pelas suas economias.
2. Os EUA estavam ansiosos por endividarem-se.
Juntando-se a fome com a vontade de comer tivemos assim na América uma bolha económica prolongada que os especuladores se empenharam em fazer crer eterna. Aos financiadores convinha-lhes também acreditar nisso na ilusão de que as suas exportações beneficiariam de uma procura em perpétua expansão.
A crise do sub-prime foi o sinal de que, tendo o último tolo pedido emprestado o último dólar, a capacidade de endividamento da América se esgotara.
De modo que, agora, as coisas põem-se nestes termos:
1. Os países excedentários hesitaram por muito tempo em deixar cair o dólar, porque isso implicaria a desvalorização dos seus activos naquela moeda. Mas renderam-se por fim ao inevitável, e procuram agora aplicações alternativas para o seu dinheiro.
2. Porém, a menos que o crescimento europeu acelere, não haverá mercado nem para a indústria chinesa nem para o petróleo russo, iraniano e venezuelano. A prazo, os excedentes financeiros no passado gerados por esses países secarão.
Logo, a questão é esta: para onde irão agora os imensos capitais que durante anos fluiram para os EUA?
Convém notar que os movimentos de capitais das últimas duas décadas foram uma aberração em termos históricos. Usualmente - era a isso que se chamava imperialismo - o capital deslocava-se dos países ricos para os países pobres; no passado recente passou-se o contrário, com as multidões miseráveis a financiarem o consumo da maior potência económica do mundo.
Os movimentos de capitais sempre tiveram consequências políticas. Agora terão também motivações políticas directas, dadas as ambições de afirmação internacional da China, da Rússia, do Irão e da Venezuela e dados os sistemas de poder político-económico vigentes nesses países.
Poucas vezes o futuro da economia mundial esteve tão dependente de decisões directamente inspiradas em considerações de política internacional e em alianças geo-estratégicas à escala mundial.
Correr duas vezes mais depressa
João César das Neves contesta no DN de hoje a ideia segundo a qual "a economia é a força mais poderosa do mundo":
A verdade é que, do modo que as nossas economias estão hoje arranjadas, ninguém pode esperar ter o mínimo para viver se não esfalfar para ganhar cada vez mais.
Isso mesmo nos é recordado todos os dias: o desemprego só poderá diminuir se a economia crescer pelo menos 2% ao ano; mas, para que isso suceda, é preciso que a produtividade e a população activa aumentem sem parar.
Como lembrava a Rainha de Copas imaginada por Lewis Carroll: "para ficar no mesmo sítio é preciso correr duas vezes mais depressa".
Um princípio básico da economia, a "lei da utilidade marginal decrescente", diz que quanto mais temos, menos o valorizamos. Só a escassez faz subir o valor. Como vivemos a maior prosperidade de sempre, a própria ciência económica ensina que seria de esperar menor preocupação com o dinheiro. Afinal, quem tem fome é que vive obcecado com isso. Como pode este tempo ser mais, e não menos, dirigido pela economia?Esta é, sem dúvida, uma pergunta pertinente, mas não me parece que a resposta que César das Neves ensaia esclareça inteiramente o problema.
A verdade é que, do modo que as nossas economias estão hoje arranjadas, ninguém pode esperar ter o mínimo para viver se não esfalfar para ganhar cada vez mais.
Isso mesmo nos é recordado todos os dias: o desemprego só poderá diminuir se a economia crescer pelo menos 2% ao ano; mas, para que isso suceda, é preciso que a produtividade e a população activa aumentem sem parar.
Como lembrava a Rainha de Copas imaginada por Lewis Carroll: "para ficar no mesmo sítio é preciso correr duas vezes mais depressa".
Boas notícias para Portugal
Segundo o Diário de Notícias, José Milhazes assevera de Moscovo que, afinal, Rasputine não foi envenenado com vinho da Madeira. A pouco e pouco vamos ficando com uma imagem mais compostinha lá fora.
Ameaças para 2008
Parece confirmar-se que a TAP vai autorizar o uso dos telemóveis a bordo dos seus aviões.
30.12.07
Superdotada do Ano 2007
Foi revelado que Paris Hilton tem um QI de 132 (muito próximo dos 150 de Einstein), o que vem mais uma vez confirmar a tese de James Watson da superioridade da raça branca.
29.12.07
28.12.07
À saúde do BCP
Aceito que se bata no ceguinho quando ele é um safado matreiro que não hesitará em rachar-nos a cabeça com a bengala se nos apanhar distraídos.
Não sendo esse o caso, incomoda-me ver tanta gente que durante anos adulou o fundador do BCP colaborar na sua diabolização quando sabe que já nenhuma benesse poderá esperar daquelas bandas. Ai dos vencidos|
É, também por isso, este o momento ideal para dizer que admiro Jardim Gonçalves e o modo como em pouco mais de uma década pôs de pé o maior banco privado português e revolucionou o nosso sistema financeiro.
Sinto a obrigação de afirmar isto, em primeiro lugar, porque, ao longo de uma meia dúzia de anos, coincidentes com o período heróico do banco, uma parte substancial do meu ordenado foi indirectamente pago pelo BCP, e eu tenho por princípio não morder a mão que me alimentou.
Mas digo-o também porque é bom não esquecer que o banco de Jardim Gonçalves foi durante muito tempo um caso aparte de profissionalismo e capacidade empresarial num país em que eles tanto escasseiam.
Quem, como eu, trabalha na prestação de serviços de marketing às empresas, pergunta-se frequentemente se ficará algum rasto daquilo que anda a fazer. Na esmagadora maioria dos casos, a resposta é um enfático e melancólico não; mas recordarei sempre com orgulho e satisfação aqueles anos em que dei a minha modesta contribuição para ajudar o BCP a trucidar a concorrência, de forma metódica e implacável, introduzindo sucessivas inovações que facilitaram a vida a todos nós.
Para quem já não se lembra: foi preciso aparecer a NovaRede para toda a gente ter direito a usar um cartão Multibanco no seu dia a dia sem discriminações nem complicações burocráticas.
Eu sei que, com o tempo, o BCP tornou-se num banco como os outros. É natural e compreensível: também eu, com a idade, me tornei mais como os outros.
Acredito também que deverão ter fundamento algumas das acusações de irregularidades que agora são dirigidas contra a administração do BCP, e, muito embora eu permaneça disposto a pôr as mãos no fogo por alguns dos actuais suspeitos, espero que seja punido quem deve ser punido.
Seria porém lamentável que a opinião pública se resignasse a deitar fora o bébé com a água do banho. Jardim Gonçalves não era um anjo, o BCP nunca foi perfeito e as circunstâncias políticas ajudaram muito ao seu êxito. Tudo isso e muito mais é verdade. Ainda assim, só temos todos que esperar que o seu exemplo faça escola.
Este é um daqueles casos em que o respeitinho é muito lindo.
Não sendo esse o caso, incomoda-me ver tanta gente que durante anos adulou o fundador do BCP colaborar na sua diabolização quando sabe que já nenhuma benesse poderá esperar daquelas bandas. Ai dos vencidos|
É, também por isso, este o momento ideal para dizer que admiro Jardim Gonçalves e o modo como em pouco mais de uma década pôs de pé o maior banco privado português e revolucionou o nosso sistema financeiro.
Sinto a obrigação de afirmar isto, em primeiro lugar, porque, ao longo de uma meia dúzia de anos, coincidentes com o período heróico do banco, uma parte substancial do meu ordenado foi indirectamente pago pelo BCP, e eu tenho por princípio não morder a mão que me alimentou.
Mas digo-o também porque é bom não esquecer que o banco de Jardim Gonçalves foi durante muito tempo um caso aparte de profissionalismo e capacidade empresarial num país em que eles tanto escasseiam.
Quem, como eu, trabalha na prestação de serviços de marketing às empresas, pergunta-se frequentemente se ficará algum rasto daquilo que anda a fazer. Na esmagadora maioria dos casos, a resposta é um enfático e melancólico não; mas recordarei sempre com orgulho e satisfação aqueles anos em que dei a minha modesta contribuição para ajudar o BCP a trucidar a concorrência, de forma metódica e implacável, introduzindo sucessivas inovações que facilitaram a vida a todos nós.
Para quem já não se lembra: foi preciso aparecer a NovaRede para toda a gente ter direito a usar um cartão Multibanco no seu dia a dia sem discriminações nem complicações burocráticas.
Eu sei que, com o tempo, o BCP tornou-se num banco como os outros. É natural e compreensível: também eu, com a idade, me tornei mais como os outros.
Acredito também que deverão ter fundamento algumas das acusações de irregularidades que agora são dirigidas contra a administração do BCP, e, muito embora eu permaneça disposto a pôr as mãos no fogo por alguns dos actuais suspeitos, espero que seja punido quem deve ser punido.
Seria porém lamentável que a opinião pública se resignasse a deitar fora o bébé com a água do banho. Jardim Gonçalves não era um anjo, o BCP nunca foi perfeito e as circunstâncias políticas ajudaram muito ao seu êxito. Tudo isso e muito mais é verdade. Ainda assim, só temos todos que esperar que o seu exemplo faça escola.
Este é um daqueles casos em que o respeitinho é muito lindo.
25.12.07
22.12.07
O hipotético ímpeto empresarial do Dr. Miranda
Se o economista de proveta João Miranda decidisse criar uma empresa - que Deus o defenda! - seria forçado a contratar logo à cabeça um consultor para ajudá-lo a determinar o salário de equilíbrio para os diversos tipos de trabalhadores de que iria necessitar. Em seguida, pedir-lhe-ia para estimar também o produto marginal de cada tipo de trabalho para compará-lo com o respectivo custo.
Alguns consultores conseguem, com algum esforço, saber que salários são correntemente pagos, mas a descoberta do salário de equilíbrio envolveria imenso tempo e dinheiro. O mesmo se diga em relação à determinação do produto marginal do trabalho.
