23.10.08

O que é ser keynesiano



Para a maioria das pessoas, o keynesianismo é apenas um conjunto de receitas de política económica especialmente indicadas para lidar com recessões.

Keynes ficaria decerto surpreendido se visse o seu nome associado a uma doutrina desse tipo. Não só lhe desagradavam as receitas, como nem sequer confiava muito em modelos económicos. Tal como David Box, também ele achava que todos os modelos são errados, mas alguns são úteis.

Embirrava muito particularmente com a teoria clássica do equilíbrio económico geral, segundo a qual o desemprego duradouro só poderia resultar de obstáculos artificiais ao livre funcionamento dos mercados.

A sua Teoria Geral (designação algo enganadora) procura demonstrar em que condições precisas uma economia pode ficar bloqueada num equilíbrio persistente muito distante do pleno emprego, no qual a política monetária se torna absolutamente ineficaz.

Alguns herdeiros de Keynes, com Hicks à cabeça, reconstruiram um modelo de equilíbrio económico geral (o célebre IS-LM) corrigido pelas críticas que ele lhe fizera. Foi a isso que se chamou a síntese neo-clássica.

É duvidoso que Keynes atribuisse grande valor a esse novo edifício teórico a que o seu nome hoje se encontra associado, principalmente porque ele não achava que a análise económica devesse ser conduzida isoladamente das demais instâncias da vida social e política.

Eis o retrato sintético do economista ideal que ele traçou no seu ensaio sobre Alfred Marshall:

"O mestre economista deve possuir uma rara combinação de atributos (...) Deve ser matemático, historiador, estadista, filósofo - até certo ponto. Deve entender os símbolos e exprimir-se por palavras. Deve contemplar o particular em termos do geral e tocar no abstracto e no concreto num mesmo movimento do pensamento. Deve estudar o presente à luz do passado para os propósitos do futuro. Nenhuma parte da natureza do homem ou das suas instituições deve ficar inteiramente fora das suas cogitações. Ele deve ser simultaneamente determinado e desinteressado; alheio e incorruptível como um artista e, no entanto, por vezes tão materialista como um político."

Este projecto sugere que Keynes pode ser caracterizado como um oportunista metodológico, ou, na terminologia de Paul Feyerabend, como um anarquista metodológico.

Segundo Robert Skidelsky, autor da melhor biografia do maior economista do século XX, Keynes irritava-se muito com a estreiteza de vistas dos jovens economistas do seu tempo, cuja restrita cultura atribuía às deficiências do processo de educação a que eram submetidos. Que diria ele hoje se soubesse o que se ensina nas escolas de economia?

3 comentários:

NC disse...

Deixa-me adivinhar. Perguntavam-lhe alhos e ele, muito irritado com a estreiteza (ou seria com as suas próprias limitações?), respondia bugalhos.

NC disse...

Faz-me lembrar alguém...

Anónimo disse...

enfim: keynes, como dizem muitos economistas, daria voltas no túmulo se conseguisse vislumbrar a ignorância dos seus discípulos.