Dentro de alguns meses, o Governo terá que escolher o modelo de privatização da ANA Aeroportos de Portugal, um assunto bem mais relevante do que a escolha entre Ota e Alcochete que tanto excitou a opinião pública para além dos limites do razoável.
A ANA gere actualmente todos os aeroportos nacionais, com excepção dos da Madeira, cuja concessão reparte com a Região Autónoma da Madeira. Significa isso que o Estado português se preparar para privatizar mais um monopólio, como já fez com a REN e projecta fazer com as águas.
O modelo de privatização da ANA parece, tanto quanto se sabe, assentar em três pressupostos: a) alienação conjunta de todas as concessões detidas pela ANA a um mesmo consórcio; b) adjudicação a esse mesmo consórcio da construção e exploração do novo aeroporto de Lisboa; c) conservação de uma participação do Estado que poderá ir até aos 50%.
Os aeroportos portugueses concorrem pouco entre si, embora seja possível que no futuro venham a concorrer mais. Por outro lado, não só o sistema aeroportuário nacional concorre globalmente com o espanhol, como o Porto concorre com os aeroportos galegos, Faro serve a província de Huelva (que anunciou a intenção de construir o seu próprio aeroporto) e Lisboa concorre com Madrid nos voos intercontinentais.
Imaginemos que o Estado português aliena integralmente o seu controlo sobre a ANA. Suponhamos, além disso, que a ANA é adquirida, de imediato ou dentro de alguns anos, pela AENA, a sua congénere espanhola. Nessas circunstâncias, o mais natural é que, se a AENA aplicar ao conjunto da península a estratégia de centralização que actualmente aplica em Espanha, o desenvolvimento dos aeroportos de Lisboa e Porto venha a ser subordinado aos interesses de expansão do aeroporto de Madrid e que todos nós, quando quisermos voar para o centro da Europa, teremos primeiro que fazer escala na capital espanhola.
Não sou, em geral, muito sensível ao argumento da defesa dos centros de decisão nacionais, nem simpatizo com as golden shares. Acredito que o Estado deveria retirar-se o quanto antes da PT, e não entendo que interesse público relevante justifica que a Caixa permaneça nas mãos do Estado.
No caso da ANA, porém, inquieta-me o eventual resultado de uma privatização integral da empresa. É certo que está prevista a manutenção de uma participação estatal de 50% no capital da empresa, mas, tendo em conta que o Estado português se encontra financeiramente depauperado e que os interesses privados adoram deitar a mão a tudo o que é monopólio, parece-me indispensável a clarificação da política aeronáutica nacional.
Ora aí está um bom tema para a chamada "esquerda" do PS. Querem aceitar o desafio?
17.1.08
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