Admitindo, porém, que Miranda arranjava alguém capaz de executar a tarefa, precisaria ainda de saber o salário de equilíbrio no mercado de consultores para determinar quanto deveria pagar à sumidade. Mas, dado o evidente conflito de interesses, teria de contratar para isso um novo consultor, e assim sucessivamente, numa regressão ad infinitum.
De modo que a minha previsão - talvez não excessivamente surpreendente - é que João Miranda desistiria do seu projecto de criar uma empresa. Excepto se o Estado fixasse tarifas salariais para tarefas de todo o género, ao jeito de uma economia centralmente dirigida, caso em que Miranda teria mais facilidade em tomar uma decisão.
Alguns consultores conseguem, com algum esforço, saber que salários são correntemente pagos, mas a descoberta do salário de equilíbrio envolveria imenso tempo e dinheiro. O mesmo se diga em relação à determinação do produto marginal do trabalho.
Admitindo, porém, que Miranda arranjava alguém capaz de executar a tarefa, precisaria ainda de saber o salário de equilíbrio no mercado de consultores para determinar quanto deveria pagar à sumidade. Mas, dado o evidente conflito de interesses, teria de contratar para isso um novo consultor, e assim sucessivamente, numa regressão ad infinitum.
De modo que a minha previsão - talvez não excessivamente surpreendente - é que João Miranda desistiria do seu projecto de criar uma empresa. Excepto se o Estado fixasse tarifas salariais para tarefas de todo o género, ao jeito de uma economia centralmente dirigida, caso em que Miranda teria mais facilidade em tomar uma decisão.
21.12.07
Paul Krugman sobre a crise financeira nos EUA
Demora uma hora, mas, quem sabe? talvez possa ajudar a dissipar o tédio natalício.
Factos teimosos
jdc começou por exibir um gráfico representando a evolução do desemprego em Espanha entre 1976 e 2006 e sugeriu que ela foi determinada pela variação do salário mínimo.
Instado a justificar a sua afirmação, ofereceu-nos em seguida um outro gráfico com a marcha do salário mínimo real no mesmo país entre 1963 e 2003.
Se se desse ao trabalho de olhar para os bonecos que afanosamente colecciona, notaria talvez que, mesmo a olho nu, sem necessidade de análise econométrica, os dados revelam não existir qualquer correlação entre, por um lado, a dinâmica do salário mínimo e, por outro, a do desemprego.
Note-se, por exemplo, que o salário mínimo real cresceu aceleradamente em Espanha entre 1967 e 1979, e que, desde então, estacionou ou baixou ligeiramente. Quanto ao desemprego, só começou a crescer em 1979 (exactamente o ano em que o salário mínimo estabilizou) e prosseguiu nesse rumo até 1985, altura em que começou a baixar, para depois retomar a tendência ascendente em 1992 e atingir o máximo absoluto em 1995. De então para cá tem vindo sempre a descer.
Repito: as estatísticas apresentadas negam a existência de qualquer correlação entre salário mínimo e desemprego, ao contrário da tese proposta por jcd. O que falta ao autor dos posts em rigor argumentativo sobra-lhe, porém, em palavreado vazio.
PS - Num outro post, jcd insinua que a política de forte aumento do salário mínimo iniciada pelos governos de Franco terá tido inspiração marxista. Hilariante!
Instado a justificar a sua afirmação, ofereceu-nos em seguida um outro gráfico com a marcha do salário mínimo real no mesmo país entre 1963 e 2003.
Se se desse ao trabalho de olhar para os bonecos que afanosamente colecciona, notaria talvez que, mesmo a olho nu, sem necessidade de análise econométrica, os dados revelam não existir qualquer correlação entre, por um lado, a dinâmica do salário mínimo e, por outro, a do desemprego.
Note-se, por exemplo, que o salário mínimo real cresceu aceleradamente em Espanha entre 1967 e 1979, e que, desde então, estacionou ou baixou ligeiramente. Quanto ao desemprego, só começou a crescer em 1979 (exactamente o ano em que o salário mínimo estabilizou) e prosseguiu nesse rumo até 1985, altura em que começou a baixar, para depois retomar a tendência ascendente em 1992 e atingir o máximo absoluto em 1995. De então para cá tem vindo sempre a descer.
Repito: as estatísticas apresentadas negam a existência de qualquer correlação entre salário mínimo e desemprego, ao contrário da tese proposta por jcd. O que falta ao autor dos posts em rigor argumentativo sobra-lhe, porém, em palavreado vazio.
PS - Num outro post, jcd insinua que a política de forte aumento do salário mínimo iniciada pelos governos de Franco terá tido inspiração marxista. Hilariante!
20.12.07
Isto está, como convém, a tornar-se extremamente confuso
O facto de o Tratado de Lisboa ser ilegível não é razão para que não possa ser referendado. Afinal, nós passamos o tempo a votar coisas de que possuímos apenas a mais vaga das ideias. Mas já é mais preocupante constatarmos que muitos daqueles que se propõem orientar o nosso sentido de voto na eventualidade de ser convocado o dito referendo manifestamente não entendem de que trata a tal resma de papel. De modo que, inevitavelmente, o voto acabará por ser, na sua essência, a favor ou contra a União Europeia. Valerá a pena?
Para variar
Se jcd está muito informado sobre o que se passou em Espanha no que toca à relação entre salário mínimo e desemprego, talvez seja de presumir que, não se encontrando essa informação em segredo de justiça, quererá ter a bondade de partilhá-la connosco. Quem sabe se, desenganando Stiglitz, Arrow, Samuelson e outros infelizes do género, não poderia até aspirar ao Nobel da Economia. Mas aposto que, para variar, ele não sabe do que fala.
19.12.07
Ninguém tem uma segunda oportunidade de causar uma primeira impressão
Quando lá fui, no sábado passado, a Byblos não tinha assim tantos livros, a alta tecnologia não estava a funcionar, a baixa também não (daí as filas nas caixas), a decoração pareceu-me fatela e, em geral, não entendi o conceito.
Passava-se um bocado de frio na loja.
Se somarmos a frustração resultante do confronto da realidade oferecida com a excitação que emanava dos press-releases reproduzidos nos jornais e nos blogues, parece-me problemático augurar um grande sucesso a uma livraria onde não dá jeito nenhum ir.
Imaginam eu ir a uma livraria e não me apetecer comprar lá nada? Eu também não.
Passava-se um bocado de frio na loja.
Se somarmos a frustração resultante do confronto da realidade oferecida com a excitação que emanava dos press-releases reproduzidos nos jornais e nos blogues, parece-me problemático augurar um grande sucesso a uma livraria onde não dá jeito nenhum ir.
Imaginam eu ir a uma livraria e não me apetecer comprar lá nada? Eu também não.
A teoria e a prática
Não se pode criticar demasiado o João Miranda. Afinal, ele é apenas uma vítima inocente da forma inaceitável como a teoria económica é ensinada um pouco por todo o mundo, sem referência (ou com escassa referência) aos factos que pretende explicar.
O Daniel Oliveira desafiou o João Miranda a apresentar um só estudo sério provando que o aumento do salário mínimo conduzirá em Portugal ao aumento do desemprego. O João Miranda, como esperaria qualquer pessoa que entenda o modo como ele pensa, respondeu-lhe com um gráfico.
Como bom escolástico, o que lhe interessa são as teorias, não os factos empíricos. Ele deduz a verdade dos axiomas que se lhe afiguram intuitivos, porque julga que a teoria económica funciona como a geometria.
E que nos dizem, afinal, as investigações empíricas acerca da relação entre, por um lado, a existência ou o aumento do salário mínimo e, por outro lado, o desemprego? Em muitos casos, talvez a maioria, não identificam relação alguma. Noutros, sugerem que o desemprego aumenta; noutros ainda, que o desemprego diminui (!).
As únicas conclusões sólidas que se podem tirar serão talvez estas:
1. O impacto do aumento do salário mínimo sobre o desemprego depende das circunstâncias;
2. A representação abstracta do mercado do trabalho reproduzida pelo João Miranda no seu post é errada ou, pelo menos incompleta.
Alguns economistas acreditam que o modelo falha por não ter em conta a capacidade negocial das partes em confronto, mas isso já é uma conversa mais complicada.
PS: No mesmo sentido da opinião aqui expressa, ler também João Rodrigues.
O Daniel Oliveira desafiou o João Miranda a apresentar um só estudo sério provando que o aumento do salário mínimo conduzirá em Portugal ao aumento do desemprego. O João Miranda, como esperaria qualquer pessoa que entenda o modo como ele pensa, respondeu-lhe com um gráfico.
Como bom escolástico, o que lhe interessa são as teorias, não os factos empíricos. Ele deduz a verdade dos axiomas que se lhe afiguram intuitivos, porque julga que a teoria económica funciona como a geometria.
E que nos dizem, afinal, as investigações empíricas acerca da relação entre, por um lado, a existência ou o aumento do salário mínimo e, por outro lado, o desemprego? Em muitos casos, talvez a maioria, não identificam relação alguma. Noutros, sugerem que o desemprego aumenta; noutros ainda, que o desemprego diminui (!).
As únicas conclusões sólidas que se podem tirar serão talvez estas:
1. O impacto do aumento do salário mínimo sobre o desemprego depende das circunstâncias;
2. A representação abstracta do mercado do trabalho reproduzida pelo João Miranda no seu post é errada ou, pelo menos incompleta.
Alguns economistas acreditam que o modelo falha por não ter em conta a capacidade negocial das partes em confronto, mas isso já é uma conversa mais complicada.
PS: No mesmo sentido da opinião aqui expressa, ler também João Rodrigues.
Jacto de um buraco negro está a destruir galáxia vizinha. Portugal poderá ser o país mais afectado.
Os astrónomos da NASA afirmaram peremptoriamente que nada nem ninguém poderá sobreviver a uma torrente de partículas deste género. "A quantidade de radiação emitida pelos buracos negros é fatal", confessaram.
Apesar de alguns especialistas por nós contactados acreditarem que Portugal se encontra especialmente desprotegido perante fenómenos deste género, o Governo não considera necessário rever as previsões económicas para 2008. Segundo Teixeira dos Santos "o Governo não tenciona desviar-se um milímetro do rumo traçado, diga a NASA o que disser." Luis Filipe Menezes classificou já esta declaração do Ministro das Finanças como "uma irresponsabilidade, própria de quem não vive no mundo de hoje e julga poder continuar a ignorar olimpicamente o que se passa no resto do universo".
Também o chefe dos bombeiros da capital acredita que "estamos a incorrer numa situação desnecessária por não ter sido implementado o plano de prevenção de emergências proposto há oito anos" pela corporação que dirige. E rematou: "O ministro foi informado por nós da catástrofe que pode ocorrer a qualquer instante, mas, derivado ao economicismo que tem implementado, o mesmo nunca teve resposta".
18.12.07
Naufrágio na Costa Ocidental
Diz Pedro Bidarra, Vice-Presidente da BBDO, em entrevista à Briefing de 14 de Dezembro:
Percebe-se: criticado em vários quadrantes pela fragilidade e inconsequência da sua acção governativa, ocorreu a Pinho brindar-nos com uma campanha de publicidade. Não é caso virgem.
Olhando para as peças que integram a campanha vemos lá - em segundo plano e quase só para fazer bonito - algum mar e uma pouca de areia, mas o que mais ressalta são as chamadas "personalidades": um futebolista, um treinador e uma fadista mundialmente conhecidos. Para a trilogia fado-Fátima-futebol estar completa falta a vidente, de que actualmente não possuímos nenhum espécime com repercussão internacional.
Completam o ramalhete algumas pessoas que, sem desprimor para os próprios, pouco ou nada contam em termos de saliência ou projecção aquém ou além fronteiras. E o que é que tudo isto tem a ver com o conceito "Europe's West Coast"? Mistério.
Um país que sente a necessidade de agitar sistemática e freneticamente uns quantos talentos de renome mundial mais não faz senão chamar a atenção para a escassez de exemplares apresentáveis. O caso torna-se mais grave quando a gente do futebol e do fado é o melhor que há para exibir.
Finalmente, a campanha diz ainda a quem a quiser ouvir que Portugal tem cantores, desportistas e até, imagine-se! um cientista, mas não um fotógrafo suficientemente bom para usar na campanha. Estamos, pois, de volta à saloice que há escassos anos levou o Governo português a colocar a foto do Figo à entrada de uma exposição dedicada à cultura portuguesa em Madrid.
Tal como aqueles anúncios e suplementos ridículos que o governo português insiste em inserir de vez em quando no Economist, esta campanha posiciona-nos de facto ao nível do Azerbeijão, sem ofensa para esse país maravilhoso.
Que espécie de efeito se espera de iniciativas como esta? É difícil dizê-lo se optarmos pela análise racional do fenómeno - e aqui entramos decidamente na parte mais desagradável de tudo isto, que é a da falta de critério com que sistematicamente se esbanja o dinheiro dos contribuintes.
Na semana passada, a cidade de Lisboa deparou-se ao acordar com telas gigantescas colocadas em locais estratégicos exibindo os familiares retratos de Cristiano Ronaldo e Mourinho, uma iconografia que em si mesma já enjoa. Algumas pessoas viram também a campanha nos exemplares de algumas publicações estrangeiras que vêm para Portugal, ignorando que esses anúncios não aparecem nas edições distribuídas noutros países.
Quase todos acreditam que a campanha está a passar com a mesma força, ou até com maior intensidade, no estrangeiro. Estão redondamente enganados: trata-se de uma campanha para português ver, pela simples razão de que o Estado português não dispõe de uma verba suficiente para veiculá-la em larga escala nos Estados Unidos, no Reino Unido, na França e na Alemanha, para não ir mais longe. Na verdade, nem sequer tem dinheiro para fazer uma campanha de razoável impacto em Espanha.
De modo que decidiu cingir-se a Lisboa e arredores e convocar a imprensa para ajudar a criar uma ilusão de grandiosa ambição internacionalista. Nestas condições, como pode o Ministro da Economia pretender que "o objectivo é reposicionar a marca e aumentar a notoriedade de Portugal no estrangeiro"?
O menos que os jornalistas portugueses poderiam fazer seria perguntar-lhe como tenciona ele medir objectivamente o contributo desta campanha para a concretização desses objectivos.
"O Ministro da Economia - e o Governo - depois de verem muitos dados sobre o diagnóstico e sobre esta ideia - e a solução - decidiram avançar. Escolheram dois temas: as energias renováveis, uma área onde o país, inesperadamente, lidera, e os jovens talentos, pessoas que ajudaram, lá fora, a mudar a maneira como se pensa Portugal. Estas são ideias do ministro, é estratégia política."Na minha maneira de ver isto não é mera estratégia política, é estratégia de comunicação. Logo, o que Bidarra eufemisticamente me parecer insinuar aqui é que o ministro Manuel Pinho é o autor da estratégia de comunicação da campanha de promoção do país - digamos assim - que o Governo pôs no ar no dia da assinatura do Tratado de Lisboa.
Percebe-se: criticado em vários quadrantes pela fragilidade e inconsequência da sua acção governativa, ocorreu a Pinho brindar-nos com uma campanha de publicidade. Não é caso virgem.
Olhando para as peças que integram a campanha vemos lá - em segundo plano e quase só para fazer bonito - algum mar e uma pouca de areia, mas o que mais ressalta são as chamadas "personalidades": um futebolista, um treinador e uma fadista mundialmente conhecidos. Para a trilogia fado-Fátima-futebol estar completa falta a vidente, de que actualmente não possuímos nenhum espécime com repercussão internacional.
Completam o ramalhete algumas pessoas que, sem desprimor para os próprios, pouco ou nada contam em termos de saliência ou projecção aquém ou além fronteiras. E o que é que tudo isto tem a ver com o conceito "Europe's West Coast"? Mistério.
Um país que sente a necessidade de agitar sistemática e freneticamente uns quantos talentos de renome mundial mais não faz senão chamar a atenção para a escassez de exemplares apresentáveis. O caso torna-se mais grave quando a gente do futebol e do fado é o melhor que há para exibir.
Finalmente, a campanha diz ainda a quem a quiser ouvir que Portugal tem cantores, desportistas e até, imagine-se! um cientista, mas não um fotógrafo suficientemente bom para usar na campanha. Estamos, pois, de volta à saloice que há escassos anos levou o Governo português a colocar a foto do Figo à entrada de uma exposição dedicada à cultura portuguesa em Madrid.
Tal como aqueles anúncios e suplementos ridículos que o governo português insiste em inserir de vez em quando no Economist, esta campanha posiciona-nos de facto ao nível do Azerbeijão, sem ofensa para esse país maravilhoso.
Que espécie de efeito se espera de iniciativas como esta? É difícil dizê-lo se optarmos pela análise racional do fenómeno - e aqui entramos decidamente na parte mais desagradável de tudo isto, que é a da falta de critério com que sistematicamente se esbanja o dinheiro dos contribuintes.
Na semana passada, a cidade de Lisboa deparou-se ao acordar com telas gigantescas colocadas em locais estratégicos exibindo os familiares retratos de Cristiano Ronaldo e Mourinho, uma iconografia que em si mesma já enjoa. Algumas pessoas viram também a campanha nos exemplares de algumas publicações estrangeiras que vêm para Portugal, ignorando que esses anúncios não aparecem nas edições distribuídas noutros países.
Quase todos acreditam que a campanha está a passar com a mesma força, ou até com maior intensidade, no estrangeiro. Estão redondamente enganados: trata-se de uma campanha para português ver, pela simples razão de que o Estado português não dispõe de uma verba suficiente para veiculá-la em larga escala nos Estados Unidos, no Reino Unido, na França e na Alemanha, para não ir mais longe. Na verdade, nem sequer tem dinheiro para fazer uma campanha de razoável impacto em Espanha.
De modo que decidiu cingir-se a Lisboa e arredores e convocar a imprensa para ajudar a criar uma ilusão de grandiosa ambição internacionalista. Nestas condições, como pode o Ministro da Economia pretender que "o objectivo é reposicionar a marca e aumentar a notoriedade de Portugal no estrangeiro"?
O menos que os jornalistas portugueses poderiam fazer seria perguntar-lhe como tenciona ele medir objectivamente o contributo desta campanha para a concretização desses objectivos.
17.12.07
Modalidades de carneirada
Num passado bem distante, quando se discutia se Mourinho seria ou não o próximo treinador da selecção inglesa (ou seja, há uma semana atrás, mais precisamente no dia 5 de Dezembro), Simon Kuiper afirmou no Financial Times que o problema do futebol do seu país é ser essencialmente estúpido. E explicou-se:
O problema é que Simon fala-nos da Inglaterra, um país onde supostamente as pessoas desfrutam de largas liberdades e são, por isso mesmo, estimuladas a pensar com a sua própria cabeça.
É claro que essas liberdades existem, mas é também claro que os ingleses, em vez de agirem com autonomia, preferem seguir o sentimento da manada. Basta ver como eles adoram viver em bairros, às vezes gigantescos, compostos de habitações que repetem até ao infinito o mesmo modelo. E isto passa-se não só nos subúrbios habitados pelas classes trabalhadoras, como também nas zonas abastadas de Londres - ou até numa estância de veraneio da nobreza do século XVIII como Bath.
É muito mais fácil conceder total liberdade a um povo quando se sabe de antemão que ele é demasiado medroso para usá-la.
The English game follows an old-fashioned military model: managers command, players obey. Mr. Eriksson discovered this in his pre-match chats with individual players. After outlining the opposition's tactics in the player's zone of the field, he would ask: "What would you do?" Often players would reply: "I don't know. You're the boss, Boss."Dir-se-á que isto não é nenhuma novidade para nós, visto que manifestamente a mesma mentalidade prevalece no futebol português, onde, por muito evidente que seja uma falha de posicionamento dos jogadores no campo, eles só se deslocam se o treinador, ou, quando muito, o capitão, mandar.
O problema é que Simon fala-nos da Inglaterra, um país onde supostamente as pessoas desfrutam de largas liberdades e são, por isso mesmo, estimuladas a pensar com a sua própria cabeça.
É claro que essas liberdades existem, mas é também claro que os ingleses, em vez de agirem com autonomia, preferem seguir o sentimento da manada. Basta ver como eles adoram viver em bairros, às vezes gigantescos, compostos de habitações que repetem até ao infinito o mesmo modelo. E isto passa-se não só nos subúrbios habitados pelas classes trabalhadoras, como também nas zonas abastadas de Londres - ou até numa estância de veraneio da nobreza do século XVIII como Bath.
É muito mais fácil conceder total liberdade a um povo quando se sabe de antemão que ele é demasiado medroso para usá-la.
Que posicionamento para Portugal?
Façamos de conta que as minhas objecções em relação à Marca Portugal não faziam nenhum sentido. Qual deveria então ser o posicionamento mais indicado para o país?
Quando foi convidado a trabalhar para o Governo português, há uns bons 15 anos atrás, Wally Olins notou certa vez, ao ver um mapa de Europa virado ao contrário (ou seja, com o Norte virado para o Sul e vice-versa) algo que até aí lhe passara despercebido: Portugal é o único país Atlântico do Sul da Europa.
É claro que a Espanha também tem uma costa atlântica, mas não só ela está no essencial virada ao Norte, como de facto o país é no seu núcleo definidor mediterrânico e continental.
Perguntar-se-á que relevância tem isso. Ora a localização geográfica não é no caso de Portugal - como não o é no de nenhum outro país - uma mera curiosidade sem consequências. A situação que ocupa teve e tem um papel determinante na sua história e na sua cultura, como zona de transição entre o Mediterrâneo e o Atlântico (logo de relação marítima entre o Sul e o Norte da Europa), entre a Europa e a África e entre a Europa e as Américas.
Logo, é correcto, como tentou Olins, fazer assentar o posicionamento do país nessa dupla condição de país meridional e atlântico.
Mas é evidente que o desdobramento deste conceito de partida numa comunicação bem concebida e eficaz teria de estribar-se num entendimento aprofundado da relação histórica entre a posição geo-estratégica compreendida em sentido amplo e a nossa originalidade cultural. Note-se, de passagem, como esse conceito é simultaneamente válido para promover o turismo, estimular as exportações e atrair o investimento estrangeiro.
Sabe-se que isso nunca aconteceu, tanto por incapacidade das pessoas e instituições à época incumbidas de trabalhar no projecto como por facciosismo partidário dos governos posteriores, de modo que a Marca Portugal andou perdida pelos arquivos do Ministério da Economia durante muitos anos.
Em 2002, porém, o tema foi ressuscitado pela BBDO, a agência de publicidade que por essa altura propôs o conceito "Europe's West Coast" como o mais apropriado para posicionar Portugal. As suas razões foram expostas num inteligente e bem argumentado artigo que Pedro Bidarra deu à estampa no Público em 2003.
Resumindo, o que aí se dizia era que a percepção de Portugal como um país do Sul não é positiva para o país, visto que não só o Sul conota ideias negativas tais como sub-desenvolvimento e atraso cultural, como as coisas boas usualmente associadas ao Sul existem mais na Itália, na Espanha e na Grécia.
Logo, seria mais indicado insistirmos na dimensão ocidental da nossa identidade, muito mais autêntica e relevante do que a mediterrânica. Acresce que a expressão "West Coast" faz lembrar a Califórnia, a costa ocidental americana, que além do sol e da praia tem também a tecnologia e o cinema. Portugal deveria então promover-se externamente como a "Europe's West Coast".
À primeira vista, a recomendação da BBDO parece enquadrar-se, com algumas nuances, nas ideias de Wally Olins.
Detecto nela, todavia, alguns inconvenientes. O primeiro é a presunção de que toda a gente em todo o mundo pensa na Califórnia quando se fala de West Coast. Ora o Mundo está cheio de costas ocidentais, pelo que a associação está mais na cabeça de quem a propõe do que no espírito de quem é suposto fazê-la.
Em segundo lugar, a ideia de fazer de Portugal a Califórnia da Europa não só é velhíssima como, por razões que talvez não seja necessário detalhar, me parece descabida.
Por último - e este é o ponto mais importante - reduzir a identidade do país à sua ocidentalidade é obviamente amputá-la de um componente essencial. Portugal não é só um país ocidental, tal como não é só um país meridional: é, repito-o, o único país atlântico do Sul da Europa.
Se Portugal fosse só um país meridional não seria o que é, tal como não o seria se a sua essência se reduzisse à ocidentalidade. Afinal, nós não somos a Irlanda, que, quer se queira quer não, mais milha menos milha, é de facto, no plano simbólico se não exactamente no dos factos, o extremo ocidental da Europa.
Quando foi convidado a trabalhar para o Governo português, há uns bons 15 anos atrás, Wally Olins notou certa vez, ao ver um mapa de Europa virado ao contrário (ou seja, com o Norte virado para o Sul e vice-versa) algo que até aí lhe passara despercebido: Portugal é o único país Atlântico do Sul da Europa.
É claro que a Espanha também tem uma costa atlântica, mas não só ela está no essencial virada ao Norte, como de facto o país é no seu núcleo definidor mediterrânico e continental.
Perguntar-se-á que relevância tem isso. Ora a localização geográfica não é no caso de Portugal - como não o é no de nenhum outro país - uma mera curiosidade sem consequências. A situação que ocupa teve e tem um papel determinante na sua história e na sua cultura, como zona de transição entre o Mediterrâneo e o Atlântico (logo de relação marítima entre o Sul e o Norte da Europa), entre a Europa e a África e entre a Europa e as Américas.
Logo, é correcto, como tentou Olins, fazer assentar o posicionamento do país nessa dupla condição de país meridional e atlântico.
Mas é evidente que o desdobramento deste conceito de partida numa comunicação bem concebida e eficaz teria de estribar-se num entendimento aprofundado da relação histórica entre a posição geo-estratégica compreendida em sentido amplo e a nossa originalidade cultural. Note-se, de passagem, como esse conceito é simultaneamente válido para promover o turismo, estimular as exportações e atrair o investimento estrangeiro.
Sabe-se que isso nunca aconteceu, tanto por incapacidade das pessoas e instituições à época incumbidas de trabalhar no projecto como por facciosismo partidário dos governos posteriores, de modo que a Marca Portugal andou perdida pelos arquivos do Ministério da Economia durante muitos anos.
Em 2002, porém, o tema foi ressuscitado pela BBDO, a agência de publicidade que por essa altura propôs o conceito "Europe's West Coast" como o mais apropriado para posicionar Portugal. As suas razões foram expostas num inteligente e bem argumentado artigo que Pedro Bidarra deu à estampa no Público em 2003.
Resumindo, o que aí se dizia era que a percepção de Portugal como um país do Sul não é positiva para o país, visto que não só o Sul conota ideias negativas tais como sub-desenvolvimento e atraso cultural, como as coisas boas usualmente associadas ao Sul existem mais na Itália, na Espanha e na Grécia.
Logo, seria mais indicado insistirmos na dimensão ocidental da nossa identidade, muito mais autêntica e relevante do que a mediterrânica. Acresce que a expressão "West Coast" faz lembrar a Califórnia, a costa ocidental americana, que além do sol e da praia tem também a tecnologia e o cinema. Portugal deveria então promover-se externamente como a "Europe's West Coast".
À primeira vista, a recomendação da BBDO parece enquadrar-se, com algumas nuances, nas ideias de Wally Olins.
Detecto nela, todavia, alguns inconvenientes. O primeiro é a presunção de que toda a gente em todo o mundo pensa na Califórnia quando se fala de West Coast. Ora o Mundo está cheio de costas ocidentais, pelo que a associação está mais na cabeça de quem a propõe do que no espírito de quem é suposto fazê-la.
Em segundo lugar, a ideia de fazer de Portugal a Califórnia da Europa não só é velhíssima como, por razões que talvez não seja necessário detalhar, me parece descabida.
Por último - e este é o ponto mais importante - reduzir a identidade do país à sua ocidentalidade é obviamente amputá-la de um componente essencial. Portugal não é só um país ocidental, tal como não é só um país meridional: é, repito-o, o único país atlântico do Sul da Europa.
Se Portugal fosse só um país meridional não seria o que é, tal como não o seria se a sua essência se reduzisse à ocidentalidade. Afinal, nós não somos a Irlanda, que, quer se queira quer não, mais milha menos milha, é de facto, no plano simbólico se não exactamente no dos factos, o extremo ocidental da Europa.
A clivagem
Escreveu Nuno Artur Silva no Público de ontem:
"Na televisão, como na sociedade, o risco é o de passar a haver dois mundos: o dos mais endinheirados, que podem aceder ao cabo e à banda larga e suportar o preço da escolha personalizada, e o dos pobres, a quem resta o fluxo reality-show/ novelístico das "generalistas", a água da torneira do entretenimento básico."Quem só conhece Nuno Artur Silva do Eixo do Mal não suspeita que se trata de uma das pessoas com um pensamento mais inteligente e estruturado sobre a situação dos media em Portugal. Vale a pena ler o artigo na íntegra.
"...e depois eu é que sou o maluco!"
16.12.07
Outra vez a Marca Portugal
O grande argumento a favor da Marca Portugal é este: se os espanhóis têm uma marca país, nós também devemos tê-la.
Ora eu discordo da ideia por razões de princípio.
Comecemos pela confusão terminológica. Quando eu admito que Portugal tem necessariamente uma carga simbólica associada não tenho que admitir que se trata de uma marca. Por outras palavras, nem todos os símbolos hão-de ser marcas.
É intrínseco ao conceito de marca ela ter um dono. Acontece que o nosso país, hoje, não tem dono.
Houve um tempo em que teve, e houve também por isso um tempo em que teve uma Marca Portugal. Refiro-me ao trabalho realizado pelo Secretariado Nacional para a Propaganda (depois Secretariado Nacional para a Informação, apreciem o eufemismo) e pelo seu líder António Ferro, que, em estreita associação com Salazar, concebeu não só a Exposição do Mundo Português como o melhor slogan de promoção do país no exterior jamais inventado: "Portugal, o segredo mais bem guardado da Europa".
Se tivéssemos memória colectiva conheceriamos o que esses homens fizeram e saberiamos que eram gente competente e tecnicamente bem preparada.
Hoje, porém, nas nossas sociedades abertas e plurais, consideramos justamente inadmissível que alguém defina o que o país é e como deverá ele apresentar-se exteriormente, pois é nisso mesmo que consiste a selecção de um posicionamento nacional. Como pode então o Governo, ou o AICEP, ou seja lá quem for, obrigar milhares de empresas e milhões de portugueses a comunicarem a uma só voz? Absurdo, não é verdade?
Há dois anos, quando convivi ao longo de vários dias com Wally Wolins - um dos profetas das marcas país e a pessoa que há década e meia foi chamada pelo governo português para orientar um projecto desse tipo - coloquei-lhe precisamente essa questão.
Estava à espera de uma acesa disputa, mas, para minha grande surpresa, concordou logo comigo. "É evidente que numa sociedade livre", disse-me ele, não necessariamente por estas palavras, "ninguém tem o poder de impor aos outros uma ideia do país. A única possibilidade consiste em construir sobre o que é consensual, ou seja, sobre uma ideia do país com a qual quase todos possam estar de acordo."
Bom, isto é desanimador para nós, pois Portugal é precisamente aquele país no qual o exacerbado e quase doentio sentido crítico dos seus habitantes impede que se ponham de acordo sobre o que quer que seja.
"Então", alvitrou ele, "talvez seja esse o ponto de partida sobre o qual se deva construir a Marca Portugal. Mas notem que os irlandeses também são assim!"
Ora eu discordo da ideia por razões de princípio.
Comecemos pela confusão terminológica. Quando eu admito que Portugal tem necessariamente uma carga simbólica associada não tenho que admitir que se trata de uma marca. Por outras palavras, nem todos os símbolos hão-de ser marcas.
É intrínseco ao conceito de marca ela ter um dono. Acontece que o nosso país, hoje, não tem dono.
Houve um tempo em que teve, e houve também por isso um tempo em que teve uma Marca Portugal. Refiro-me ao trabalho realizado pelo Secretariado Nacional para a Propaganda (depois Secretariado Nacional para a Informação, apreciem o eufemismo) e pelo seu líder António Ferro, que, em estreita associação com Salazar, concebeu não só a Exposição do Mundo Português como o melhor slogan de promoção do país no exterior jamais inventado: "Portugal, o segredo mais bem guardado da Europa".
Se tivéssemos memória colectiva conheceriamos o que esses homens fizeram e saberiamos que eram gente competente e tecnicamente bem preparada.
Hoje, porém, nas nossas sociedades abertas e plurais, consideramos justamente inadmissível que alguém defina o que o país é e como deverá ele apresentar-se exteriormente, pois é nisso mesmo que consiste a selecção de um posicionamento nacional. Como pode então o Governo, ou o AICEP, ou seja lá quem for, obrigar milhares de empresas e milhões de portugueses a comunicarem a uma só voz? Absurdo, não é verdade?
Há dois anos, quando convivi ao longo de vários dias com Wally Wolins - um dos profetas das marcas país e a pessoa que há década e meia foi chamada pelo governo português para orientar um projecto desse tipo - coloquei-lhe precisamente essa questão.
Estava à espera de uma acesa disputa, mas, para minha grande surpresa, concordou logo comigo. "É evidente que numa sociedade livre", disse-me ele, não necessariamente por estas palavras, "ninguém tem o poder de impor aos outros uma ideia do país. A única possibilidade consiste em construir sobre o que é consensual, ou seja, sobre uma ideia do país com a qual quase todos possam estar de acordo."
Bom, isto é desanimador para nós, pois Portugal é precisamente aquele país no qual o exacerbado e quase doentio sentido crítico dos seus habitantes impede que se ponham de acordo sobre o que quer que seja.
"Então", alvitrou ele, "talvez seja esse o ponto de partida sobre o qual se deva construir a Marca Portugal. Mas notem que os irlandeses também são assim!"
15.12.07
Sumário executivo
14.12.07
Ponto de viragem
Martin Wolf no seu artigo desta semana no Financial Times:
"What is happening in credit markets today is a huge blow to the credibility of the Anglo-Saxon model of transactions-orientated financial capitalism. A mixture of crony capitalism and gross incompetence has been on display in the core financial markets of New York and London. From the "ninja" (no-income, no-job, no-asset) subprime lending to the placing (and favourable rating) of assets that turn out to be almost impossible to understand, value or sell, these activities have been riddled with conflicts of interest and incompetence."
Onde está o Gordon?
O Reino Unido é hoje talvez o exemplo mais acabado de plutocracia (ou governo dos muito ricos) legitimada pela aparência de respeito pelo sentimento da plebe que o populismo mediático encena.
O país é efectivamente governado pelos tablóides, sempre prontos a exigirem a cabeça de qualquer governante que não alinhe pela sua raivosa e primária propaganda.
Gordon Brown parece ser um homem intelectual e eticamente bem mais sólido do que Tony Blair, e é essa porventura a sua desgraça. Blair nunca teve medo dos media - muito pelo contrário - porque a sua intuição o ajudava a entendê-los e a pensar como eles, e só quem intuitivamente simpatiza com o seu modo de actuar pode manipulá-los.
Brown, que é um intelectual, pensa de mais. A lógica da imprensa repugna-lhe, por isso teme-a. Não sendo suficientemente corajoso para enfrentá-la, procura fazer-lhe a vontade contrafeito, e é sistematicamente cilindrado perante a opinião pública.
A ausência de Brown na foto que os líderes europeus ontem tiraram em Lisboa tem como única justificação a tentativa de evitar a crítica chauvinista dos media britânicos. A decisão foi patética e o resultado final será ainda pior do que ele temia.
Crónica de uma crise
O Tiago Mendes resolveu - a meu ver, bem - relatar exaustivamente o desenrolar da polémica que estalou na sequência das intolerantes reacções a um seu post visando as opiniões extremistas do André Azevedo Alves e que levou ao seu afastamento do blogue Atlântico e da revista homónima. A frio, os acontecimentos ficam mais claros e as lições são mais evidentes. A direita supostamente moderna em geral e algumas pessoas em particular não ficaram bem no retrato.
13.12.07
Distracções
Filipe Nunes Vicente faz o comentário que faltava para se perceberem os ajustes de contas na noite portuense:
"Nos últimos dez anos, Portugal, juntamente com a Espanha e Holanda, tornou-se no destino privilegiado da entrada de cocaína na Europa. Enquanto as pessoas se excitam com um punhado de seringas trocadas nas prisões, a cocaína movimenta milhões de euros. Estas coisas não se passam sem consequências. (...) Só um ingénuo pensa que se mata alegremente pelo direito a controlar as receitas do consumo mínimo de casas de diversão nocturna."
12.12.07
Vómito e direitos correlativos
O vómito não é propriamente uma opinião, é uma revulsão. É a rejeição extrema, espontânea, involuntária e descontrolada de algo ou alguém.
Embora a CIA não reconheça que se trata de uma forma de tortura, impedir uma pessoa de vomitar é sem dúvida alguma uma crueldade. Não se diz a uma pessoa: "Eh pá, não vomites!"; diz-se-lhe, quando muito: "Vomita para o outro lado". O direito ao nojo é universal e inalienável, faz parte do núcleo central dos valores de qualquer nação civilizada.
Eu enojo-me com caracóis; o Tiago Mendes, pelos vistos, com os posts do André Azevedo Alves.
Nos bons tempos em que as crianças eram educadas com severidade, um castigo frequente para aquelas que vomitavam consistia em obrigá-las a comer o seu próprio vomitado. Algumas pessoas opinam que o Tiado deveria ser obrigado a engolir o seu vómito; outras, mais moderadas, que ele deveria ter tido o bom senso de vomitar para o outro lado.
O assunto pode ainda ser analisado de uma perspectiva distinta. Se eu acho que fulano é uma besta e escrevo: "Fulano é uma besta!", posso ter muita razão, mas a expressão literária do meu sentimento é frustre porque não transmite nada para além da minha irritação. O mais provável é que desperte escassa simpatia entre os destinatários do comentário, que eu precisamente teria interesse em atrair para o meu lado.
Do mesmo modo, se sicrano me dá vómitos e eu escrevo: "Sicrano dá-me vómitos!", não é certo que tenha dito algo de relevante, ou sequer que de facto tenha algo para dizer. Onde eu quero chegar, se ainda não me fiz compreender, é à conclusão de que a intervenção do Tiago pode e deve ser asperamente criticada de uma perspectiva estritamente estética.
Imaginemos que ele tinha antes escrito algo deste género:
"Os posts do André Azevedo Alves provocam-me uma reacção quase-alérgica: dores de cabeça, cólicas violentas, comichão em todo o corpo, vómito espesso e esverdeado exalando um odor sulfuroso a inferno, altas temperaturas durante dias a fio, estado de prostração e debilidade extrema que me impedem de sair da cama. Ainda por cima, a Junta Médica recusa dar-me baixa. O médico de família, alarmado com a repetição destes episódios, proibiu-me de me aproximar a menos de 20 metros dos posts do André Azevedo Alves sem tapar o nariz com um lenço."
Digam-me agora, consideradas as coisas sob esta nova perspectiva: será justo, humano e cristão castigar, banindo-o do convívio humano, quem assim sofre?
Embora a CIA não reconheça que se trata de uma forma de tortura, impedir uma pessoa de vomitar é sem dúvida alguma uma crueldade. Não se diz a uma pessoa: "Eh pá, não vomites!"; diz-se-lhe, quando muito: "Vomita para o outro lado". O direito ao nojo é universal e inalienável, faz parte do núcleo central dos valores de qualquer nação civilizada.
Eu enojo-me com caracóis; o Tiago Mendes, pelos vistos, com os posts do André Azevedo Alves.
Nos bons tempos em que as crianças eram educadas com severidade, um castigo frequente para aquelas que vomitavam consistia em obrigá-las a comer o seu próprio vomitado. Algumas pessoas opinam que o Tiado deveria ser obrigado a engolir o seu vómito; outras, mais moderadas, que ele deveria ter tido o bom senso de vomitar para o outro lado.
O assunto pode ainda ser analisado de uma perspectiva distinta. Se eu acho que fulano é uma besta e escrevo: "Fulano é uma besta!", posso ter muita razão, mas a expressão literária do meu sentimento é frustre porque não transmite nada para além da minha irritação. O mais provável é que desperte escassa simpatia entre os destinatários do comentário, que eu precisamente teria interesse em atrair para o meu lado.
Do mesmo modo, se sicrano me dá vómitos e eu escrevo: "Sicrano dá-me vómitos!", não é certo que tenha dito algo de relevante, ou sequer que de facto tenha algo para dizer. Onde eu quero chegar, se ainda não me fiz compreender, é à conclusão de que a intervenção do Tiago pode e deve ser asperamente criticada de uma perspectiva estritamente estética.
Imaginemos que ele tinha antes escrito algo deste género:
"Os posts do André Azevedo Alves provocam-me uma reacção quase-alérgica: dores de cabeça, cólicas violentas, comichão em todo o corpo, vómito espesso e esverdeado exalando um odor sulfuroso a inferno, altas temperaturas durante dias a fio, estado de prostração e debilidade extrema que me impedem de sair da cama. Ainda por cima, a Junta Médica recusa dar-me baixa. O médico de família, alarmado com a repetição destes episódios, proibiu-me de me aproximar a menos de 20 metros dos posts do André Azevedo Alves sem tapar o nariz com um lenço."
Digam-me agora, consideradas as coisas sob esta nova perspectiva: será justo, humano e cristão castigar, banindo-o do convívio humano, quem assim sofre?
Gente arejada
"Comprei duas vezes a revista Atlântico. O giro é que, apesar de se armar noutra coisa qualquer, é uma revista fiel aos valores tradicionais. Os homens tratam dos assuntos sérios. Política e coisas assim. As mulheres, duas ou três que por lá andam, escrevem umas coisitas sobre a vida mundana. Blogues, espectáculos, filmes, relações e coisas assim. E os homens atlânticos aplaudem-nas como cãezinhos, neste caso cadelinhas, amestradas que brilham com os seus truques de circo. Bravo."
Ana de Amsterdam
Ana de Amsterdam
10.12.07
Picuinhices
José Reis no Jornal de Negócios, ainda a propósito do milagre de Alcochete:
"Sabe-se a que cota teriam de ser construídas as pistas em Alcochete, num sítio em que o nível freático está tão perto do solo? Não. Sabe-se que trabalhos de deslocação de terra e de compactação têm de ser feitos? Não. Sabe-se quanto custa a descontaminação de uma zona de uso militar para poder ter uso civil? Não. Os custos directos estão, pois, longe de serem conhecidos."Um picuinhas, este Professor José Reis.
Aprofundamento do debate
Se os insultos de Tiago Mendes serão comparáveis aos de Churchill, Nélson Rodrigues e João Pereira Coutinho (o Churchill português) e outras considerações de fino recorte sobre a "arte da rudeza" no 31 da Armada:
Alguém sequer concebe um Churchill, um Nélson Rodrigues, um João Pereira Coutinho a dizerem de um adversário polemista que as ideias deste lhes dão "vómitos"?É só rir.
8.12.07
A Cimeira
O Reino Unido é, hoje, o país europeu com maior influência cultural, económica e militar em África. Qualquer iniciativa conjunta europeia em relação a esse continente é naturalmente encarada como uma ameaça à sua própria posição. Toda a gente compreende isto, tirando os jornalistas portugueses.
Apesar do seu passado colonial, Portugal tende a perder terreno em África: nos países de língua portuguesa porque eles procuram, como seria de esperar, novos parceiros; nos outros, porque não tem dimensão para, isoladamente, fazer seja o que for de relevo. Tem tudo a ganhar, por conseguinte, com a Cimeira Europa-África.
Encontros do género daquele que neste fim de semana tem lugar em Lisboa limitam-se a afirmar, em circunstâncias que propiciam grande visibilidade, um propósito e um compromisso. Neste contexto, há espaço para declarações de circunstância, salamaleques, abraços hipócritas, reivindicações, remoques, ameaças veladas, negociações agressivas, acordos de bastidores e muito mais. Numa palavra, para tudo aquilo em que consiste a diplomacia.
Entre a Europa e a África há uma evidente continuidade geográfica e relacionamentos históricos de séculos ou milénios, a par de esperanças e ameaças comuns. Para além disso, todos os anos, a miséria que grassa a Sul do Mediterrâneo traz-nos vagas crescentes de imigrantes em número superior àquele que conseguimos integrar.
Deveremos esperar que sobre o continente africano brilhe o sol radioso da democracia e dos direitos humanos para encetar o diálogo com África?
Choca-nos a brutalidade das ditaduras que sobrevivem na maioria dos países africanos, mas a verdade é que, há apenas dois séculos atrás (e, nalguns casos, há apenas algumas décadas), não era muito diferente a situação na Europa.
É de esperar que os países africanos, cujas estruturas sociais foram estraçalhadas pela colonização, farão o seu caminho natural, tal como nós o fizémos, sem imposições externas. Mas agradecer-nos-ão sem dúvida que, ao contrário do que tantas vezes aconteceu no passado um pouco por todo o Mundo, a Europa e os Estados Unidos não prejudiquem a afirmação das forças democráticas quando elas tiverem poder para tal.
Primeiro, não fazer mal: é esse o lema dos médicos, e deve ser também o da União Europeia no seu relacionamento com África. Outro é, já se sabe, o entendimento daqueles que gostariam de transformar a cimeira numa espécie de exame oral em que os líderes africanos viriam prestar publicamente contas às antigas potências do que têm andado a fazer.
O egoísmo de roupagem humanista que se converteu desde o início dos anos 90 no discurso oficial dos Estados Unidos e dos seus seguidores europeus em relação aos países subdesenvolvidos não passa de uma forma hábil de reciclar numa linguagem aceitável para a consciência contemporânea a velha agressividade dos imperialistas que queriam e querem submeter o Mundo inteiro aos seus interesses mesquinhos.
É ou não é?
Pergunta Pedro Caeiro no Mar Salgado:
A categoria do "politicamente correcto" continua a fascinar-me. É politicamente correcto dizer bem ou dizer mal de Mugabe e de Chávez? E o que dizem os que execram o politicamente correcto?Ser ou não ser "politicamente correcto" não tem originariamente nada a ver com "parecer bem" ou "parecer mal" (nem tampouco, acrescente-se com "bem pensante" ou "convencional"), embora no linguajar português tais expressões sejam cada vez mais utilizados como sinónimas. Nos EUA, "politicamente correcto" será, por exemplo, proibir as praxes académicas - uma ideia repugnante, como todos sabemos.
7.12.07
Um homem simples
Súbito ataque de lucidez de Vasco Pulido Valente no Público de hoje: "Se, de facto, sou 'pessimista', parece que nisso, pelo menos, não sou diferente do resto país."
Tirando saber ler e escrever - prenda que, na presente conjuntura cultural, não pode nem deve ser subestimada - VPV é de facto um típico português.
E, na realidade, para identificarmos os traços mais marcantes da alma lusitana basta darmos uma olhada à prosa que hoje nos serve. Vejam só:
1. Resignação: "Ninguém, ou quase ninguém, acredita no futuro." (Ele não acredita, logo quase ninguém acredita.)
2. Choraminguice: "De onde vêm estas trevas? Primeiro, de onde sempre vieram - da miséria." (Quem não chora, não mama.)
3. Manha: "Costumo ser descrito como 'pessimista', uma palavra que irrita e que não sei exactamente o que significa, como coisa distinta de 'crítico' ou de 'realista'." (Truque para fugir ao assunto.)
4. Desprezo pelos factos: "Os portugueses preferem [segundo o estudo citado] a honestidade ao poder. Por outras palavras, não querem mudar o mundo, porque desconfiam da mudança." (Repare-se como a conclusão não tem nada a ver com a premissa.)
5. Auto-satisfação: "A 'Europa' continua longe, o país continua 'fechado', a desigualdade aumenta. Pessimismo ou realismo?" (Ele bem avisou.)
Resta, é claro, como inconfundível traço de portugalidade, uma má educação tão ingénua, tão espontânea, tão pura, tão genuina, tão pouco ensaiada, que chega a comover. Mas não se pode fazer-lhe justiça citando frases isoladas.
Tirando saber ler e escrever - prenda que, na presente conjuntura cultural, não pode nem deve ser subestimada - VPV é de facto um típico português.
E, na realidade, para identificarmos os traços mais marcantes da alma lusitana basta darmos uma olhada à prosa que hoje nos serve. Vejam só:
1. Resignação: "Ninguém, ou quase ninguém, acredita no futuro." (Ele não acredita, logo quase ninguém acredita.)
2. Choraminguice: "De onde vêm estas trevas? Primeiro, de onde sempre vieram - da miséria." (Quem não chora, não mama.)
3. Manha: "Costumo ser descrito como 'pessimista', uma palavra que irrita e que não sei exactamente o que significa, como coisa distinta de 'crítico' ou de 'realista'." (Truque para fugir ao assunto.)
4. Desprezo pelos factos: "Os portugueses preferem [segundo o estudo citado] a honestidade ao poder. Por outras palavras, não querem mudar o mundo, porque desconfiam da mudança." (Repare-se como a conclusão não tem nada a ver com a premissa.)
5. Auto-satisfação: "A 'Europa' continua longe, o país continua 'fechado', a desigualdade aumenta. Pessimismo ou realismo?" (Ele bem avisou.)
Resta, é claro, como inconfundível traço de portugalidade, uma má educação tão ingénua, tão espontânea, tão pura, tão genuina, tão pouco ensaiada, que chega a comover. Mas não se pode fazer-lhe justiça citando frases isoladas.
"Explica-me como se eu fosse muito estúpido"
Imaginem um blogue colectivo de esquerda onde alguém, digamos A., tem dúvidas sobre se a Coreia do Norte deverá ser considerada uma ditadura, adora Hugo Chavez, justifica os crimes cometidos pelas FP 25 e, em noites de lua cheia, chega a entoar odes a Staline. Suponham agora que um outro colaborador do mesmo blogue, chamemos-lhe T., se insurge contra a complacência dos seus companheiros em relação às opiniões de A. e faz notar que isso descredibiliza os ideais que partilham.
Em consequência, T. é afastado e A. adquire maior peso. Os restantes membros do blogue, evitando tomar posição sobre a substância das opiniões de T., resmungam que não perceberam onde ele quis chegar, que os posts dele são trapalhões e que, ademais, como toda a gente sabe, trata-se de um maçador.
Que conclusão tirar sobre a natureza e as inclinações desse blogue e de quem lá escreve?
Em consequência, T. é afastado e A. adquire maior peso. Os restantes membros do blogue, evitando tomar posição sobre a substância das opiniões de T., resmungam que não perceberam onde ele quis chegar, que os posts dele são trapalhões e que, ademais, como toda a gente sabe, trata-se de um maçador.
Que conclusão tirar sobre a natureza e as inclinações desse blogue e de quem lá escreve?
Estamos a progredir
O Maradona, que "não tinha percebido nada" do que o Tiago Mendes escreveu, foi finalmente iluminado com este resumo da minha modesta autoria.
Pois é, pois é: esse meu post sob forma de diálogo não pretendeu exprimir o meu pensamento sobre o assunto. Limita-se a condensar o do Tiago, de tal forma que em vários pontos reproduz frases inteiras palavra por palavra.
Por que me dei eu a esse trabalho? Precisamente para que as pessoas interpeladas pelas afirmações do Tiago Mendes não possam, com os pretextos mais diversos (falta de clareza, ataques pessoais, mania de embirrar, etc.), continuar a alegar não terem percebido o que foi dito para se furtarem ao debate.
Como, modéstia à parte, a capacidade de síntese é um dos meus pontos fortes, pareceu-me tratar-se de uma tarefa talhada à minha medida. Porém, como só ao Tiago caberá decidir se o resumo é ou não fiel ao que ele pensa, é claro que a responsabilidade do texto não pode ser-lhe atribuída.
Que tive êxito no meu propósito, eis o que parece óbvio. Não só o Maradona viu a luz, como por aqui também já houve quem entendesse. Estamos a evoluir.
Quanto ao resto, o post do Maradona não passa de um arrazoado sem propósito nem método que certamente não deixará de dispor bem quem, antes de mais, quer evitar as questões que tão oportunamente foram postas sobre a mesa.
Resumindo (cá vou eu outra vez), o Maradona só tem para nos servir o estafado e oportunista argumento da simetria: quem são vocês para criticar, se à esquerda também há tanta flor que não se cheira?
Ora a questão não é reconhecer-se que na nossa área política genericamente considerada haja posições que nos repugnam política e eticamente, mas sim saber-se se podemos e devemos calar-nos quando elas são expressas com crescente impudor. Aceitamos ser confundidos com elas? Optamos, em nome da unidade, por silenciar as divergências? Mas não correremos, desse modo, o risco de comprometer os ideais que verdadeiramente nos importam?
Estas são, a meu ver, as questões que o Tiago Mendes colocou. Muito mais determinantes do que elas, porém, foi a incomodada reacção que suscitaram. Porque demonstrou à evidência a decisão que certas pessoas tomaram de persistirem contra ventos e marés no rumo que ele veio a público criticar.
E é isso que, provavelmente, fará deste episódio um momento de viragem.
Última hora: mais gente que viu a luz.
Pois é, pois é: esse meu post sob forma de diálogo não pretendeu exprimir o meu pensamento sobre o assunto. Limita-se a condensar o do Tiago, de tal forma que em vários pontos reproduz frases inteiras palavra por palavra.
Por que me dei eu a esse trabalho? Precisamente para que as pessoas interpeladas pelas afirmações do Tiago Mendes não possam, com os pretextos mais diversos (falta de clareza, ataques pessoais, mania de embirrar, etc.), continuar a alegar não terem percebido o que foi dito para se furtarem ao debate.
Como, modéstia à parte, a capacidade de síntese é um dos meus pontos fortes, pareceu-me tratar-se de uma tarefa talhada à minha medida. Porém, como só ao Tiago caberá decidir se o resumo é ou não fiel ao que ele pensa, é claro que a responsabilidade do texto não pode ser-lhe atribuída.
Que tive êxito no meu propósito, eis o que parece óbvio. Não só o Maradona viu a luz, como por aqui também já houve quem entendesse. Estamos a evoluir.
Quanto ao resto, o post do Maradona não passa de um arrazoado sem propósito nem método que certamente não deixará de dispor bem quem, antes de mais, quer evitar as questões que tão oportunamente foram postas sobre a mesa.
Resumindo (cá vou eu outra vez), o Maradona só tem para nos servir o estafado e oportunista argumento da simetria: quem são vocês para criticar, se à esquerda também há tanta flor que não se cheira?
Ora a questão não é reconhecer-se que na nossa área política genericamente considerada haja posições que nos repugnam política e eticamente, mas sim saber-se se podemos e devemos calar-nos quando elas são expressas com crescente impudor. Aceitamos ser confundidos com elas? Optamos, em nome da unidade, por silenciar as divergências? Mas não correremos, desse modo, o risco de comprometer os ideais que verdadeiramente nos importam?
Estas são, a meu ver, as questões que o Tiago Mendes colocou. Muito mais determinantes do que elas, porém, foi a incomodada reacção que suscitaram. Porque demonstrou à evidência a decisão que certas pessoas tomaram de persistirem contra ventos e marés no rumo que ele veio a público criticar.
E é isso que, provavelmente, fará deste episódio um momento de viragem.
Última hora: mais gente que viu a luz.
6.12.07
Assobiar para o ar
João Galamba, no Metablog:
"O simples facto de a maioria das pessoas que reagiram negativamente ás críticas do Tiago terem ignorado a substância daquilo que foi realmente escrito, revela que uma parte significativa da Direita a que o Tiago pensava pertencer não está interessada em clarificações ideológicas e debates internos estruturais."
"O simples facto de a maioria das pessoas que reagiram negativamente ás críticas do Tiago terem ignorado a substância daquilo que foi realmente escrito, revela que uma parte significativa da Direita a que o Tiago pensava pertencer não está interessada em clarificações ideológicas e debates internos estruturais."
Eles sabem-na toda
- Certa direita, embora goste de se proclamar liberal, não faz senão envergar roupas novas para disfarçar ideias e gestos antigos. O resultado é uma mistura confusa e intragável de saudosismo, conservadorismo moral e libertarianismo económico. Isto torna-se evidente na sua ambiguidade em relação ao PNR; nas tiradas boçais em relação a Pinochet, Salazar ou McCarthy; na crueldade e insensibilidade perante o sofrimento alheio; ou ainda no mal disfarçado entusiasmo perante supostas confirmações científicas da existência de raças inferiores. Não, não se trata de meras excentricidades ou de elementos acessórios em relação a uma posição de direita respeitável, séria, educada, bem fundamentada, coerente e intelectualmente "brilhante". Não basta defender-se "menos estado" e "mais liberdades económicas" para se ser liberal, menos ainda quando as motivações para essa defesa são, no mínimo, pouco claras. Que direita europeia respeitável é que, hoje em dia, olha para as mudanças que vão ocorrendo na economia e na sociedade desta forma dogmática, tão pouco compassiva e inclusiva? E não, as diferenças não se reduzem aos ditos "temas fracturantes" - apesar disso facilitar muito o contra-ataque de alguns cérebros muito pouco potentes, que, nos seus patrulhamentos, cheios de processos de intenção, quando não má criação, vêem "politicamente correcto" em tudo quanto é sítio.
- Não percebi nada...
- Eu também não. Este tipo é um chato!
- Não percebi nada...
- Eu também não. Este tipo é um chato!
5.12.07
Quente, quente...
Pedro Lomba - membro do Conselho Editorial da Revista Atlântico - numa caixa de comentários do Blogue Atlântico:
"Chego tarde a esta polémica. Nem percebi nada. Mas gostava de dizer que o Tiago [Mendes] é uma das boas razões (e eu que sou um individualista radical) que me fazem continuar a querer pertencer a um grupo a que temos vindo a chamar “a direita” mas a que, se calhar, devíamos chamar outra coisa."
Bem visto. Se calhar, deveriam mesmo chamar-lhe outra coisa - até porque já toda a gente percebeu que vocês são mesmo outra coisa.
"Chego tarde a esta polémica. Nem percebi nada. Mas gostava de dizer que o Tiago [Mendes] é uma das boas razões (e eu que sou um individualista radical) que me fazem continuar a querer pertencer a um grupo a que temos vindo a chamar “a direita” mas a que, se calhar, devíamos chamar outra coisa."
Bem visto. Se calhar, deveriam mesmo chamar-lhe outra coisa - até porque já toda a gente percebeu que vocês são mesmo outra coisa.
Os novos inocentes úteis
"A propósito da cimeira UE-África que amanhã começa em Lisboa, vários escritores subscrevem uma carta aberta denunciando o facto dessa reunião magna não ter inscrito, e cito, «duas das piores tragédias humanitárias do mundo, a do Zimbabwe e a do Darfur», na sua ordem de trabalhos." Ler o resto do comentário de Eduardo Pitta intitulado "Tudo no mesmo saco?" aqui.
Nota 20
Luis Jorge, no Vida Breve:
"Ao Tiago Mendes resta um consolo: não é só ele que sai, o engenheiro Jardim Gonçalves também. Até breve, darling."
"Ao Tiago Mendes resta um consolo: não é só ele que sai, o engenheiro Jardim Gonçalves também. Até breve, darling."
O fado do moralista
Um moralista é um sujeito implacável em relação à fraquezas alheias, mas muito compreensivo para com as suas próprias falhas. É por isso mesmo que o moralismo não deve ser confundido com o comportamento ético.
No seu editorial de hoje, o Director do Público argumenta, a propósito da patética manchete do seu jornal na 2ª feira passada:
1. Que houve mais ("Estado de São Paulo") quem se enganasse;
2. Que o seu amigo e jornalista brasileiro Alberto Dines escreveu um artigo sobre o assunto;
3. Que as críticas que recebeu são ideologicamente motivadas;
4. Que o erro cometido é inerente ao risco de fazer jornalismo;
5. Que a responsabilidade do erro foi de "um dos membros da direcção com mais experiência", não dele;
6. Que os escrúpulos do jornal têm-no inibido de comentar assuntos como a composição da futura administração da RTP ou a antecipada remodelação do Governo;
7. Que tem também evitado especular em torno do caso Maddie.
Infelizmente para o argumento de Fernandes, o caso é que o Público deu uma notícia falsa, quando poderia ter dado uma verdadeira, bastando para isso que, em vez de anunciar o pretenso resultado final do referendo, anunciasse a previsão das sondagens.
Por que não o fez? Porque se desabituou do rigor informativo. É esta, creio eu, a lição a tirar do sucedido.
No seu editorial de hoje, o Director do Público argumenta, a propósito da patética manchete do seu jornal na 2ª feira passada:
1. Que houve mais ("Estado de São Paulo") quem se enganasse;
2. Que o seu amigo e jornalista brasileiro Alberto Dines escreveu um artigo sobre o assunto;
3. Que as críticas que recebeu são ideologicamente motivadas;
4. Que o erro cometido é inerente ao risco de fazer jornalismo;
5. Que a responsabilidade do erro foi de "um dos membros da direcção com mais experiência", não dele;
6. Que os escrúpulos do jornal têm-no inibido de comentar assuntos como a composição da futura administração da RTP ou a antecipada remodelação do Governo;
7. Que tem também evitado especular em torno do caso Maddie.
Infelizmente para o argumento de Fernandes, o caso é que o Público deu uma notícia falsa, quando poderia ter dado uma verdadeira, bastando para isso que, em vez de anunciar o pretenso resultado final do referendo, anunciasse a previsão das sondagens.
Por que não o fez? Porque se desabituou do rigor informativo. É esta, creio eu, a lição a tirar do sucedido.
A vida é dura
Extracto do Estatuto Editorial do Blogue Atlântico:
"É aceitável insultar-se Maomé ou o Príncipe herdeiro de Espanha, mas não o André Azevedo Alves."
Por que será? Pensem.
"É aceitável insultar-se Maomé ou o Príncipe herdeiro de Espanha, mas não o André Azevedo Alves."
Por que será? Pensem.
4.12.07
Isto não promete nada de bom
António Costa quase se limitou, nas eleições intercalares para o município lisboeta, a pedir que lhe passassem um cheque em branco. Tudo indica que a sua ideia é voltar a pedir outro no próximo acto eleitoral.
Digo isto porque, independentemente das trapalhadas do PSD, Costa não tem de facto o direito de propor à Assembleia Municipal o recurso a um empréstimo de 500 milhões de euros (ou 400, pelos vistos tanto faz) sem primeiro esclarecer como tenciona pagá-lo.
Posso ter andado distraído, mas quer-me parecer que, passado meio ano, a nova vereação não só não nos explicou como tenciona reduzir as despesas da Câmara Municipal de Lisboa como, ao endossar o megalómano projecto de recuperação da Baixa-Chiado, parece disposta a aumentá-las ainda mais.
Já se percebeu que Costa contava com o ovo no cú da galinha. Para ser mais explícito, apostava na transferência de terrenos ribeirinhos hoje sob a alçada do Porto de Lisboa para a tutela da Câmara, antecipando receitas capazes de tirá-la do buraco financeiro em que João Soares a enfiou.
Felizmente para todos nós, essa operação revelou-se bem mais complicada do que estava planeado - e digo felizmente porque temo que a Câmara faça à beira-rio o que fez nos últimos vinte anos ao resto da cidade -, pelo que António Costa vai ter que inventar algo mais sólido.
A minha esperança é que António Costa e a sua equipa se decidam finalmente a começar a trabalhar, mas não tenho muita esperança. Estas coisas, quando começam tortas, é muito difícil irem ao sítio.
Digo isto porque, independentemente das trapalhadas do PSD, Costa não tem de facto o direito de propor à Assembleia Municipal o recurso a um empréstimo de 500 milhões de euros (ou 400, pelos vistos tanto faz) sem primeiro esclarecer como tenciona pagá-lo.
Posso ter andado distraído, mas quer-me parecer que, passado meio ano, a nova vereação não só não nos explicou como tenciona reduzir as despesas da Câmara Municipal de Lisboa como, ao endossar o megalómano projecto de recuperação da Baixa-Chiado, parece disposta a aumentá-las ainda mais.
Já se percebeu que Costa contava com o ovo no cú da galinha. Para ser mais explícito, apostava na transferência de terrenos ribeirinhos hoje sob a alçada do Porto de Lisboa para a tutela da Câmara, antecipando receitas capazes de tirá-la do buraco financeiro em que João Soares a enfiou.
Felizmente para todos nós, essa operação revelou-se bem mais complicada do que estava planeado - e digo felizmente porque temo que a Câmara faça à beira-rio o que fez nos últimos vinte anos ao resto da cidade -, pelo que António Costa vai ter que inventar algo mais sólido.
A minha esperança é que António Costa e a sua equipa se decidam finalmente a começar a trabalhar, mas não tenho muita esperança. Estas coisas, quando começam tortas, é muito difícil irem ao sítio.
Desprazer em conhecer
Palavras de Tiago Mendes na sua despedida do Blogue Atlântico:
"Como escrevi, há uma ‘fractura’ indisfarçável nos liberais (repito, não me refiro à Atlântico) e que com essa confusão "continuaremos a confundir liberalismo com os gestos antigos e mal reciclados dos que tudo fazem para que a liberdade não sobreviva em nenhuma das suas várias dimensões".(...)Isto da direita, digo eu, não há nada como conhecê-la pessoalmente.
"O que escrevi sobre o que tem escrito o André Azevedo Alves não foi motivado por "um" post dele recente, mas sim por um acumular de escritos na blogosfera que primam pelo saudosismo, conservadorismo moral e libertarianismo económico - um estado ausente que seja um menor impedimento ao "programa moral" da instituição que inspira o André. Nem a "direita sociológica" de que fala (e que ninguém lhe desdenhe a autoridade) Jaime Nogueira Pinto será tão extremista e conservadora como esta."(...)
"A ambiguidade em relação ao PNR, as tiradas boçais em relação a Pinochet, Salazar ou McCarthy, a crueldade e insensibilidade perante o sofrimento alheio (os incontáveis post dele sobre os palestinianos são exemplo disto, como seria a série anti-LGBT), os links "anódinos" sobre a ciência que talvez "mostre" que os pretos são menos inteligentes, não são "meras excentricidades" ou elementos acessórios em relação a uma posição de direita respeitável, séria, educada, bem fundamentada, coerente e intelectualmente "brilhante" que o André Azevedo Alves supostamente representa." (...)
"Não basta defender-se "menos estado" e "mais liberdades económicas" para se ser liberal ("adjectivo"), menos ainda quando as motivações para essa defesa são, em parte, oriundas de um grandioso projecto religioso. Que direita europeia respeitável é que, hoje em dia, olha para as mudanças que vão ocorrendo na economia e na sociedade daquela forma, dogmática, tão pouco compassiva e inclusiva? E não, as diferenças não se reduzem aos ditos "temas fracturantes" - apesar disso facilitar muito o contra-ataque de alguns cérebros muito pouco potentes, que, nos seus patrulhamentos, cheios de processos de intenção, quando não má criação, vêem "politicamente correcto" em tudo o que é sítio. Tratam-se de escolas liberais muito diferentes, com fundações muito distintas. São as diferenças nas raízes que importam, não podemos olhar apenas para os ramos e para as flores."(...)
O tempo circular
Cem anos depois, na Rússia, o Partido Comunista volta a ser a principal força de oposição ao poder czarista.
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